@pedro.h1709 17/04/2022O AlienistaA obra literária intitulada “O Alienista” do escritor Machado de Assis, publicada pela primeira vez em 15 de março de 1882, trata-se de uma narrativa que aborda quesitos de saúde mental, em forma de conto, que esbarra com a realidade das primeiras instituições asilares psiquiátricas do Brasil e suas implicações, de forma um tanto cômica e provocativa, motivando reflexões até os dias atuais.
O livro descreve a história de um profissional médico, o Dr. Simão Bacamarte, muito capacitado academicamente em universidades estrangeiras, reconhecido nacional e internacionalmente por suas práticas e pesquisas científicas no campo da medicina e, cuja avaliação racional ultrapassava suas percepções emocionais do mundo. Após seu insucesso em gerar filhos, situação que fora atribuída à teimosia de sua esposa em seguir um regime alimentício especial para auxiliar nas questões de fertilidade, o doutor acabou por dedicar-se inteiramente aos seus estudos e perceber na mal explorada área da psique humana a possibilidade de atingir prestígio até então inalcançável.
Ocorreu então, que o alienista resolveu por construir a “Casa Verde”, lugar onde seriam alojados e tratados todos os mentecaptos de Itaguaí e proximidades; tendo por intuito principal concentrar o maior número de informações possíveis e pertinentes às suas investigações em um mesmo local e, em consequência, prover suporte aos julgados dementes. De princípio, a proposta de estruturação de um hospício não foi prontamente aceita, suscitando arguições a respeito de tal medida, até a vereança da região ser convencida e ceder-lhe a autorização necessária para tal.
A partir desse momento, o terapeuta seguiu a observar, classificar e separar os insanos conforme seus comportamentos e transtornos. Em pouco tempo o local ficou lotado, precisando mesmo da construção de um novo anexo para que fosse possível receber mais pacientes. Os casos de internação, inicialmente fundamentados, ganham então um vulto extrapolante quando o Dr. Bacamarte passa a ampliar o território da loucura, atribuindo a quase todos algum tipo de enfermidade psíquica. Decorrente disso, uma revolução popular é arquitetada; estruturas político-governamentais caem e outras ascendem ao poder; até que oitenta por cento (80%) da população se vê aprisionada na grande “Bastilha da Razão Humana”. Doravante, ao avaliar os índices estatísticos de epidemiologia local, o médico decide rever seus conceitos e definições da loucura e, por fim, chega a duvidar da própria razão.
Ao longo do livro, o autor revela temas tais quais o aproveitamento das condições de desequilíbrio mental dos sujeitos como forma de alcançar prestígio social, por parte dos alienistas (1); retrata as percepções e influências religiosas (2); desvela os primeiros movimentos para a instituição de sistemas asilares para lunáticos e dementes (3); faz transparecer a grande remessa de pacientes aos hospitais psiquiátricos (4); questiona os métodos de estudo e classificação dos indivíduos alienados (5); notabiliza aspectos considerados importantes para o alcance de diagnóstico (6); levanta discussão quanto aos parâmetros de definição do que é considerado normal ou anormal, saudável ou patológico (7); evidencia a utilização de sistemas manicomiais para reclusão de indivíduos marginalizados pela sociedade e opositores políticos (8); evoca a dependência da interpretação dos dados científicos realizada pelo pesquisador do contexto de época ao qual está submetido (9); transparece formas de elitização do conhecimento científico (10); questiona as práticas de encerramento dos pacientes em hospício (11); provoca dúvidas quanto à utilização de ferramentas de mensuração estatística nas ciências humanas (12); e ainda notabiliza a necessidade de consideração de amplos fatores para entendimentos dos diversos transtornos psíquicos (13).