Dia após dia, uma adolescente chinesa e um jovem soldado japonês encontram-se na Praça dos Mil Ventos para uma árdua partida de go. O ano é 1937. Tropas japonesas invadem a Manchúria, e o soldado recebe a missão de, disfarçado, procurar espiões da resistência entre os jogadores que desde a alvorada se reúnem na praça. Os dois pouco se falam. Durante o exercício quase estético que é a partida, perscrutam as almas um do outro através do movimento dos peões sobre o tabuleiro. Fora dali, suas vidas são peões em campos opostos, à mercê da empresa militar. A chinesa, ignorando estar diante do inimigo que dissemina a morte entre o seu povo, encontra na partida retomada diariamente a fuga de um cotidiano que parece estar prestes a se desintegrar. O japonês, verdadeiro samurai treinado para morrer pela honra de seu imperador, encontra na oponente o alento da diferença, ele que não consegue amar satisfaz entre prostitutas o corpo castigado. Em "A Jogadora de Go", Shan Sa traça com intensa com intensa poesia, coadjuvantes da tragédia da guerra, protagonistas de tragédias pessoais ditadas pela guerra. Mas não se pense que o livro é uma pintura em tons sombrios: se há passagens que retratam fielmente a crueldade do ser humano, como a tortura dos jovens da resistência pelo ensandecido tenente Oka, há também a descoberta do sexo pela adolescente Machu - um sexo ensolarado, ao qual ela se entrega como quem se lança no vazio. Se este romance fala da brutalidade humana e do sofrimento imposto pela guerra, é também uma homenagem à beleza das coisas simples, à liberdade do amor e ao espírito de juventude que se lança adiante sem olhar para trás - girando, assim, a engrenagem do mundo.
Literatura Estrangeira