Madame Bovary

Madame Bovary Gustave Flaubert




Resenhas - Madame Bovary


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Tábata Kotowiski 06/12/2010

Madame Bovary conta a história de Emma, uma moça criada no campo mas com sonhos burgueses. Inspirada pelo que lê nos livros, Emma quer uma vida melhor, cheia de mimos e coisas que só os ricos podem comprar. Pensando que poderá alcançar o que tanto quer, Emma casa com Charles Bovary, um médico também do interior. Charles ama Emma apaixonadamente mas por ignorância não dá valor as coisas que a Emma dá, não vê a beleza como Emma vê e é, na visão da própria, extremamente entediante. Tentando suprir essa falta que o sonho de uma vida melhor faz, Emma procura em outros homens o alicerce para os seus desejos. Resumindo: Emma é uma safadénha.

No início do livro, logo depois que Emma casa com Charles, que é quando sabemos da sua urgência pela aventura e pelo que é diferente, requintado e belo, fiquei com pena de Emma. Acho que ela é o reflexo de muitas mulheres, inclusive as modernas, que são presas ou pela família ou pelo marido ou pela sociedade e não podem vivenciar as suas paixões. Acontece que durante a leitura, a medida que Emma se torna mais difícil de ser agradada, apesar das tentativas constantes do marido e dos amantes, Emma se torna chata. Dá vontade de esganar Madame Bovary, aquela safada. E no final do livro, a gente quer é mais que o Senhor Bovary dê uma pé nas nádegas da Madame e mande ela pastar, porque ô criatura difícil de agradar, sô.

Gustave Flaubert escreveu Madame Bovary primorosamente e maravilhosamente bem. Já que o livro tem poucos diálogos, grande parte dos acontecimentos são totalmente narrados mas isso não o torna um livro entediante. Flaubert não abusa das descrições (não é um Eça de Queiroz, thanksgod) e a narrativa flui. Dá para ir imaginando tudinho dentro da cachola. Há livros que tem poucas descrições dos personagens e do cenário, daí fica difícil imaginar como o autor os imaginou quando os escreveu. Com Madame Bovary dá para imaginar cada expressão de Emma, cada atitude de Charles e todo o ambiente onde a história se desenrola. Eu ainda tenho na cabeça como é a casa do casal :) É muito bom!

Madame Bovary foi escrito em 1857 e foi considerado um escândalo na época. Imaginem! Sem falar no adultério de Emma, um ultraje para a época, o livro critica muito a igreja e a burguesia. Flaubert foi a julgamento diversas vezes pelo romance e em uma de suas defesas, Flaubert declarou Emma Bovary cest moi (eu sou Emma Bovary), falando assim da sua própria indignação com o clero, a sociedade e as coisas mundanas. Apesar das acusações, Flaubert nunca foi preso.

Quem tiver a oportunidade de ter o livro nas mãos, ou quem já tem na estante e nunca leu, eu digo, leiam. Leiam porque vocês vão adorar. Não liguem pra Emma, coitada. Ela é bem doida varrida, louca de pedra mas vale cem por cento da leitura, é claro.

:D

p.s. e update: escrevi essa resenha em 2010! Se tivesse que reescreve-la agora em 2017, seria algo muito diferente. Tenho uma visão feminista que simplesmente não existia há 10 anos, então nunca descreveria Emma como safada ou doida de pedra. E penso que teria muito mais pena dela do que tive na época.
Pensei em excluir a resenha mas ela mostra o que achei do livro na época, vale como arquivo histórico... hahahahaha Quem sabe uma releitura e uma nova resenha num futuro próximo?

site: randomicidades.wordpress.com/
Mayara Freitas 03/02/2011minha estante
huahauha...safadénha..essa foi engraçada..fiquei com vontade de ler o livro!!


Maíra Munaretto 03/03/2011minha estante
ótima resenha!


Alexandre 08/05/2011minha estante
Ótima resenha. O livro é isso tudo mesmo. Inclusive o que você disse sobre Emma é veridico, Safadinha mesmo! Houve momentos em que eu fiquei com muita raiva dela. Em outros com pena.
Se me permitem, gostaria de dizer que não gostei do final. Porém o que torna um final bom é que ele se pareça com a realidade ? não é mesmo? Nem conto de fadas, nem tragédia; algo satisfatório para o leitor.


Gustavo 11/11/2011minha estante
Adorei a sua resenha! Exceto sobre Emma. Eu gostava dela (risos). Principalmente qdo ela bate de frente com a Sra. Bovary mãe dizendo que ela é uma velha retógrada (risos...) - dizendo o português claro e atual -. Claro que Emma era do bafo. Deveria ser uma sargitáriana (risos). Mas faço de suas palavras as minhas para recomendação do livro.


Gi Marques 03/01/2012minha estante
Adorei sua resenha! Me deu uma super vontade de ler, hahahaha! Ainda mais pelo "Não é um Eça de Queirós", porque senhor Queirós que me perdoe, mas o senhor fala demais... rs
Ótima resenha!


Glaw 09/10/2012minha estante
adorei sua resenha...ja li esse livro e concordo completamente com vc...é um otimo livro e recomendo que leiam... é uma historia que prende a atenção e faz com que o leitor viaje por suas paginas....bom de mais.


Marina 09/03/2013minha estante
Eu tenho este livro, fiquei com vontade de ler mas não peguei porque não sabia se era realmente bom. Sua resenha me fez decidir. Parabéns e obrigada!


meniniinha 15/08/2013minha estante
Tata Kotowiski, eu AMMMEEEEEEEEEEIIIIIIIIIII a tua resenha!!!! Nossa!!Vc descredeu o teu ponto de vista, de modo que incite qualquer pesssoa ler a obra, Madame Bovary!!!Pela tua bela resenha deveras o livro merece ser lido!!!


