Eu poderia te contar sobre Bartleby, mas prefiro não fazer.
Anti-herói dos tempos modernos, o comportamento de Bartleby provoca reações de repulsa, ira e indignação – não por aquilo que faz, mas pelo que se recusa a fazer. Bartleby não gosta de trabalhar: não toma café ou se obriga a ser produtivo. Mas tampouco gosta de sair para se divertir – não bebe cerveja ou puxa assunto com quem quer que seja. Também não se volta para o divino ou transcendente, já que não nutre qualquer crença religiosa. Bartleby é, acima de tudo, um homem de aspecto terrivelmente sedado.
Publicado em 1853, Bartleby – uma história de Wall Street é uma obra breve de repercussão retumbante. Através da melancolia paralisante de Bartleby, Herman Melville tece uma densa crítica à desumanização dos modos de produção vigentes. Desconectado de tudo o que é humano, Bartleby tem como única missão na vida copiar mecanicamente e sem erros documentos que servem apenas para multiplicar a riqueza alheia. O cotidiano banal e a condenação do ócio figuram entre as críticas mais relevantes na obra.
A edição da Antofágica foi integralmente datilografada à mão por Letícia Lopes, que realizou intervenções artísticas que refletem o trabalho monótono e repetitivo do copista. O multi artista Nuno Ramos coloca-se de frente à parede de tijolos para escrever seu posfácio, e José Garcez Ghirardi nos conduz para o exterior da repartição para melhor compreender esse autor que dominou das formas breves às mais extensas. Antônio Xerxenesky, tradutor deste volume, escreve um texto a respeito de Bartleby enquanto alegoria para uma sociedade adoecida pelo trabalho. A apresentação – útil na sua inutilidade – é de Manuela Cantuária, roteirista e escritora.