A Maçã no Escuro

A Maçã no Escuro Clarice Lispector




Resenhas - A Maçã No Escuro


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Francine 01/10/2010

A maça no Escuro, de Clarice Lispector
Comprei A Maça no Escuro numa dessas promoções do Submarino: foram 3 livros da Clarice Lispector por um preço ótimo. E escolhi A Maça no Escuro porque queria entender o nome: A Maça no Escuro – o que será que Clarice Lispector está querendo dizer? Essa foi a questão.

O livro é divido em 3 partes: “Como se faz um homem”, “Nascimento do herói” e “A maça no Escuro”. Na primeira parte o leitor não terá a mínima idéia do porque Clarice escolher esse nome, porém, é um ótimo início onde cada personagem é mostrado com muita mestria, onde só o fluxo de consciência é capaz de carregar essa missão. Clarice Lispector é tão espetacular quanto Virginia Woolf nesse sentido. É maravilhoso mergulhar nas mentes dos personagens e eu, particularmente, não consigo ler um livro onde isso não aconteça de alguma forma. E esse mergulho permanece na segunda e terceira parte, não poderia ser diferente tratando-se de Clarice Lispector, e é nisso que mora toda a mágica do livro: muitas vezes precisei voltar à terra, recuperar meu fôlego, reencontrar meu equilíbrio de emoções e seguir no mar profundo da leitura. Delicioso!

Os personagens principais: Martim, Vitória e Ermelinda têm algo em comum: a necessidade de compreender o que se faz em cada passo, mas esses passos são dados sem, necessariamente, ter entendido o passo anterior. Não sei se isso é claro para eles como pessoas, mas Clarice Lispector “rouba” a mente deles e apresenta ao leitor tudo organizado, preciso, bonito. E ao mesmo tempo: louco, confuso, torto, divino. E não há como se perder na história, pois é um mergulho na confusão da humanidade, um apocalipse do que pode ser e o que não é. Puta que pariu (me desculpem o palavrão), mas Clarice Lispector é foda! Ao final do livro eu vi nitidamente a maça no escuro como se eu admirasse uma tela impressionista. E o que mais posso acrescentar perante isso? Estou anestesiada por conta desse livro, pois a aproximação que Clarice permite para cada personagem a cada página do livro é algo que somente os grandes escritores conseguem, e fico aqui boba pensando “e ela se achava amadora”. Sim, Clarice se achava amadora e afirmava gostar de ser assim porque se sentia livre para criar. Amém. Mas ela não tem nada de amadora e eu só pude compreender isso lendo A Maça no Escuro, devido a complexidade, a densidade, a consciência e o derrame perfeito de palavras para tentar compreender a vida, para tentar buscar um sentido. Sentido este que pode surgir de um ato mau para um bom ou de um bom para um mau. E, ao final, o importante, mas importante mesmo, não é encontrar o sentido e sim não ter medo de colher a maça no escuro.

http://acontadora.wordpress.com/2010/10/01/a-maca-no-escuro-de-clarice-lispector/
Felipe 25/06/2016minha estante
Que bacana tua resenha! Tô na página 30 e tô naquela vibe ainda de achar a leitura pesada, vira e mexe, ela dá uma sacudida na nossa mente com esse furacão de emoções.
Lendo aqui o que vc escreveu, até animei de continuar a leitura do livro. Obrigado.


Flávia 27/09/2017minha estante
Resenha tão boa que foi até copiada. Mundo estranho...




Frankcimarks 08/07/2020

Um leitor no escuro
Embora eu goste da estranheza que os livros de Clarice me geram, não gostei tanto da experiência deste aqui, infelizmente. O livro é sensorial e busca refletir sobre a existência humana, cheio de frases de efeito, filosóficas. Contudo, por ser denso e se aprofundar nos pensamentos das personagens, torna-se cansativo e repetitivo. Talvez eu não estivesse pronto para esta leitura, talvez Clarice tenha exagerado em suas reflexões. O fato é que ainda assim, ler Clarice é algo que vale a pena. É impossível terminar uma obra dela sem ser afetado de alguma maneira. Me senti no escuro muitas vezes, perdido, afundando em areia movediça. Clarice me arremessou num quarto escuro com a escrita deste volume. Me senti sufocado também, ansioso por terminar a obra.