Andye 22/09/2013minha estante
Sério? Eu tenho. Li. Mas pra mim foi massante. Gostei tanto da tua resenha que depois dos inúmeros que ainda tenho na lista pra esse ano, vou reler.


NATI 29/10/2013minha estante
Ótima resenha, concordo com a riqueza do livro, discordo quanto a Ema. Amei a personagem. Claro que quanto mais passa o tempo, mais difícil ela é de se agradar, mas de doida ela não tem nada. É tudo pura frustração por uma vida que ela nunca desejou. E no fim, ela se viu só. Muito triste :/


Érica 04/08/2014minha estante
Gostei muito da sua resenha. Defende o livro, apesar de. Gosto disso. Lembro que não gostei de Madame Bovary quando o li. Mas, confesso que, hoje, acredito que eu não possuía maturidade para apreender a obra. Então, pretendo relê-lo.


Marcelo 22/11/2014minha estante
hum...safadénha


Tatiana 22/04/2015minha estante
então...fiquei curiosa...vou comprar o livro


Paula 06/05/2016minha estante
concordo com a parte da Emma, mas o livro (em minha opinião) é entendiante mesmo, achei uma perda de tempo, porque não achei nada demais, apesar da critica ser boa e da personagem personificar a vida de muitas mulheres (imaginei que eu também não gostaria de ter a vida dela)... enfim, não gostei mesmo, esperava mais


Ilton Paiva 05/03/2017minha estante
Excelente resenha.
"Safadenha" foi o máximo.


Erica.Cinara 19/06/2017minha estante
Hilária e leve resenha! Madame Bovary, infelizmente é muito atual ao retratar a cultura da artificialidade, das máscaras e da egolatria de uma sociedade adoecida.
Parabéns pela leveza da resenha!


Rosana.Pedroso 24/08/2017minha estante
O meu está na estante há anos. Fiquei com vontade de bater a poeira e ler logo!!!


Rafa 10/01/2018minha estante
Sou pro Emma e pro Flaubert... kkk... o legal é que a personagem marcou tanto que criou um termo para se designar aquela pessoa que vive alheia à realidade. O que Emma faz da sua vida sexual é problema dela, e no fim das contas, é o estado de insatisfação enorme que ela tem com relação à sua vida que incomoda tanto.


Zé - #lerateondepuder 14/07/2019minha estante
Sua resenha foi perfeita. Começou comentando sobre a trama, destacou o papel dos personagens, envolvendo o contexto histórico da época e ainda descreveu o significado do livro, principalmente para você. Vai, com certeza, me inspirar a escrever minhas resenhas. Parabéns!


Lenicio 01/03/2020minha estante
Começando a ler. O que me surpreende, até agora, é a técnica impecável de Flaubert. Uma prosa que mais parece poesia. Sinto que é um livro para degustar, pouco a pouco, para propiciar reflexão.


Daniel.Malaquias 29/05/2020minha estante
O que posso acrescentar a sua resenha é: Madame Bovary somos todos nós.


Raquel 02/09/2020minha estante
Adorei a resenha! Li esse livro há uns 15 anos e ainda me lembro das descrições bem realistas que me fascinaram. Por isso ainda é um dos meus preferidos, ainda tenho algumas cenas bem nítidas guardadas na memória.


Camila.Gama 10/02/2021minha estante
Que bela resenha! ??????


Isadora 06/03/2021minha estante
Nossa senhora eu estou perdendo a paciência pois estou achando que é descrição demaaaais!!! Kkkkk


Ulisses 25/03/2021minha estante
Adorei sua resenha!! Gustave Flaubert realmente enche de descrições o livro o que nos possibilita imaginar muito! Minha escola me obrigou a ler esse livro em 2019, eu não era muito fã de livros mas esse me fez gostar, foi o primeiro grande livro que li e me orgulho disso!!


Akila.Priscilla 20/04/2021minha estante
Adorei a sua resenha. Vou ler esse livro. O livro da sadênha Bovary


Paola 26/11/2021minha estante
Excelente reflexão e postura diante da mudança de percepção


Margô 14/12/2021minha estante
Gostei da tua resenha...sem muita lenga-lenga...rss. Li esta obra há anos atrás. Foi bom rever o conteúdo através do teu comentário!??


Aninha 10/02/2022minha estante
Pior livro...afeee péssimo


02/03/2022minha estante
Eu tô lendo agora. Tô achando a narrativa um pouco cansativa devido a falta de diálogo. Mas pretendo terminar para tirar as minhas próprias conclusões rsrs. Obrigada pela resenha, vai fazer com que eu não desista rsrs


Marcos 08/11/2022minha estante
Tem descrições que são sim, cansativas e chatas de se ler. Faz vc parar de ler e continuar outro dia. Acredito que sou umas das poucas pessoas a não gostar do livro.


Nati 22/02/2023minha estante
Queria saber uma boa tradução para o livro!


th;2 06/03/2023minha estante
Fiquei super decepcionada com alguns termos usados para descrever Madame Bovary, mas no final vi a retratação, e vi o ano em que fez a postagem. Pensei que fosse alguém muito jovem. Acho reducionista chamar a protagonista de safada por sair com vários, dentro do contexto, e olha que nem li ainda! Não vamos reduzir os personagens!


Marcos 21/04/2023minha estante
Nati a melhor tradução é a da Fúlvia Moretto.


Nati 23/04/2023minha estante
Obrigada Marcos ??


Marcos 05/05/2023minha estante
mas a da edição da penguin e companhia é excelente também. com a tradução do Mário laranjeira.


fabianapdsr 23/06/2023minha estante
Adorei a resenha me deu vontade de ler


Andrea.Karli 11/07/2023minha estante
Sim achei o livro bem legal e sentia muitas vezes ódio e pena da Emma. Enfim, o final me deixou bem triste pela protagonista, o Carlos enfim sofreu horrores de amor pela sua esposa e a narrativa é algo que me deixou vidrada! Ótima resenha do livro!


