Vitor Hugo 09/11/2023
UM BELO LIVRO NO MEIO DO CAMINHO
José Viriato é um homem singular. Já passado dos 50 anos, vive sozinho em um modesto apartamento em uma região empobrecida de Lisboa. Sozinho, não. Vive com seus amados cães. Sobrevive catando objetos pelas ruas de Lisboa. Coisas que os donos não mais querem, e que ele revende em duas feiras semanais. Sua vida pacata é alterada quando ele trava contato com uma nova vizinha, Beatriz, também já entrada em anos, reclusa e igualmente solitária, com um passado nebuloso que envolve a morte trágica de um homem.
A partir do contato destas duas insólitas pessoas, ficamos a conhecer o passado de ambos, principalmente o de José Viriato, desde que ele era uma criança, vivia com seus pais, e adotou seu primeiro cachorro, que ganhou o inusual nome de Cristo.
A história, aliás, como enuncia o título da obra, também dá destaque aos animais como um todo, principalmente os cães.
Mas há uma terceira personagem muito importante: Josefa, a avó de José Viriato, com quem ele passou a viver desde sua adolescência. A avó, aliás, é um ponto de equilíbrio e estabilidade entre os dois extremos - José Viriato e Beatriz (notar que a autora dedica o livro a sua avó, Margarida).
Tomamos conhecimento ao longo da obra de parte da história de Portugal, notadamente da Revolução dos Cravos, ocorrida em 25 de abril de 1974, a qual influenciou em muito a vida de José Viriato, muito em função da paixão que seu pai dedicava à causa revolucionária.
O cerne do livro, no entanto, a meu ver, é justamente a busca do sentido da vida, o qual parece advir de uma posição mais ponderada, representada pela avó de José Viriato. Há, em tal aspecto, uma reflexão sobre a confusão que fizemos entre material e imaterial, coisas e afetos, política e família, etc.
Como consta na apresentação, a obra esbanja empatia. E o último capítulo nos deixa com um sorriso no rosto. Uma bela leitura.