O conhecimento é a luz que buscamos em meio as trevas. Estamos com fome de vida. Estendemos a mão para colher o fruto proibido, tateando, tropeçando. Fugimos de nós mesmos para nos encontrarmos sabe-se lá onde. Fugimos de nosso passado, nos maravilhamos com o presente e tememos o amanhã. Não podemos, contudo, correr para sempre. Um dia nos olhamos no espelho e lá estamos. Eu existo, eu penso, eu percebo, eu sinto, eu estou.

É por isso que eu gosto de ler Clarice, ela desperta algo adormecido dentro de mim. Até seus livros que não me agradam tanto me são preciosos, porque desbloqueiam minhas ideias, desatam o nó poético e filosófico da minha alma.
Hildo Frota 08/07/2020minha estante
Arrasou




Elion.Gabriel 07/10/2020

Analogia: a criação e a epifania do homem.
?Respirou devagar e com cuidado: crescer do?i. Respirou muito devagar e com cuidado. Tornar-se do?i. O homem teve a penosa impressa?o de ter ido longe demais.?
Trecho de A mac?a? no escuro; LISPECTOR, C - 1961.
Nessa obra, acompanhamos o desenvolvimento de Martim, a partir do momento em que ele resolve fugir da cena de um crime. Vagando pela imensida?o de uma densa vegetac?a?o arbo?rea, em crises existenciais, ate? se deparar com uma fazenda, onde moravam Vito?ria e Ermelinda. Essa primeira, rude. A outra, doce, meiga e cheia de vida.
Essa trama, quase filoso?fica, apresenta ao leitor a ascensa?o dos personagens. Como suas personalidades foram criadas, como seus modelos de mundo sa?o trac?ados a partir de seus contatos entre si. Ela descreve a profundeza da alma, a amplitude dos sentimentos, a lo?gica das ac?o?es e a dor das conseque?ncias.
E? um livro difi?cil, onde questo?es muito superiores a compreensa?o do senso comum sa?o abordadas. O que nos resta e? aprender humildemente com ele.
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Edna 02/04/2020

Ñ colha nada antecipado
A Maçã no Escuro ? escrito em 1956 publicado em 1961 é 4° romance de Clarice Lispector e o mais longo com 334 pag.

"Ñ ter esperança era a coisa mais estúpida que podia acontecer a um homem."

Este é sem dúvida o livro de Clarice que mais entrei em questionamento, sofri e me entediei com o caminhar reflexivo do Personagem.

Martin é o único hóspede de um hotel cuja rota principal fora desviada e seus proprietários insistem em mante-lo por razões diversas como em Psicose que ocorre um fato bem parecido em ambos os personagens estão em fuga por um crime.

Em uma manhã Martin percebe que o carro do dono do Hotel ñ está no lugar e se inquieta com a idéia de que fora descoberto e foram entregá-lo, foge pela janela e sai caminhando pela floresta, pela areia, muito sol, fome e o remorso o consome, reflexões, tortura e angústia.

Toda a narrativa fica cansativa, com toda a reflexão dele, que é inconstante, pelo enorme vazio que o acompanha, as questões existenciais vem à tona, desencadeando um fluxo de consciência no leitor ao mergulhar na história de Martin.

Quando Ele chega a uma fazenda, conta uma história a melhor que podia para conseguir se instalar, e como um ajudante é contratado e vai conhecer Vitória, Ermelinda, e vão se aprofundar nas histórias que envolverão suas vidas, questões amorosas, família, memórias e saudades, Ele passa a se sentir outra pessoa, como se todo o caos tivesse desencadeado nele outros valores, ñ mais a questão do homem traído, sentimentos de baixeza e sim como sentir o sol, o calor do fogo, o sentir vivo, e conquistar a liberdade interior, uma história de recriação.

Um livro profundo, filosófico e com desfecho inacreditável, o qual envolve todo um suspense sobre o crime e ao final vc descobre que é o fato menos importante, como se a trajetória que importa e não o destino ao qual você quer chegar e todas as lições apreendidas literalmente.