Marta163 03/01/2024minha estante
Ganhei este livro e a pessoa que me deu nem chegou a ler, disse que não se interessou. Lendo essa resenha, me deu mais vontade de ler. Obrigada!


Fefê 07/01/2024minha estante
Gostei de sua resenha Tábata, apesar de ingênua mas ,como disse, era sua visão da época. Estou iniciando a leitura deste clássico hoje e espero gostar tant quanto você gostou.

Obrigado pelo incentivo...


Sandra722 02/02/2024minha estante
Já quero ler


raquelpets 04/02/2024minha estante
Eu sempre senti tanta empatia em relação à Emma que fiquei chocada ao ler o início da tua resenha :)
Ao final, me deu aquele alívio quando tu reconheces que os sentimentos da personagem podem ser legítimos. Todos nós temos insatisfações e desejos, todos nós buscamos por algo, em alguma medida.




MatheusPetris 10/04/2022

O epitalâmio é, na verdade, uma marcha fúnebre. Ou seja, A Necrópsia, seria um outro possível título para Madame Bovary. Um profundo drama burguês. Drama naquela definição de Victor Hugo, contemporâneo de Flaubert, que tendo afirmado que o drama é uma tragédia sob uma comédia, pressagiou a derrocada de Emma. Ouso sintetizar sua estrutura: uma espiral que suga Emma para dentro dela. Por essa estrutura, investiga-se uma vida em espiral de sofrimento, na qual a felicidade existe apenas em prol da ruína. Se a esperança surge, é apenas para se desvanecer. O tédio, acrescido do sofrimento (que vai e volta), é uma constante.

Flaubert alcançou seu objetivo: a despersonalização. Se afastou de seu livro em prol de um estilo sóbrio. Algo já identificado por Baudelaire pouco tempo depois de sua publicação… Não por menos, Flaubert respondeu o ensaio do poeta, afirmando que o mesmo invadiu sua mente. É claro, para nós, filhos do século XX e XXI, é muito “fácil” perceber isso quando temos em mãos as correspondências de Flaubert. É tudo sobre o estilo. Se pretende escrever, conceba um estilo antes de sequer tocar na pena, foi o que nos disse o maior prosador do século XIX. Através dele, Gustave zombou de sua própria classe. No meio dela, debochou como quis. O mais excêntrico, petulante e arrogante personagem, Homais, é o único com um final ascendente… Um perfeito representante da classe burguesa.

E não pensem que se trata de uma militância ou de objetivos (diretamente) políticos, é, única e exclusivamente, um exercício estético. Sua completa e total harmonia, lapidam cada pequeno detalhe de forma precisa e em benefício da narrativa. Eis o verdadeiro significado de unidade. Se cada capítulo tem uma força própria, uma construção visando um objetivo muito bem delineado e claro, é pela possibilidade de se concatenar cada fragmento. Cada frase — aquela que busca o caráter inviolável de um verso —, cada parágrafo, cada capítulo, cada parte, aproximam a prosa do ofício de um poeta. Flaubert, arrisco dizer, é o poeta da prosa.

Não me alongarei mais. Pretendo, em uma futura releitura, escrever um ensaio sério sobre o romance com a devida atenção e detalhamento que ele merece. Por hora, ficarei com esses comentários gerais (e genéricos num certo sentido) e atesto: pode não ser meu romance favorito, mas com certeza é o melhor que já li.
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Larissagris 30/12/2023

MADAME BOVARY (GUSTAVE FLAUBERT)
Pois, calmamente, um dia depois do outro, uma primavera atrás de um inverno, um outono em cima de um verão, a coisa foi-se passando, pouco a pouco, gota a gota; tudo sumiu, tudo fugiu, tudo desceu, como se diz porque no fundo sempre resta alguma coisa, assim... um peso aqui, no peito! Mas, visto que é a sorte que nos espera, a gente não deve desanimar e, porque outros morram, querer morrer também. (Pág. 27)

E, na estrada principal, que estendia sem fim a sua extensa fita de pó, nos caminhos estreitos onde as árvores se entrelaçavam formando caramanchão, com o sol nas costas e o ar da manhã nas narinas, o coração transbordando dos prazeres da noite, o espírito tranquilo, a carne satisfeita, ia ele ruminando a sua felicidade, como quem fica ainda mastigando, depois do jantar, o gosto das trufas que está digerindo. (Pág. 39)

Entretanto, agora, possuía, para toda a vida, aquela mulher bonita, a quem adorava. Para ele o mundo não ia além da sedosa circunferência das suas saias; achava que não a amava o suficiente e sentia saudades dela. (Pág. 39)

Antes de se casar, julgara sentir amor; mas, como a ventura resultante desse amor não aparecia, com certeza se enganara, pensava ela. E procurava saber qual era, afinal, o significado certo, nesta vida, das palavras "felicidade", "paixão" e "embriaguez", que nos livros pareciam tão belas. (Pág. 40)

Acaso não necessita o amor, como certas plantas, de terreno preparado, temperatura especial? (Pág. 63)

- Eu tenho uma religião, a minha religião, e mesmo até mais do que todos eles, com as suas momices e charlatanices. Eu creio em Deus! Creio no Ente Supremo, num Criador, qualquer que seja, pouco importa, que nos pôs neste mundo para desempenharmos os nossos deveres de cidadão e de pais de família; mas do que não preciso é ir a uma igreja beijar salvas de prata, engordar com a minha algibeira uma súcia de farsantes que vivem muito melhor do que nós! (Pág. 80)

