Juh Lira 26/09/2020Villette tenta, mas não me convenceLivro que não gostei tanto da Charlotte Bronte, gostei menos ainda do que O Professor. Hoje acho O Professor um livro bem melhor em ritmo narrativo e verossimilhança (Villette é uma releitura). Ele é redondo enquanto Villette tenta se sustentar por coincidências e destino o que não me convenceu. Além disso, achei a leitura arrastada e protagonista insuportável. Lucy Snowe é invejosa e vitimista, não dá para sentir nenhuma simpatia por ela.
Em resumo: história da orfão Lucy Snowe que depois de uma tragédia (que sabemos pouco a respeito) deixa a Inglaterra e vai viver na cidade fictícia de Villette, que é uma cópia de Bruxelas onde Charlotte estudou e trabalhou. Lá é vigiada pela diretora Madame Beck em meio as angustias pessoais de Lucy. Se eu disser mais do que isso, vou dar spoilers.
Por que eu não gostei desse livro:
1. Lucy: protagonista e narradora, somos obrigados a ver tudo do ponto de vista dela, e boa parte do meu desgosto com esse livro é culpa de Lucy. No entanto, a personagem é muito desagradável, ciumenta e invejosa principalmente da beleza de outras mulheres. Ela tem algum complexo de inferioridade e muito vitimismo para o meu gosto, ainda mais para um livro de 400 páginas (!). Obviamente eu já enxergava a personagem como uma espécie de alter ego de Charlotte e o total oposto da Jane Eyre, mas não imaginava que eu iria detestá-la tanto durante o livro. Ela julga as pessoas sem misericórdia e espera ser julgada sem a mesma régua e COM misericórdia. Não vou nem comentar os longos parágrafos dela batendo na Igreja Católica, apesar de ser algo comum na época que o livro foi escrito, mas não deixa de ser irritante e cansativo. Não gosto também da forma como ela trata a Polly e Graham nos últimos capítulos pois achei um ingratidão da parte da Lucy para aqueles que sempre foram bons com elas. Aliás ela não sabe ser grata.
2. Os outros personagens: eles ficam boa parte esquecidos na terceira parte do livro. Suas storyline são finalizadas às pressas pela narradora, sem dar tempo de nos mostrar como se deu o relacionamento do Graham e Polly e da Ginevra com o seu namorado. A própria Madame Beck fica esquecida até servir ao propósito de ser vilã em um melodrama romântico que acontece no final, o que eu achei um desserviço para com uma personagem tão promissora, tão bem descrita no começo do livro. Alguns personagens retomam nos últimos capítulos, mas são muito superficiais e servem apenas para dar mais gasolina às reclamações de Lucy, e num truque baixo, mostrar o quanto a protagonista era "superior" à mesquinharia deles. Isso em Os Mistérios de Udolpho de Ann Radcliffe é convincente, em Villette é ridículo. Sem contar alguns diálogos que só por Deus...
3. A estrutura narrativa: explico porque eu acho agora O Professor, romance com um enredo parecido escrito anteriormente, superior a Villette, e a razão é dele ter uma estrutura redonda sem se apoiar em coincidências do destino (o que tem demais em Villette) e por ser mais curto e objetivo. Villette tem o dobro de páginas de O Professor mas que se pensarmos friamente muita coisa poderia ser podada e não faria tanta diferença para a narrativa, principalmente para o final (corrido devo dizer). O enrendo parece ficar à deriva por muitos capítulos "tapa-buraco" apenas vendo Lucy divagar e reclamar, o que parecia que a história não ia para lugar nenhum. De repente Lucy tem um novo interesse que surge sabe Deus da onde e assim a história termina no melodrama que comentei. O último capítulo é bonito, bem escrito como qualquer coisa de Charlotte, mas nesse livro sinto que ela meteu os pés pelas mãos.
Escrita bonita não é o suficiente para sustentar uma história. Gosto de personagens, personagens bem construídos em um enredo bem construído. Villette peca naquilo que não deveria pecar.