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kafkaniana 11/01/2023

Crime e Castigo brasileiro
"Imaginem uma pessoa, que não tinha coragem de se rejeitar: e então precisou de um ato que fizesse com que os outros a rejeitassem, e ela própria então não pudesse mais viver consigo"

O único protagonista masculino de Clarice e o romance mais longo da autora.
Lendo atentamente o monólogo do pássaro no início, todo o resto se torna uma continuação de nova atitude do personagem em lidar com a vida, a ideia de deixar tudo para trás, o crime, a palavra, o olhar, até a forma de pensamento, uma ideia de liberdade que vai além do próprio corpo liberto.
A literatura de Clarice sempre foi considerada algo muito abstrato, e aqui com a criação do Martim, ela tenta transformar o próprio homem em abstração. Um homem que se liberta de ser algo, para se transformar no novo, precisando de um grande estopim em forma de crime, para que enfim, pudesse criar-se novamente, como um Deus em si mesmo.
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CarolBapt 16/01/2021

Que experiência interessante!
O livro é dividido em 3 partes e evolui grandiosamente por entre elas. A primeira parte, para mim, foi a mais difícil de ler, mas a terceira foi maravilhosa. Aos poucos, eu me envolvi cada vez mais com a história e com as epifanias dos personagens. E que final! Mais uma vez, Clarice me deixa confortavelmente desconfortável!
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OgaiT 09/01/2020

Escrevendo um homem
Esse foi o romance de Clarice que mais enrolei para terminar. Talvez seja esse período natalino, sei lá! Da narrativa, mesmo, absorvi menos de 70%, mas como era de se esperar, gostei bastante da voz narrativa e da quebra que Clarice fez com esse livro, visto que nos demais romances, o ponto de vista é sempre feminino.
Em A Maçã no Escuro, temos Martim um homem que foge de seu passado, e que tenta reconstruir sua "masculinidade", ousaria afirmar que Clarice Lispector desejava mostrar o surgimento do Feminismo, e a quebra dos antigos padrões: o machismo e o patriarcado, por exemplo.
"Pois, se ele queria reconstruir o mundo, ele próprio não servia... Se queria, como último termo final de seu trabalho, chegar aos outros homens - teria antes que terminar de destruir totalmente seu modo antigo. Para que o mendigo à porta do cinema não fosse uma pessoa abtrata e perpétua, ele teria que começar de muito longe, e do primeiro começo. É verdade que faltava pouco para destruir, pois, com o crime, ele já destruíra muito. Mas não de todo. Havia ainda... havia ainda ele próprio, que era uma tentação constante." (p. 137).
Em outro trecho temos: "Mudaria os homens, que demorasse alguns séculos" (p.168). E com essa frase valido a tese anteriormente proposta.
Apesar de estar centrado em Martim, temos, como é de se esperar, personagens femininas: Ermelinda e Vitória situadas em um sítio do Município fictício de Vila Baixa. Ambas personagens densas, em particular a Ermelinda. O fim é espetacular a frase é perfeita, me lembrou o de "A Hora da Estrela". Este é um dos livros que pretendo reler em breve, sinto que trata-se de uma obra que cresce a cada releitura.
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Jamyle Dionísio 07/12/2021

Um mundo tateado
Não, não é um livro fácil. O início é uma provação: Martim foge por quarenta páginas. Foge. E chega ao deserto. Sim, é uma provação: quarenta páginas, quarenta dias no deserto (será uma coincidência?).

Martim mergulha na loucura, que é a perda da linguagem. A linguagem, que nos dá humanidade e nos conecta aos outros humanos, à civilização. Martim habita, portanto, o escuro. E dali, do escuro - escuro também é o útero - ele reaprende a Ser. Primeiro, identificando-se com as pedras, depois as plantas, depois os ratos, depois? (tem que ler, meu bem. Tem que ler.)

(Reaprende a Ser ou Nasce, novo? Tenho que pensar sobre isso?)

Martim chega à fazenda de Vitória, onde começa a fazer todo tipo de trabalho em troca de abrigo e comida. E ali, aos poucos, ele religa os elos quebrados de si. Reconstrói a memória: descobre por que fugiu, afinal. Sim, porque ele foge depois Daquilo. Do Ato. Do crime(?)

Clarice escreveu A Maçã no Escuro em Washington, onde vivia enquanto o marido, diplomata, servia na Embaixada do Brasil. Martim é Clarice que, perdida no exterior (ela não gostava de viver longe do Brasil), tateava o caminho de volta para ela mesma.

