Lethycia Dias 26/12/2020DecepcionanteAlguns anos atrás, ganhei um exemplar desse livro numa exposição que visitei no Centro de Convenções de Brasília. Na época (aos 16 anos), li e adorei. Acabei perdendo aquele exemplar, e só depois de muito tempo consegui comprar outro, usado, para poder reler. E eu tinha muita expectativa para essa releitura, mas acabei me decepcionando.
Os dez contos que fazem parte de "Essa história está diferente" adaptam de várias formas dez canções de Chico Buarque - seja usando apenas como pano de fundo ou citando na história, seja criando enredos semelhantes aos das canções, ou atribuindo características do eu-lírico ou das "personagens" das músicas aos personagens dos contos. E poucas dessas histórias chegam perto de ser tão bonitas ou interessantes quanto as músicas de Chico.
Algumas parecem refletir uma escolha já ultrapassada de enredo, como é o caso de "O direito de ler enquanto se janta sozinho", que nos apresenta um homem não sabendo lidar com o fato de que a filha é uma adolescente que não precisa mais dele como na infância. Outras falam com olhar preconceituoso sobre uma realidade da qual seu autor obviamente não conhece muito: é o caso de "Lodaçal", com personagens retratados como eternos ignorantes por terem tido uma infância pobre. Outras abusam de escolhas de estilo e narrativa não-convencionais que acabam tornando a leitura cansativa e desinteressante - é o caso de "Entrelaces", com sua narrativa fragmentada, "A calça branca" com seus parágrafos enormes, e "Carioca", com sua poeticidade vazia. Já "Corte de cetim" erra no abuso das referências ao Rio de Janeiro, incompreensíveis para quem não vive na cidade, mesmo consumindo muita cultura centrada na região Sudeste.
Minha maior expectativa com esse livro era reler o conto "A mulher dos meus sonhos e outros sonhos", com seu narrador que sonha coisas que automaticamente se tornam impossíveis, e que deseja muito recuperar o amor de uma mulher. Foi o único que realmente gostei de ter relido. A história usa bem o enredo de impossibilidades da música "Outros sonhos", e ao contrário das outras, não faz uso desnecessário da linguagem. Junto com o humor e a informalidade de "Feijoada completa" e o enredo insólito de "Os fantasmas do massagista", esse conto compõe a pequena parte do livro que eu gostei de ter relido.
Minha impressão é de que os autores convidados a escrever para esse livro se preocuparam demais com narrativas "diferentonas", inovações de estilo e de linguagem e menos com as histórias que iriam contar, produzindo, assim, histórias com estrutura e linguagem que soam artificiais e que não nos "tocam" por dentro como as músicas em que foram inspirados.
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