nato 27/06/2012minha estante**********POSSUI SPOILER**************
Acho que sua resenha foi até otimista. ''O conto do amor'' de Contardo Calligaris caiu em minhas mãos e, como já havia lido algumas de suas crônicas, achei interessante ler o romance, que efetivamente é bem curto, com uma linguagem rápida e fluída.
Entretanto, não se trata de um bom romance. Como Aguinaldo bem disse: ''Falta a agressividade visceral que os grandes romancistas sabem incluir em qualquer texto que escrevem''. Falta não só a agressividade, mas sobretudo falta verdade em ''O conto do amor''. Verdade não no sentido simplista de busca pelo realismo, mas pela linguagem que não é bem trabalhada, não provoca nenhum tipo de reflexão, é basicamente puro entretenimento com roupagem cult, embalada com elementos clichês (em certo momento, o personagem tem acesso a uma série de cartas que revelam a verdade). Calligaris deve ser um homem respeitável, com uma bagagem cultural incrível e talvez esse seja o ponto positivo do livro: as passagens em que ele consegue relacionar a história da arte, a arquitetura dos locais, a beleza das cidades com as emoções vividas pelos personagens são relevantes e empolgam até certo ponto. Mas como pôde criar um livro tão vazio de sentido? Como a sua própria profissão não soube dar tons, nuances, para sua estreia como romancista?
É curioso também que o narrador seja crítico do ''estilo romântico'' das cartas de seu pai, mas é justamente o que falta na narrativa: uma linguagem mais elaborada. Não que as cartas de seu pai fossem exemplo a ser seguido, longe disso. Era a intenção do autor evitar esses detalhes do texto e deixá-lo simples? Acredito que sim. Mas quando ele tenta superar essa mesma imposição, cria frases que soam ridículas, como:
"Voltei, mas, sem você, estou fora de casa" (pág. 58)
''Você leu algum romance da série Harry Potter?''
''Vários, e com prazer'', respondi.
''Talvez os afrescos de Sodoma sejam como os quadros nos livros de Harry Potter: as personagens são vivas, animadas, e circulam de um afresco para outro. Vai ver que a moça de azul estava aborrecida de ficar sempre naquele afresco com os monges e resolveu flertar com o camponês no afresco dele, e alguém por acaso fez uma cópia bem naquele momento''. (pag 80/81)
De qualquer forma, quem se interessar pelo livro deve lê-lo sim e tirar suas próprias conclusões, mas deve evitar qualquer expectativa, ela não será correspondida. Mesmo no sentido "thriller" a que se propõe, a trama não convence em momento algum. A curiosidade para se saber o que acontecerá é simplesmente uma curiosidade natural de leitor, mas nunca de um leitor que se sente instigado a descobrir o que acontecerá, juntando conflitos que caminham para uma resolução interessante. Aqui "tudo pode acontecer" e com uma facilidade irreal: um telefonema e o narrador avança um passo na sua empreitada rasa e assumidamente desnecessária, como ele próprio declara em diversas passagens, com relação ao enigma proposto pelo pai, que é o cerne do romance:
''Faria diferença para você?''
Levei a pergunta a sério e pensei bem: ''Sinceramente, nenhuma. Continuaria amando o meu pai da mesma forma; amando minha lembrança dele, quero dizer". (pág.37)
A auto-ironia faz bem, mas nunca quando ela substitui totalmente a pretensão de escrever e saber escrever. O autor soube criar um fio condutor pela narrativa, bem aos moldes tradicionais, o que é ponto positivo em termos de literatura atual, quando todos optam pela narrativa fragmentada. Todavia, de qualquer forma, num próximo livro deve reavaliar o sentido da linguagem, o sentido dos próprios personagens, o sentido de como o texto sabe instigar e suscitar questionamentos, caso pretenda ir além.