(Spoiler: Clarice separa-se do marido e volta para o Brasil)

https://www.instagram.com/chadepalavra/p/CU5AvdCLET0/?utm_medium=copy_link
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dani 04/01/2023

O Revelar de Clarice
Se me pedissem para definir esse livro em uma palavra: limitação. Limitação seria a palavra. Limitação da palavra.

Aqui Clarice explora os limites para se alcançar algo maior, a liberdade.

A gente sente o anseio dos personagens enquanto eles vão fundo, no âmago humano, na procura de sentir algo, de sentir a parte fundamental da vida, daquilo que é essencial.

Este livro é uma homenagem aos nossos crimes, aqueles que cometemos ou que deixamos de cometer, este livro é uma saudação ao que vivemos, é um tributo a nossas ansiedades, a nossas imaginações, ao nosso criar na vida adulta. Este livro é um aceno ao instante, aquele que é pequeno e as vezes deixamos passar sem perceber, e aquele instante que sentimos que pode mudar nosso rumo. Este livro é um camuflar de nossos medos.

Este livro, sinto, é o início daquilo que Clarice acaba por se tornar no futuro.

É o revelar de Clarice.
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anaartnic 19/01/2023

Porque entender é um modo de olhar
Martim é um criminoso, ele cometeu um crime e está fugindo por conta disso. Martim é diferente de mim, leitora, que não cometeu um crime qualquer. Clarice Lispector consegue dissecar a construção de uma homem e, desta maneira, demonstrar que a minha essência tal como a de Martim possui uma mesma gênese.

Esse romance de Clarice é totalmente diferente dos demais que já li, sobretudo pelo fato do protagonista ser um homem. A obra é dividida em três partes e é um dos livros mais longos de Clarice que já li e, além disso, as reflexões chegam a um nível que a leitura se tornou um pouco arrastada em certas partes. Senti, em alguns momentos, que muitos pontos eram iniciados, porém sem conclusões, em alguns momentos o próprio protagonista diz que não está chegando a lugar algum.

Na primeira parte Martim está fugindo, esta fuga me lembrou muito o caso daquele "serial killer", o Lázaro, fugindo pela mata e buscando entender a sua culpa. Na segunda, há a adaptação de Martim na fazenda em que ele está trabalhando, ele se sente feliz e adaptado. Na terceira, a casa começa a cair (sem mais, para não haver spoilers).

Eu li sabendo o crime que ele cometeu, o caráter do crime e algumas atitudes dele fizeram com que eu não conseguisse criar uma empatia pelo personagem. Mas ele não precisa de empatia, ele precisava apenas encontrar-se em si mesmo, assim como o livro foi me conduzindo ao mesmo caminho.

"o que verdadeiramente simoso é aquilo que o impossível cria em nós"

Apesar de não terem o protagonismo, as primas Ermelinda e Vitória tiveram um papel essencial nas reflexões que o livro suscita. A primeira tem medo da morte, a segunda o medo de viver, e longe de serem questões simples, elas envolvem muitos sentimentos profundos e, de alguma forma, inerentes ao ser humano.

Afinal, o que somos enquanto seres humanos? O que precisamos saber? O que temos? Esse livro não responde tudo, mas oferece muitos caminhos para essa nossa trajetória em busca do sentido.

"Porque eu, meu filho, eu só tenho fome. E esse modo instável de pegar no escuro uma maçã - sem que ela caia."
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Rone Oliveira 25/02/2017