Realmente, não há melhor coisa do que passar a noite ao pé da lareira, com um livro, enquanto o vento bate nas vidraças e a luz brilha. [...] É que não se pensa em nada [...] e as horas passam. Sem se sair do lugar, passeia-se por países imaginários, e o pensamento, enlaçando-se com a ficção, demora-se em detalhes, segue o contorno das aventuras. A gente roça pelas personagens e até parece que se palpita sob os seus trajes. (Pág. 85)

[...] as obras que não nos abalam o coração afastam-se, segundo me parece, da verdadeira finalidade da arte. (Pág. 86)

Um homem, ao menos, é livre; pode percorrer as paixões e os países, saltar obstáculos e gozar dos prazeres mais raros. Uma mulher anda continuamente rodeada de empecilhos. Inerte e ao mesmo tempo flexível, tem contra si as fraquezas da carne e as dependências da lei. A sua vontade, como o véu de um chapéu preso pelo cordão, flutua a todos os ventos; e há sempre algum desejo que arrasta e alguma conveniência que detém. (Pág. 90)

Não teriam eles outra coisa a dizer? Os seus olhos, no entanto, transbordavam de palavras mais sérias; e, ao passo que se esforçavam por achar frases banais, sentiam-se ambos invadidos pelo mesmo encantamento; era como que um murmúrio da alma, profundo, contínuo, que dominava o das vozes. Surpreendidos e admirados por aquela nova suavidade, não pensavam em descrever a sensação ou descobrir-lhe a causa. As felicidades futuras, como as praias dos trópicos, projetam, na imensidade que as precede, as suas molezas nativas, brisas perfumadas; e nós nos entorpecemos na sua languidez, sem mesmo nos importarmos com o horizonte que não avistamos ainda. (Pág. 96)

O amor, no seu entender, devia surgir de repente, com ruídos e fulgurações, tempestades dos céus que cai sobre a vida e a revolve, arranca as vontades como folhas e arrebata para o abismo o coração inteiro. (Pág. 101)

A própria doçura do marido lhe causava revolta. A mediocridade doméstica arrojava-a a fantasias custosas, a ternura matrimonial a desejos adúlteros. Teria querido que Charles a espancasse para poder com mais justiça detestá-lo, vingar-se dele. Às vezes, espantava-se das conjeturas cruéis que lhe ocorriam; e era preciso continuar a sorrir, ouvir repetir que ela era feliz, simular que o era, deixá-lo crer! (Pág. 109)

A senhora não sabe então que há almas constantemente atormentadas? Precisam alternadamente de sonho e de ação, das paixões mais puras e dos gozos mais intensos, balançando-se assim a toda espécie de fantasias, de loucuras. (Pág. 139)

- Mas por acaso consegue a gente achar a felicidade? [...]
- Há lá um dia em que topamos com ela, [...] um dia, assim de repente, quando já desesperávamos de encontrá-la. Abrem-se então os horizontes, e é como se uma voz bradasse: "Ei-la!" Sente-se a necessidade de fazer-se a essa pessoa confidência da própria vida, de se lhe oferecer tudo, de tudo sacrificar por ela. Não a explicamos, adivinhamo-la. Entrevemo-la em nossos sonhos. [...] Enfim, aí está o tesouro que tanto procurávamos, aí, diante de nós, brilhando, resplendente. Mas duvidamos ainda, não nos atrevemos a acreditar, fazendo-nos ofuscados, como se viéssemos das trevas para a luz. (Pág. 139)

- Ora, lá vêm os deveres! - disse Rodolphe. - Estou farto dessa palavra! Um bando de velhos papalvos, de colete de flanela, e beatas de aquecedor nos pés e rosário nas mãos, cantando eternamente ao nosso ouvido: o dever! o dever! Ora! O dever é sentir o que é grande, querer o que é belo, e não aceitar todas as convenções da sociedade, com as ignomínias que ela nos impõe. (Pág. 140)

- Não! Por que bradar contra as paixões? Não são a única coisa bela que há sobre a terra, a origem do heroísmo, do entusiasmo, da poesia, da música, das artes, de tudo, enfim? (Pág. 140)

- [...] A senhora está na minha alma como uma madona sobre um pedestal: num lugar alto, sólido e imaculado. Mas eu preciso da senhora para viver; preciso dos seus olhos, de sua voz, de seu pensamento. Seja minha amiga, minha irmã, meu anjo! (Pág. 155)

Nunca a Sra. Bovary fora tão bela como então; tinha essa inexprimível beleza que resulta da alegria, do estusiasmo, do êxito, e que nada mais é que a harmonia do temperamento com as circunstâncias. (Pág. 185)

Também Emma quisera, fugindo à vida, voar num abraço. (Pág. 211)

Ah! Se ainda na frescura de sua beleza, antes das poluições do casamento e da desilusão do adultério, tivesse podido entregar sua vida a algum grande e sólido coração, num misto de virtude, ternura, voluptuosidade e dever, nunca teria chegado ao que chegara. Essa ventura, porém, era uma mentira, sem dúvida, imaginada para o desespero de todo desejo. Conhecia já a pequenez das paixões, exageradas pela arte. (Pág. 213)

O aprumo depende do meio em que estamos: não falamos na sobreloja da mesma forma que no quarto andar, e a mulher rica parece ter em torno dela, protegendo-lhe a virtude, todas as suas notas de banco, à maneira de couraça, no forro do espartilho. (Pág. 221)

Não nos devemos acostumar a prazeres impossíveis, tendo à nossa volta mil exigências... (Pág. 222)

- Haverá coisa mais lamentável que arrastar, como eu, uma existência inútil? Se nossas dores pudessem servir a alguém, consolar-nos-íamos com o pensamento do sacrifício! (Pág. 223)

