Julia G 11/07/2012Contos de Meigan - Roberta Spindler e Oriana ComesanhaResenha postada originalmente no blog http://conjuntodaobra.blogspot.com
“- Certo, esqueça as piadas. Vamos ao conselho. Não deixe seus medos dominarem seu espírito. Seja forte.
Maya sorriu de maneira melancólica. Keyth se aproximou e pôs a mão em seu ombro.
- Tenha mais confiança em si mesma – ele sorriu e voltou para sua cama.
Maya deitou, mas permaneceu de olhos abertos. Keith observou seu semblante abatido por alguns instantes. Queria fazer com que ela se alegrasse, sorrisse.
- Maya, você tem certeza de que não quer ouvir minha piada?” (pág. 148)
“Meigan é um mundo diferente do nosso, morada de seres especiais e poderosos que se denominam magis. Na aparência são exatamente como nós, mas as diferenças não podem ser ignoradas por muito tempo. Os magis têm uma relação especial com a natureza e seus elementos, moldando-os a sua vontade e apoderando-se de sua força. Esses elementos, chamados mantares, não se limitam apenas aos conhecidos fogo, terra, ar e água. Existem muitos outros, como as sombras, o tempo e até mesmo o controle sobre o próprio corpo.”
Não vi maneira melhor para começar a falar da história do que copiar uma parte da sinopse original do livro. Meigan é um outro mundo, com outros seres, onde as regras e a própria natureza diferem bastante de tudo aquilo que conhecemos. E sua essência vai tão além disso, tem tantos outros detalhes, que é impossível não perdê-los ao fazer uma sinopse minha. É um mundo onde a mágica faz parte da vida de cada um, que, na maioria dos casos, concentra em si poderes de dominar vários mantares. Maya, filha da Shyrat (como se denomina uma espécie de rainha do lugar), fugiu desse mundo para viver na Terra, tentando deixar para trás seus problemas, permanecendo lá por três anos. Mas os sonhos a estavam atormentando novamente, e ela precisava descobrir o porquê.
Só que voltar para casa pode não ter sido a melhor decisão que tomou, já que se depara, antes mesmo de atravessar o Solo Sagrado e os sete portões, com uma guerra que se trava entre os guardiões, auxiliados pelo exército, contra os cártagos - magis banidos de seu mundo. O fato de terem entrado no Solo Sagrado é, à princípio, incompreensível, mas Keyth, o sábio, logo percebe a verdade: isso só pode ter acontecido com ajuda de algum magi, e isso implica em algo ainda mais grave: alguém entre eles é um traidor.
Agora, sem sua mãe, Maya deveria se encarregar de governar o seu mundo, assumindo a posição de Shyrat, mas há muito mais em jogo. É quase como uma luta silenciosa pelo poder, e Maya sabe que pode contar apenas com alguns poucos. Junto a Keyth e ao guardião Seth, ela procura por vingança, mas percebe que essa busca deveria ser por respostas, e essa viagem a leva a um lugar singular: ao conhecimento de si própria e a uma nova visão de seu mundo, Meigan.
Não, Contos de Meigan, de Roberta Spindler e Oriana Comesanha, não é um livro de contos, como muitos devem acreditar ser. A palavra foi usada mais no sentido "histórias de Meigan", ou algo nesse sentido. E a maneira mais transparente que há para tentar traduzir o que essa história representa é que ela é verdadeiramente ousada, ainda mais se considerar que, até onde sei, é o primeiro livro das autoras.
Meigan é um lugar incrível e apaixonante. O trabalho das autoras, na criação de um mundo novo e com seres totalmente desconhecidos para nós, foi extremamente detalhado, sem deixar espaço para furos ou dúvidas de que aquilo poderia ser "real". Ainda se fazem desconhecidos os limites de tudo o que pode acontecer nesse lugar, até porque há muita novidade acontecendo para os próprios personagens.
No início, a entrega lenta das informações e acontecimentos da história faz com que nos perguntemos o tempo todo se aqueles detalhes seriam mesmo necessários. E eu ainda não me decidi sobre isso, mas depois que se acostuma com o ritmo da leitura, a entrega é total, e cada detalhe ou informação velada é essencial e imprescindível para os acontecimentos da narrativa.
A narrativa, por sinal, é feita em terceira pessoa, o que permite conhecer mais profundamente cada personagem, no limite estabelecido pelas autoras daquilo que se pode saber em um determinado momento. Isso porque, para aqueles que têm coração forte, os mistérios permeiam todo o livro. Quando algumas poucas respostas nos são dadas, três vezes mais dúvidas aparecem; e quando eu disse que há mistérios em todo o livro, eu não menti: ficamos com o coração na mão até o epílogo, que só nos diz que teremos as respostas que queremos no próximo livro. Fiquei um pouco triste pelo livro terminar assim, já que não vi nada do que eu queria acontecer, mas ao menos sei ainda há muito por vir.
Outro aspecto que também me agradou na escrita das autoras foi a construção dos personagens. Eu os via fisicamente, bem como entendia seu jeito e aspectos psicológicos. Cada um tinha características próprias, sentimentos conflitantes e dúvidas, como qualquer pessoa. Mesmo os guardiões, que eram intocáveis e tidos quase como objetos, possuiam suas dúvidas e anseios, muito bem transmitidos pelas autoras.
Não gostei muito de Maya no início, e também não sei se gosto agora; ela tentou parecer determinada, mas a impressão que tive é que ela apenas não gostava de ser contrariada, e que tudo o que ela não podia parecia um desafio para ela. Tanto assim que desrespeitou todas as regras que protegiam Seth. Seth, por sua vez, tornou-se meu personagem favorito; primeiro, por causa das poucas palavras que usou por todo o livro, mesmo que conseguisse dizer exatamente aquilo que queria sem usá-las; depois, por causa de sua força, ao mesmo tempo em que parecia tão vulnerável. Keyth era Keyth: excêntrico, mas talvez o mais lúcido. Sebastian, Anya, Ayka, Artur, e todos os outros também conquistaram seu espaço, mas desses eu ainda preciso esperar o que virá.
O romance, definitivamente não é o foco da obra; a aventura e a ação é que são. É um épico, com cores quase visíveis, bem como as sensações de frio e calor, ou qualquer outra, advindas do uso de mantares. Só fico apreensiva por tantos personagens e mistérios, já que, quando é assim, fica fácil perder a linha em uma continuação. E eu preciso compreender tantas coisas ainda, e sei também que muitas outras virão.
Peço desculpas pelo tamanho da resenha, mas são mais de 600 páginas com muita história para contar e escritas com a perícia de escritores profissionais. É um obra que com certeza vale a pena ler, e que me deixou totalmente ansiosa para conhecer a continuação. Para os que quiserem conhecer um pouco mais, Roberta Spindler disponibiliza outras informações e imagens em seu Tumblr.