Obra Analisada: A MAÇÃ NO ESCURO
O objetivo desse trabalho consiste em acompanhar detalhadamente a partir da leitura pessoal da obra “A Maça no Escuro” de Clarice Lispector, e, sobretudo, ampliar o nosso entendimento quanto às questões filosóficas adjacentes na trama e, bem como elaborar uma análise contextual sobre a história vivida por Martim, personagem principal do romance.
A temática em questão se dá a partir da dimensão antropológica, tendo em vista a ênfase da autora sobre a existência humana, razão pela qual abordaremos como cerne do nosso trabalho as relações entre verdade-identidade-liberdade, conceitos que fazem parte do processo de autoconsciência de Martim, na qual o mesmo busca estabelecer a sua própria ordenação diante da ruptura com o seu passado após cometer um ato criminoso.
Percebemos em Martim um confronto psíquico onde é evidenciada uma certa limitação oriunda da condição humana pela relação que se estabelece entre o sujeito e o mundo, confeccionando por assim dizer; o desfavorecimento do fracasso humano em face da subjetividade, cumprindo a função de situá-lo na realidade objetiva a ponto de transformá-la na imagem pertencente ao indivíduo, isto é, o sujeito real da vida mediante a sua condição singular.
Surge por meio da experiência de Martim, um sentimento de culpa e impotência incapacitando-o de compreender a realidade. Ele admite também, um drama pessoal na tentativa de conciliar-se com o mundo, pois, sentia uma enorme dificuldade de conceber a linguagem. Apoiava-se na possibilidade de encontrar em algumas palavras consideradas chaves, na qual funcionariam como uma espécie de orientação. Entre estas palavras chaves; os termos: “Misericórdia”, “Valorosa e Boa”, “Salvação” e outras são tidas a princípio por Martim como uma fonte escrita capaz de guiá-lo, embora, nenhuma dessas satisfizesse a sua expectativa.
Martim viveria uma experiência antagônica em meio o seu contato físico com exterioridade do mundo e sua interioridade, pois, ele se identificava a partir de suas experiências com as coisas externas na qual parecia refletir em si mesmo. O contato com a natureza, por exemplo, lhe fizera muito bem.
Teria Martim evoluído muito com o contato direto com a natureza e os animais, sendo que ele também se reconhecia como ser humano e se moldava como pessoa através da absorção do mundo externo em si.
Há uma presença de termos dualistas na obra de Clarice, isso demonstra a existência de oposições e formas distintas, como por exemplo: as relações entre o bem e o mal, a consciência e o inconsciente, a luz e a escuridão, vida e morte, negar e afirmar, a alma e o corpo, a compreensão e incompreensão, o medo e a coragem etc., as quais não poderiam de modo algum serem reduzidas umas às outras.
O suposto crime mudaria a vida de Martim por completo, razão pela qual, ele foi obrigado seguir em busca de sua liberdade a partir de si. Começava assim, o seu “descortinar”, de modo que, ele encarava o fato dele mesmo ser seu próprio ponto de partida para se tornar um novo homem.
Desde o inicio da obra, nota-se uma variedade de aspectos que correlacionam como tantos outros temas sugeridos nesta proposta acadêmica, mas, em se tratando do desejo de delimitar melhor o nossa reflexão com base no romance de Lispector, aprofundaremos na tríade que diz respeito à verdade, identidade e liberdade pelo fato delas estarem interligadas. Além do mais, os temas escolhidos são pertinentes e já foram tratados por grandes nomes da tradição filosófica.
Pouco se sabe da vida de Martim antes de sua chegada ao hotel abandonado. Ele estava em fuga, aliás, esta fuga mais parecia uma viagem sem destino, pois, o personagem principal partia pelo menos a duas semanas, provavelmente de um lugar civilizado, onde teria convivido por longos anos.
Martim deixou a cidade, se afastando de toda a coletividade, motivo pelo qual lhe permitiu gastar mais tempo consigo mesmo. Com efeito, ele precisava esvaziar a sua mente para depois quem sabe poder pensar em se reerguer ou quem sabe reconstruir-se de um modo mais decente a partir de uma nova perspectiva de vida, uma nova vida constituída pela sua própria convivência em meio o mundo real. Martim estava repleto de dúvidas, no entanto, se dispunha ir a qualquer custo em busca da verdade, mesmo encontrando muitas dificuldades em sua caminhada.
(Coragem) Como podemos falar em dificuldade para Martim se ele mesmo já não tinha reconhecido que não havia nada perder. Inconscientemente, ele deixava a sorte lhe conduzir, tendo em vista que alguma coisa parecia lhe proteger; talvez fosse à segurança proveniente do desejo de mudança, do recomeço. De modo que, Começar do zero seria um método que lhe dispunha a negar respectivamente; o próprio passado, o pecado ou o ato impensado?