Não era a primeira vez que viam árvores, céu azul e relva, que ouviam a água corrente e a brisa ramalhando a folhagem; mas nunca decerto tinham admirado tudo isso, como se anteriormente a natureza não existisse, ou como se não tivesse começado a ser bela senão depois de eles terem saciado os seus desejos. (Pág. 243)

- Não te mexas! Não fales! Olha para mim! Dos teus olhos sai alguma coisa de muito doce que me faz um bem imenso! (Pág. 252)

Mas o denegrirmos os que amamos sempre nos desliga deles um pouco. Não é bom tocar nos ídolos; o dourado pode sair nas nossas mãos. (Pág. 267)

Apesar disso, não era feliz, nunca o fora. De onde vinha, pois, aquela insuficiência da vida, aquele apodrecimento instantâneo das coisas em que se apoiava? ... Mas se existia, fosse onde fosse, um belo e forte, uma natureza valorosa, cheia ao mesmo tempo de exaltação e de requinte, um coração de poeta com forma de anjo, lira como cordas de bronze, desferindo para o céu epitalâmios elegíacos, por que acaso não o encontraria ela? Que impossibilidade! Nada, afinal, valia a pena procurar-se; tudo mentia! Cada sorriso ocultava um bocejo de enfado, cada alegria uma maldição, todo prazer o seu desgosto, e os melhores de todos os beijos não deixavam nos lábios senão uma irrealizável ânsia de voluptuosidades mais intensas. (Pág. 269)

Mas é que um infinito de paixões pode caber num minuto, como uma multidão num pequeno espaço. (Pág. 269)
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Michela Wakami 16/07/2021

Emma Bovary, dificilmente você irá amá-la.
Um livro bastante reflexivo, com uma personagem, muito egocêntrica.
Uma espécie de Dom quixote, que de tanto ler romances, passou a viver um mundo fantasioso, que apesar de ser um mundo que ela cobiçava, não a satisfazia.
Você provavelmente irá odiá-la.
Ponto negativo na leitura é o fato do escritor ser prolixo, fazendo a leitura ser arrastada e consequentemente cansativa.
Tangerina 16/07/2021minha estante
Hahahaha espero não me tornar um Madame Bovary um dia


Michela Wakami 16/07/2021minha estante
Kkkkkkkkk? medooooo.
O tanto que a gente lê, espero que não caiamos em tentação.???


Iwatanii 03/04/2024minha estante
Amei a resenha, amiga. Não gostei dela! Kkkkkkkk


Michela Wakami 04/04/2024minha estante
Obrigada, amiga! Ela é intragável! ????




Paula1735 19/07/2021

O romance dos romances
Um livro com muitas palavras difíceis e antiquadas, que acabou ocasionando lentidão na minha leitura. De qualquer forma, dá muita vontade de saber se a protagonista vai conseguir o que ela quer...
Romance trágico e realista, que deixa um gosto acre na boca.
bernardo_smm 19/07/2021minha estante
Tive uma aula de "literamor" onde o professor tratou dessa obra, me interessei bastante pelo enredo da mesma. Gostaria de saber se compensa a leitura.


Luana.Khetley 20/07/2021minha estante
minha conclusão final foi que a Madame Bovary passou pelo que passou, viveu o que viveu pq naquela época as mulheres não eram livres. Ela seria mais feliz nos dias atuais e as suas ações teriam sido diferentes.


Paula1735 20/07/2021minha estante
Bernardo, eu achei a leitura meio lenta, mas o final compensou muito! Não é nem um pouco esses romances clichês que estamos acostumados kkkk é um livro curto, acho que vale a pena vc conferir pra dar seu veredito.


Paula1735 20/07/2021minha estante
Luana, vc acha? Eu achei uma personagem muito complexa, dá pano pra manga analisar tudo o que se passou naquela cabeça! Não sei se vc conhece, mas cunharam um termo na psicologia baseado na Ema: o bovarismo. Se trata mais ou menos de uma idealização surreal de conceitos como amor e felicidade, e por conta disso, inalcançáveis para o sujeito em questão... Ao meu ver, a Ema se entediava com a realidade, sempre aquém do que ela achava que merecia viver. Por isso não sei se nos dias atuais ela viveria feliz ou arrumaria outra desculpa para sua insatisfação.


bernardo_smm 20/07/2021minha estante
Muito obrigado, vou adicioná-lo à minha lista de leitura.




Marcos.Paulo 31/05/2022

É bom, mas nem tanto
A trama é até legal, porém o grande excesso de descriçoes de lugares, objetos, entre outras coisas muitas vezes desnecessárias, nada acrescentam e acabaram por deixar monótona a minha experiência, porém, ainda assim é um bom clássico, com boas reflexões.
ana beatriz 31/05/2022minha estante
guerreiro dar 5 estrelas viu .... eu achei um porre


Tatá 04/07/2023minha estante
Exatamente... por pouco eu desisto. Fui até o fim por questão de honra hahahaha
Maçante! O começo faz a gente pensar que vai ser legal, mas do meio pro fim fica super enfadonha.




Victoria (Vic) 08/08/2020

Eu simplesmente adorei o livro. O começo foi um pouco chato, mas depois ficou muito envolvente e interessante. O final me surpreendeu muito!
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Luiz Souza 16/08/2023

Dividas e muitas mentiras
O livro que demorou cinco anos para ser escrito , Gustave Flaubert teve que ter muita inspiração pra terminar este livro.
Também foi considerado na época uma afronta ao moral e bons costumes visto que na ocasião não se retratava mulher indo atrás de homens como no caso de Emma pois elas eram submissas.

O livro vai contar a história de Emma uma jovem do campo que vivia lendo romances de revistas e jornais e parece que ela queria sentir todas as aventuras que as mocinhas tinham dos livros ela idealizava o amor romântico e colocava num patamar alto até porque é uma raridade achar casais tão perfeitos como nos livros nem se iluda nisso.

