Pilantrinha 15/07/2022
Sobre meninos, lobos e a vida. Ou o que quer que isso signifique.
Ladies and gentlemen, pense numa pedrada.
O mais próximo que eu passei de um thriller policial foi assistir Seven e ficar totalmente abismado com o que tinha dentro da caixa (não sabe? Vai ver isso agora, pelo amor de Deus). Tentei ler Agatha Christie um dia desses e simplesmente não fluiu. Daí vem aquele pensamento de "mermão, esse gênero só não é pra mim, vida que segue". E seguiu. Até chegar nesse garoto aqui.
Quando comecei na leitura, pensei que seria algo meio Sherlock Holmes, com um detetive inteligente demais resolvendo um crime absurdo e cheio de reviravoltas. Meio que foi isso, mas com um toque muito natural de humanidade, excessivamente humano. Sobre Meninos e Lobos, antes de um thriller policial, é um livro sobre a psiquê humana e até onde podemos chegar.
Nas páginas iniciais, quando acontece o primeiro evento marcante, eu estava completamente perdido. Não tinha entendido muito bem o tom da obra e nem para onde ela estava indo. "Quem são essas crianças, e por quê eu preciso saber disso aqui?" Parecia confuso -- e era --, mas tudo encaixou da maneira mais natural possível.
No segundo ato, quando o crime “principal” já havia ocorrido, eu cheguei ao final de um capítulo e percebi que não estava respirando. Comecei tentando pagar de foda, nada afetado pela história, mas estava tão nervoso quanto os personagens para saber o que estava acontecendo. Eu não conhecia esse Dennis Lehane, mas posso te dizer uma coisa: esse cara sabe criar uma atmosfera.
A maneira como ele começa construindo algo totalmente sem ligação com aquele acontecimento, as vezes narrando um flashback ou falando sobre algo bobo como um comercial de tv, e depois funde aquilo com a história é incrível. Você está lá, lendo sobre alguma bobagem qualquer que aqueles personagens fizeram em outro momento de suas "vidas não reais" e fica curioso com aquilo, interessado. Você quer saber.
O mais incrível aqui é que chega um momento em que o crime vai para o segundo plano -- pelo menos para mim. Eu tinha sim curiosidade em quem seria o assassino, mas o que parecia urgir era a necessidade de saber como aquelas pessoas reagiriam. O que elas iriam fazer e o porquê.
A forma que passeamos entre a vida de Dave, Jimmy e Sean é fantástica. Os dramas são tão reais, tão críveis. Me compadeci com cada um deles, da mesma forma que peguei um puta abuso em alguns momentos e em outros senti pena. Dennis foge dos espectros convencionais de bem contra o mal. Aqui temos pessoas, completamente fodidas, tentando fazer com que a vida delas seja minimamente menos miserável.
O capítulo final desse livro me deixou com um sentimento tão ruim que eu quase amaldiçoei o epílogo. Quando pensei que finalmente teria meu coração massageado e entraria no "normal da ficção", o autor entrou com os dois pés nos meus peitos, cuspiu no meu rosto e disse: "tá aí otário, lide com isso". E eu gostei!
Não acho que seja uma história para todo mundo, e não quero soar prepotente, mas Sobre Meninos e Lobos deixa um gosto bem amargo na boca. Em diversos momentos você se pega pensando em como aqueles personagens vão ter um final feliz e se ele ao menos é possível. O desfecho de um dos personagens, com aquela disputa interna de controle e uma promessa de luta e superação parece uma piada de mau gosto extremamente bem contada.
Não acho que eu possa falar mais alguma coisa sobre esse livro, pelo menos não agora. Essa obra vai ficar comigo por um tempo e eu preciso pensar.
Bebam água, comam frutas e mantenham a esperança!