Em “A maça no escuro” é possível que se faça uma analogia com a famosa obra de Platão: O contexto de “O Mito da Caverna” tendo em vista uma ligeira semelhança explícita entre os temas libertação e descoberta com o momento em que Martim decide partir para o descampado em busca de novos horizontes. Assim, o prisioneiro que vivia restritamente em uma caverna e tinha como referência a realidade apresentada por sombras projetadas de uma fogueira, e, no instante que se depreendia dos grilhões, o prisioneiro partiria da caverna em busca da compreensão do mundo. É nesse instante que o homem descobre novas paisagens, outras possibilidades de enxergar a realidade.
O sol ilumina toda a superfície da terra ampliando as possibilidades de entendimento, o mundo anterior, o da caverna lhe trazia a incerteza quanto à realidade. As especulações reduziam as chances de compreensão humana, a verdade não era possível sem a luz do conhecimento.
A busca da verdade pessoal de Martim desencadeava na procura da liberdade a partir dele mesmo, ele seria a sua própria chance de redenção, portanto, ele procurava reunir em seu interior os elementos primordiais para evolução do próprio ser, ele precisava se tornar o que estava sendo.
Aqui, fica clara a tomada de consciência de Martim, movida pelo processo de maturação da sua personalidade reproduzida durante o percurso de seu desenvolvimento a partir das especificidades proveniente da relação indivíduo com o mundo; as atividades e experiências pessoais resultantes das relações motivos e circunstâncias e ordenação categórica entre consciência de si no mundo e a autoconsciência.
A tomada da autoconsciência de Martim advém da busca da consciência de si mesmo como indivíduo, de suas capacidades, dos limites e possibilidades de compreender-se na universalidade. Com efeito, a mudança comportamental de Martim lhe permite a efetivação de sua essência enquanto “Ser” através da sua ação e reconhecimento nos âmbitos: trabalho, consciência, social, universal e liberdade.
O livro é dividido em três partes, “Como se faz um homem”, “O nascimento do herói” e “A maçã no escuro”, sendo que o último deles intitula o nome do romance de Clarice Lispector. No primeiro deles, “Como se faz um homem”, a clássica frase estampada no oráculo de Delfos: conhece-te a ti mesmo entra em cena implicitamente. Há uma passagem de Martim que nos leva pensar na busca do ser humano a partir da própria identidade.
O conhece-te a ti mesmo presente em “A maça no escuro” denota uma exigência reflexiva. Assim, “o sujeito conhecedor” deveria se perguntar pelas causas que se entrelaçam nesta máxima, e a partir dela poderia lhe dizer mais sobre ele próprio. Em contra partida, como poderia ser também uma reflexão que iria até os limites da causalidade, sendo que a reflexão emergiria sobre as seguintes problemáticas: O real lugar do indivíduo, o lugar de si próprio perante o mundo e perante aos outros homens.
Do ponto de vista filosófico, Aristóteles em sua Ética a Nicômaco dizia que a natureza humana visa um fim último, isto quer dizer que, o fim último do homem consiste na felicidade e para ele, a felicidade seria alcançada quando o homem agisse da melhor forma possível, explorando a sua habilidade, de modo que ele passaria a ser o artificie da sua própria vida, tornando-se virtuoso.
Portanto, para Aristóteles, a felicidade é o bem supremo, o fim último do homem, e resulta da razão e inteligência. No caso de Martim, poderíamos pensar que a sua felicidade viria a partir do momento que ele se tornasse livre. Embora, a sua liberdade fosse ainda, uma consequência do seu renascimento, uma motivação capaz de torná-lo quem ele deveria ser, e, portanto, como recompensa ele se alegraria a si mesmo.
“O torna-te a si mesmo” para Martim nada mais era do que a sua metamorfose, o seu ato de heroísmo. Era preciso representar-se a si mesmo para se tornar um herói, e, no entanto, tudo isso dependeria do seu autoconhecimento, a busca da verdade que habitava em si.
Martim se distanciou de sua própria inteligência, pois, segundo ele, a inteligência não passava de uma imitação e por isso deixou de imitar os outros, se comparava com um rato por se preocupar somente com sua própria sobrevivência, pois, assim ele se encontrava no mundo, tirava toda a sua responsabilidade de ser o culpado pelo seu sofrimento.
(Citar) Martim criava a sua própria verdade para depois poder crê nela: {...} “Se reconstruía a partir de suas próprias palavras, e por isso, era preciso ter muita paciência com ele, ele era lento. Que queria ele? Reconstruir-se”. (Lispector, p.124). Pensar na verdade era algo incerto, a única verdade que Martim carregava era a certeza do amor que sentia pelo seu filho, por isso talvez, não importava se a verdade existia ou fosse criada.