Charles era um agente de saúde e se casou com Emma.
Ele era um homem não muito atrativo aos olhos de Emma ela imaginava outra configuração vindo desse matrimônio já estava ficando entediada.

Aí chegou o grande dia do baile , fica muito feliz na festa depois conhece Leon ele some, depois de um tempo ela conhece Rodolphe ele vai embora também.

Emma não teve muita sorte com os amantes ainda além disso tudo soma se Lheureux um comerciante em que ela comprava de tudo ficou lhe ameaçando para pagar as dúvidas de tanta coisa que ela comprou.

O fim dela foi trágico como todos sabem.
A história critica a sociedade burguesa da época e também a idealização do amor.
Uma história bem escrita e bem densa.

Ótima leitura
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Thales 21/05/2021

É incrível como um livro pode ser tão bom e tão chato
Desculpa gente, mas "Madame Bovary" é um livro de white people problems. Flaubert era um burguês branco encostado escrevendo sobre os GRAVÍSSIMOS problemas de burgueses brancos encostados. O marido de Emma não era um herói de romance e por isso ela vive um pentágono amoroso. Avá, viu.

Eu tive zero conexão com a história. Na metade da parte três eu já tava desesperado pra ela acabar. E isso nada tem a ver com a escrita de Flaubert ou com o livro ser difícil, muito pelo contrário. O francês foi um dos romancistas mais perfeitos que a literatura já teve - não atoa demorou cinco aninhos revisando o livro - e a tradução é excelente, além das notas e tal. Eu consigo reconhecer a extrema relevância do autor e da obra e ao mesmo tempo admitir que minha experiência foi irregular - estudar o contexto em que "Madame Bovary" existiu e sua influência na literatura foi bem mais divertido que a leitura em si. Por isso não teve como dar cinco estrilas.

Tudo isso posto: né, Flaubert é um dos autores incontornáveis da literatura ocidental. Desde o processo de escrita do romance - longo, com muita revisão, experimentações - ao retrato fiel - e feio - que faz da sociedade da época, passando pela cirúrgica escolha de tema, ambientação e fio condutor; tudo isso representou um ponto de inflexão como poucos. "Madame Bovary" simplesmente colocou a intelectualidade da época de quatro.

Flaubert talvez tenha alcançado as duas maiores honras de um literato: setores influentes da sociedade urgiram pela censura de sua obra e um conceito foi criado a partir dela. Da mesma forma que podemos dizer que algo é "dantesco" ou "quixotesco" podemos chamar alguém de "bovarista" - é só tacar no google que vai tá lá a conceituação.
Duda 21/05/2021minha estante
Ainda n consegui terminar esse livro


Bia 04/07/2021minha estante
você tem essa edição antiga da l&pm? Queria saber de alguém que leu nessa edição como é, se há erros ou algo assim, não entendi direito o que aconteceu para que a editora trocasse a tradução, tinha visto algo sobre ser uma cópia adulterada


Thales 15/07/2021minha estante
Bia, só vi seu comentário hoje. Minha edição é da Penguin. Não conheço direito a edição da L&PM, mas sei que ela é de bolso, tem páginas brancas e não tem orelhas. Eu nunca peguei um errinho de revisão num livro deles; talvez tenha em Madame Bovary, mas acho difícil, e se tiver vai ser um errinho mínimo. Sobre cópia adulterada, muito difícil algo assim acontecer em uma dessa duas editoras. Talvez fosse assim com a edição da Martin Claret - essa sim parece ter erros de revisão.




pietrarebeca 05/09/2023

Achei extremamente entediante :(

O livro não me prendeu nem um segundo, parecia que estava em ressaca literária depois de ler poucos capítulos.
Freezerburn 05/09/2023minha estante
Vish, que pena




Joao.Alessandre 16/06/2023

?Emma Bovary c'est moi?
Madame de Bovary é um daqueles clássicos aclamados cuja leitura não decepciona. Flui fácil, rápido. Nos identificamos com vários personagens ou encontramos traços de similaridades destes em pessoas próximas. O dedicado Flaubert gestou essa obra prima em 5 anos onde claramente nota-se o cuidado no enfrentamento de questões basilares para a sociedade da época. Emma Bovary não é apenas a personagem central desse romance... é antes de tudo a representante primeira do descontentamento feminino. Sua iniciativa de romper com as convenções e entregar-se a seus sentimentos impactou definitivamente na lógica de um patriarcado que relegava a figura feminina a um apêndice dos mandos do XY dominador.
Emma sofreu e fez sofrer. Imperfeita, sonhadora e inconsequente em diversos momentos. Padecia certamente de um transtorno psiquiátrico não diagnosticado e não tratado que permeou toda a narrativa.
Leitura mobilizadora, viva, dilacerante que provoca e gruda nos pensamentos. Impossível sair o mesmo ao término - saímos melhores!
NothingIsHere 16/06/2023minha estante
Sua resenha me animou. Lerei essa obra esse ano com certeza!


Joao.Alessandre 16/06/2023minha estante
Legal Stelliane! Depois quero ver suas impressões.


aartemesalva-nat 17/06/2023minha estante
Parabéns pela resenha, João. Pela sua descrição, a personagem Emma, em parte, me lembrou a personagem Anna Kariênina (Tolstói). Inclusive, recomendo esse clássico russo, caso tu não tenhas lido. :)


Joao.Alessandre 17/06/2023minha estante
Obrigado Natália. Li Anna Kariênina numa tradução antiga há muito tempo. Gostaria de reler os russos na edições da coleção leste da 34 (inclusive Guerra e Paz que vc tá lendo agora)... tantos livros imprescindíveis?.




