Eric 27/06/2023
Uma obra de arte
Em "O Perfume", Patrick Süskind nos leva à França do século XVIII para contar a história de Grenouille, um menino órfão que nasceu no meio das tripas de peixes no mercado de rua onde sua mãe trabalhava. Desde pequeno, o garoto causava repulsa em seus tutores e era repelido por outras crianças, já que ele não apresentava nenhum tipo de cheiro e era bastante feio. Com isso, acabou enfrentando muitas dificuldades, como doenças e acidentes.
Na juventude, Grenouille descobre um dom olfativo poderoso. Sua sensibilidade em farejar pessoas, animais, flores e tudo ao seu redor o leva a uma jornada em busca do cheiro que poderia fazê-lo ser notado. Assim, o protagonista parte em uma busca fria e impiedosa para criar a essência perfeita que o fará ser amado, mesmo que captar esse cheiro seja preciso matar.
Certamente, este é um dos livros mais marcantes que já li. Pude confirmar isso com essa releitura. Além de ter um enredo instigante, curioso e criativo, a obra de Süskind está no meu ranking das melhores escritas.
Grenouille é um personagem construído em camadas e carregado de complexidade. A cada fase de sua vida, uma característica repugnante compõe sua personalidade. Ele é manipulador, soberbo e só pensa em si mesmo. O mais incrível de tudo isso é que, mesmo sendo uma pessoa detestável e sofrendo tantas violências, sentimos pena e até mesmo torcemos por ele.
Não é apenas o protagonista que se destaca nessa história, mas também a ambientação. Süskind traz ricos detalhes de uma França pré-revolucionária, onde a ciência e a fé estão em guerra e a população cada vez mais pobre e insalubre. As descrições de cenários são quase fantasiosas, e o talento do autor está em detalhar e comparar ambientes e pessoas de forma sinestésica, sempre trazendo o cheiro como identificador dos sentidos.
Além disso, a escrita poética é sublime e em certos momentos temos a impressão de que o autor está pintando um quadro. O primeiro assassinato de Grenouille é uma cena terrível, mas a forma como Süskind a descreve parece até uma obra de arte. Percebe-se um cuidado na escolha de cada palavra, potencializando todo o horror e a "beleza" daquele momento. Essa competência lexical se expande por todo o texto, o que torna a leitura sempre rica e consistente no que se discute.
O desfecho dessa narrativa é algo icônico na literatura contemporânea. É extremamente criativo, diferente e poético. Fiquei completamente em êxtase lendo essas últimas páginas. Ele consegue trazer beleza e sensualidade em um cenário de completa bizarrice.
Por fim, "O Perfume" é um romance excelente. Certamente, o livro possui momentos arrastados, mas isso não torna a leitura menos empolgante e curiosa. É uma obra que marca muito pela sua singularidade, e confesso que, relendo após 6 anos, não li outro texto que chegasse próximo disso.