A identidade em Martim é compreendida como metamorfose do “eu” e, através da sua metamorfose questionou-se na possibilidade de ser reconhecido se caso viesse a ser transformado pela descoberta da verdade. Nesse processo de reconstrução, Martim chegou a pensar em uma pista sobre a verdade, e, segundo ele, o entendimento poderia fazer parte da resignação, o sofrimento poderia então purificá-lo, de modo, a desvelar a sua identidade. Martim deveria assim, aguentar firme a sua penitencia.
Martim reflete sobre o autoconhecimento socrático: {...} “Teve a certeza intuitiva de que não somos nada do que pensamos e somos o que ele estava sendo agora, um dia depois que nascemos nós nos inventamos — mas nós somos o que ele era agora.”. (Lispector p. 212). Ele estava sendo o que era. E de certo modo, se de um lado, o “Ser” de Martim consistia na também na busca harmônica pela sua salvação, o “Ser” também lhe causava muita dor, uma vez que para ele ser deveria ter consciência de sua identidade, o que lhe obrigava a ser novamente homem, ser inteligente e deixar de parecer com os bichos, animais e plantas.
Em se tratando do fim último do homem, a felicidade para Aristóteles em minha análise é convertida em liberdade como o telos (a finalidade última) de Martim; notamos a intencionalidade do protagonista em enfatizar a liberdade como um fator essencial na realização do ser humano.
Realização esta, que necessitaria do esforço pessoal de cada um para alcançá-la através do encontro autorreflexivo, do movimento introspectivo e prático; isto é, a verdade seria a responsável pelo entendimento e firmamento da identidade de cada um, como vimos nesse trecho: {...} “Um homem sem vocação deveria ao menos ter a vantagem de ser livre”. (Lispector. p. 274).
A liberdade de Martim desencadeava em seu próprio bem-estar, e pelo fato dele se identificar com o sítio, ele passou a sentir harmonia e paz ao reconhecer-se naquela nova vida: {...} “Martim olhava para si sem sentir vergonha, era seu primeiro passo seguro para a sua própria reconstrução, pela primeira vez se amava”.
A terceira e última parte do romance; “A Maça no Escuro” poderia ser uma alusão à passagem bíblica da maçã, como a árvore do conhecimento. A figura da maçã denota uma certa simbologia na história da humanidade por se tratar de um meio de conhecimento, tanto pelas as vias do bem, como também para as do mal. Por fim, o termo escuro poderia advir da falta de entendimento, da incompreensão, da limitação humana e tec.
O entendimento Martim quanto ao real e o seu “eu interior” poderia lhe transformar em um novo homem, a ponto de descobrir por si próprio e também pela sua experiência o verdadeiro sentido da existência ou a finalidade do viver. O seu ponto de partida deveria ser ele mesmo, um fruto do silencio e da incompreensão, enquanto a liberdade radical teria sido uma necessidade de apagar o vazio da alma através da recriação do seu mundo pela descoberta da verdade pessoal. E segundo a autora quanto mais ele se aproximava da sua verdade, mais ele se encontrava: {...} ”Martim parece mais confortável com a descoberta de sua verdade, as palavras “valorosa e boa” lhe trouxeram um prazer interior”. (Lispector. p. 303).
No processo de constituição da identidade do protagonista nasce um processo de constituição do “eu” de Martim, promovendo constantes transformações decorrentes das condições sociais e de vida que o indivíduo se insere. No processo de constituição de sua identidade, Martim assume uma função de autoprodução de si ao longo da sua nova vida, partindo de uma identidade idealizada em relação ao desempenho desse novo plano. A vida torna-se o seu próprio projeto de vida. Deste modo, a identidade é construída continuamente, pois, o indivíduo vivencia ao mesmo tempo vários papéis, o que o torna um personagem da sua vida, Martim se metamorfoseia de acordo com as condições submetidas.
Diante do exposto, a nossa reflexão sobre o romance de Clarice nos propõe a pensar o ser humano mediante o seu processo de construção; o nascimento, a negação, a morte, o ressureição, a afirmação, a autoconsciência e a identidade são as fases constituintes da vida de Martim. “A Maçã no Escuro" revela em um primeiro momento uma ruptura do protagonista sob a negação da vida, e, por conseguinte, o nascimento de um novo homem em decorrência suposto crime como uma espécie de metamorfose a partir da autoconsciência. Por fim; o retorno à condição humana o torna novamente um homem comum em meio às adversidades da vida e prontamente a regressar juntamente a ao convívio social e a sua existencialidade.