Sambook 12/04/2021

Uma ótima experiência!!
Demorei a ler e achei que o problema era o livro, mas não, era eu mesma que estava de ressaca haha
Um livro lindo, cheio de camadas a ser descoberto. Com certeza será uma amada releitura em um futuro próximo. Emma tinha um amor pela leitura, mas na minha opinião ela lia muito e acabou lendo errado. Queria colocar em prática o que lia, queria VIVER aqueles romances apaixonantes e acabou apenas se frustrando com amantes que não correspondiam suas expectativas. Enfim, Emma quem decidiu o seu próprio destino!
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Beatriz.Pivanti 10/05/2023

Eu amei esse livro! a forma como a emma sempre tenta buscar aquele amor e emoção que lia nos livros, e mesmo encontrando no começo das relações, a rotina vai destruindo essa euforia e automaticamente a paixão. as críticas à burguesia e igreja nem um pouco sutis rs. não esperava o final trágico (esperava um final trágico, mas não tanto), e amei. pobre berthe. 5/5
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Caroline Gurgel 08/04/2015

"Mas a ilusão, quando se desfaz, dói no coração de quem sonhou, sonhou demais..."
Sempre que vou ler um clássico, gosto de fazer uma rápida pesquisa sobre o contexto em que ele foi escrito, pois, na maioria das vezes, sua importância se deve à originalidade apresentada na época, seja em relação ao tema ou à escrita. Julgá-lo como se tivesse sido escrito nos dias de hoje é injusto e lê-lo fora de contexto faz com que não aproveitemos bem tudo o que ele tem a nos oferecer.

Ao iniciar a dita pesquisa, uma decepção: meu francês é perto de zero! Gustave Flaubert, almejando a perfeição, dedicou cinco anos de sua vida para escrever Madame Bovary. Escrevia e reescrevia as frases até que soassem como desejava, com uma excessiva preocupação com a forma e a cadência das palavras. Flaubert mudou a forma como se escrevia romances, com uma estrutura de texto mais concisa e objetiva, sendo considerado um dos precursores da narrativa moderna. O resultado disso é um livro apontado como um dos romances mais bem escritos que já se viu, mas, infelizmente, muito dessa perfeição se perde com a tradução, por melhor que ela seja.

Madame Bovary foi lançado em 1857 e chocou a sociedade da época, levando Flaubert, inclusive, a ser processado - e absolvido - por atentar contra a moral e os bons costumes ao trazer uma personagem adúltera e fortes críticas à burguesia e ao clero. Flaubert vai de encontro ao estilo literário da época, o romantismo, e no lugar de heróis e heroínas, traz uma visão realística, sem distorções, da sociedade e seus membros. Com uma prosa irretocável, uma ironia incrivelmente bem mensurada e um texto objetivo, Flaubert dá início ao Realismo.

Ele abre sua história mostrando um pouco da infância de Charles Bovary, como ele foi ridicularizado na escola e como, posteriormente, se formou - a duras penas - em medicina. Quando vai à casa do Sr. Rouault para tratá-lo de uma enfermidade, Charles conhece e se interessa por Emma, sua filha, a quem pede em casamento ao ficar viúvo.

Emma fora criada em um convento, recebera uma boa educação e era tão sonhadora quanto as mocinhas dos livros que lia. Era ambiciosa, queria ter o glamour parisiense, sonhava em viver um amor como dos romances e ser feliz. Ela viu no casamento com Charles essa oportunidade. No entanto, vivendo em uma pequena cidade francesa, ela, agora madame Bovary, se vê entediada com um Charles sem ambição alguma. Após um grande baile no qual foi convidada, Emma entra em uma crise existencial, achando que não pode ser feliz naquela pacata cidade. Charles resolve, então, se mudar.

Os novos ares a iludem por pouco tempo, e logo ela se entedia de novo. Até que se encanta por um homem dessa nova cidade e passa a ver nele sua possível felicidade. É sempre assim, se apaixona perdidamente por um, se decepciona, entra em depressão, se apaixona por outro, se decepciona, entra em depressão… A felicidade nunca está nela, nunca pode ser encontrada na vida em que vive, sempre está em algo que ela projeta e deseja.

Paro por aqui para não dar spoilers do que acontece na história, mas é sabido que Emma teve amantes com quem trocou inúmeras cartas apaixonadas. Sem eles, ela não via a possibilidade de ser feliz.

"Ela repetia-se: - 'Eu tenho um amante! Um amante!' -, deleitando-se com esta ideia como se uma nova puberdade lhe tivesse retornado."

A felicidade é um dos temas tratados no livro. O que faz alguém feliz? Por que, até hoje, muitas pessoas vêem sua felicidade em algo que elas não tem ou não conseguem? Emma Bovary passa a achar que sua felicidade depende daquele amante, que tudo o que ela tem é medíocre, que as pessoas a seu redor são inferiores, que ela foi feita para ser mais do que aquilo. Passa a gastar fortunas e se endividar só para ter o que quer e presentear o amante. Eis onde entra a crítica de Flaubert ao consumismo - e sua errônea conexão com a felicidade - e à futilidade da burguesia, ainda tão atuais, mesmo mais de um século e meio depois.

Aliás, guardadas as devidas diferenças de épocas, tudo é muito atemporal nesse romance. Ao analisarmos os personagens principais, vemos que ainda temos deles aos montes. Um Charles que tenta agradar a esposa, mas não vê que não a faz feliz - e é o último a saber disso. Uma Emma dissimulada, infeliz, ambiciosa, consumista, mas linda, bem vestida e refinada. Uma mulher que teme trair, mas que quando o faz termina se acostumando às suas mentiras.

"Tudo mentia! Cada sorriso escondia um bocejo de tédio, cada alegria uma maldição, todo prazer seu desgosto, e os melhores beijos só deixavam no lábio um desejo irrealizável de um prazer maior."