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HeloAsa.Oliveira 01/04/2021

A maçã no escuro
O romance lançado em 1974,tem mais de trezentas páginas recheadas de símbolos e questões existenciais, a leitura é densa,mas libertadora. A obra tem como protagonista uma figura masculina e se divide em 3 partes: "Como se faz um homem", "Nascimento do herói" e " A maçã no escuro".

No começo da narrativa a leitura é bem fluída, já que o leitor acompanha a fuga de Martim depois de cometer o crime que vai ser ponto de partida para todo o desenvolvimento da história(mas já aviso que o crime só vai ser revelado na última parte).A partir da fuga de Martim,depois de cometer o crime, com 0 arrependimentos, ele foge por medo de ser preso. O crime significa o desprendimento do que a sociedade julga como certo e moral,Martim entra em um processo de libertação, em que o autoconhecimento, o isolamento e o pensamento vai render uns bons parágrafos de fluxo de consciência.

Depois de peregrinar, tendo contanto com a natureza e os animais , Martim procura abrigo e encontra uma fazenda, comandada por Vitória, ela vai contratá- lo para trabalhar ali.
Vitória representa o poder e a razão, enquanto sua prima, Ermelinda, representa a sensibilidade e a emoção, acontece entre eles uma espécie de triângulo amoroso.

É na fazenda que o homem vai reconstruir a sua humanidade, aliando o pensamento ao corpo, aqui Clarice trabalha com a ideia de corpo e alma, o corpo físico agora se cansa e sente desejos sexuais, além de tentar dar nome ás coisas que sente,deseja e tem medo. O que faz alguém mais humano do que a linguagem?

Por fim, o seu crime é relevado e a sua volta á civilização da qual fugia, é inevitável, já que ele será preso. Sua humanização foi reiventada com o crime e suas consequências. No final há uma concepção de que o corpo e a alma são prisões, ser humano de uma maneira geral, é viver sem compreender o sentido da vida e o desmaparo do criador.

A maçã em sua concepção bíblica, é o fruto proibido que trás o conhecimento, Martim está na escuridão e come do fruto, comete um crime, para que ele se encontre e se descubra humano de novo.
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Ludmila119 31/08/2016

Maça no escuro
Ótimo livro
Flávia 27/09/2017minha estante
Estou louca ou essa resenha foi copiada da Fran? Espero que meu skoob esteja louco.O




Marcos Nandi 06/08/2021

Não ter esperança é um luxo
A história do livro começa no mês de março, onde somos apresentados ao personagem principal da história: Martin.

As primeiras páginas existem poucas informações sobre ele, apenas sabemos que uma casa foi incendiada e que ele provavelmente, cometeu um crime.

As primeiras páginas são um pouco confusas, pois, ele chega a um hotel. Logo depois, vemos Martin andar a ermo até chegar na fazendo da senhora Vitória, trabalhando (contratado a muito contragosto, Vitória não lhe é mto simpática) em troca de comida e lugar para dormir como faz tudo.

Vitória era austera, e morava com o estranho Francisco e com Ermelinda, que passou a morar no sítio depois da morte de seu marido e de primeira, já se apaixonou por Martin.

Na primeira parte, mostra Martin se acostumando a sua nova vida e como Vitória infernizaria sua vida exigindo cada vez mais trabalhos e como Emerlinda estava apaixonada.

Na segunda parte temos uma questão mais filosófica sobre escolhas e sobre a vida. E aí, descobrimos mais sobre a vida de Martin.

Um livro árido como quase toda história contada pela Clarice. Mesmo passando por um momento de ressaca literária, me forcei a ler o livro todo (mais lento que o normal, é claro, mas terminei), e o livro é mto bom. Vale a pena. Quero reler futuramente, já que é uma leitura que exige.
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