Flaubert nos mostra que, com o hábito, Emma se tornava insaciável, havia sempre a necessidade de mais, e com isso, alfineta o romantismo e todo seu idealismo. Demonstra que não existem heroínas tais quais nos livros e que os homens nem sempre estão dispostos a toda aquela paixão inebriante.

Emma é tão complexa e bem construída que podemos passar horas pensando em suas atitudes, em seus porquês, em sua personalidade. Isso me fez querer aumentar minha nota para o livro, pois só um gênio para criar uma personagem tão viva e tão real, tão cheia de faces, fingida, cínica, mas sem ser óbvia ou caricaturada. O mais interessante é que o autor consegue nos deixar livres para odiá-la ou não, ele consegue não emitir sua opinião. Ela é o que é, nada mais.

Quando li que o livro era o marco inicial do Realismo, me perguntei porque não o era A Mulher de Trinta Anos, de Balzac, já que fora escrito antes. Os dois livros criticam a sociedade burguesa e trazem personagens infelizes, que traem seus maridos. Dizem, inclusive, que Flaubert se inspirou no livro de Balzac, então por que Madame Bovary é tratado como início do movimento? Tendo lido os dois, só posso opinar que a diferença esteja, sim, na escrita e na narrativa. Enquanto Balzac ainda parece mais classicista, a leitura de Madame Bovary é incrivelmente fácil, o autor nos conta sua história sem que sintamos o passar das páginas, é tudo muito fluido. Não há tédio, não há excessos, não há detalhes desnecessários, mesmo sendo cheio de descrições. O livro conquista o leitor do começo ao fim, sem altos e baixos. (Gosto muito dos dois romances, mas a personagem Julia, de Balzac, é digna de compaixão, enquanto Emma é mais irritante - talvez isso seja mais um traço do realismo flaubertiano)

Quanto as notas de rodapé, tenho uma ressalva: algumas delas são bem toscas! Eu, acredito que como todo leitor, adoro notas de rodapé, mas é um pouco estranho quando a maioria das notas que você lê traz referências a livros posteriores ao que você está lendo, como, por exemplo, "essa passagem pode lembrar-nos Hemingway". hum?! Bem, até entendo a intenção de criar um panorama de autores influenciados por Flaubert, mas isso tira um pouco do nexo das notas, não? Senti muita falta de notas que mostrassem mais as escolhas do tradutor em relação às palavras e seus porquês.

Comecei a resenha pretendendo pontuar o livro com 4 estrelas, mas termino classificando-o como um 5 estrelas, uma vez que o enredo não me sai da cabeça e seus personagens tem ainda tanto para serem debatidos e mastigados. Poderia ainda escrever parágrafos e mais parágrafos analisando o comportamento de Emma, personagem intrigante que vale a pena ser conhecida. Uma leitura para quem gosta de literatura e seus movimentos, ou para quem deseja aprender mais um pouco sobre eles e sobre a sociedade burguesa da França do século XIX.

Recomendadíssimo - mas, apenas lembrando, deve ser lido muito bem contextualizado.

❤ ❤ ❤ ♡ ♡
★ ★ ★ ★ ★


site: www.historiasdepapel.com.br
Tatinha 08/04/2015minha estante
Oi Caroline, adorei sua resenha! Muito bem escrita e incrivelmente pertinente!


Cândida 08/04/2015minha estante
Que resenha incrível! Me deu vontade de reler a obra :)


raissa.pinto.9 08/04/2015minha estante
Adorei a resenha!


Caroline Gurgel 08/04/2015minha estante
Obrigada, meninas! :)))


Marcia.Emmerick 16/10/2015minha estante
Uma resenha maravilhosa, bem esclarecedora! Estou lendo o livro para fazer uma prova e confesso que o estava achando um pouco enfadonho mas após ler essa resenha fiquei mais motivada. Obrigada e Parabéns!


Laninha 30/10/2015minha estante
Amei a sua resenha bem detalhada e contextualizada; Parabéns!!!




Júlia 03/10/2010

Paciência para chegar até o fim
Chatíssimo. Poder ser um marco, mas é chato pra caramba. Emma é insuportável. O pior é que ela estará em todoas as páginas.
Iananda Barone 25/01/2011minha estante
Concordo!
Custou chegar até o fim da leitura!
Emma é, de fato, insuportável.


Paam 27/12/2012minha estante
Estou lendo e sinceramente está me custando muito, cansativo demais, a história não prendeu minha atenção ainda.


Dija Darkdija 13/11/2013minha estante
Pela primeira vez, abandonei um livro. Concordo contigo, e o Charles é ainda pior, por que ele é todo... mediano. Ele não tem nada de especial. Nem um pingo de coisa que o destaque e te faça dizer "ah, ele é legal por isso". A gente fica entediado eternamente junto com a Ema, que não é lá essa coisa toda que pintam como "figura da mulher que está procurando liberdade e por isso trai o marido". Ela é uma mulher que sonhou demais e quebrou a cara, e não se decide se se emancipa ou se toma conta da casa como as mulheres da sua época. É quase uma bipolaridade. O livro pode ser um marco histórico e ter importância por isso, mas é muito massante. Li aos retalhos pra apresentar um seminário, mas quero distância.


Mariane 03/12/2013minha estante
Realmente, enfadonho! Terminei de ler por mera obrigação, não gosto de deixar a leitura de lado. Apesar de clássico, o livro é muito chato.


@apilhadathay 27/03/2014minha estante
Também achei >.<
O livro não caminha. Fica estagnado.


Paula 06/05/2016minha estante
demorei três anos pra conseguir ler ... foi o livro que mais demorei pra ler em toda minha vida


Jossi 19/09/2017minha estante
É um livro deprimente, também. Emma Bovary é uma das piores personagens de toda a minha "lida" literária. Puxa, tá certo que Flaubert é da escola realista, mas até as realidades mais duras podem ser menos entediantes que essa história.




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