Grande Sertão: Veredas

Grande Sertão: Veredas João Guimarães Rosa
Eloar Guazzelli




Resenhas - Grande Sertão: Veredas


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Lucas 03/05/2020

De "nonada" à "travessia": Uma viagem rica, árida e inesquecível através do Sertão
"-Nonada". É desde a primeira palavra que Grande Sertão: Veredas constrói seu lugar na literatura brasileira. De cara, é um convite que se torna recorrente ao leitor que se aventura pelas suas linhas: utilizar-se do dicionário para entender o significado de vários termos e gírias. Isso se torna tão corriqueiro que logo o leitor desistirá dessa prática, tamanha a riqueza e variabilidade dos verbetes. Se um escritor "comum" tivesse provocado isso num livro, traria ao leitor repulsa, mas não é o que ocorre aqui.

Não é o que ocorre aqui justamente porque não estamos falando de um escritor comum, mas sim de um símbolo, um diplomata, uma mente assustadoramente criativa: é fácil que se esgotem todos os adjetivos conhecidos da rica língua portuguesa que ele tão bem dominava para que se defina o mineiro João Guimarães Rosa (1908-1967).

Por mais que haja outras obras sensacionais, mas de menor vulto em sua carreira literária (como Sagarana, de 1946), é Grande Sertão: Veredas, de 1956, a sua obra-prima. Sua grandeza reside numa série de características próprias cujos elementos jamais serão plenamente estudados (isso porque é imensa a quantidade de estudos acadêmicos que tratam da obra, que podem ser encontrados nos repositórios e revistas científicas eletrônicas da área de Letras).

Numa sempre falha tentativa de sintetizar o contexto da obra, pode-se assumir que Grande Sertão: Veredas é um livro construído a partir do relato do ex-jagunço Riobaldo a uma pessoa de fora do seu círculo social, um "citadino", que está de passagem pela casa do narrador. Este interlocutor, que não participa ativamente da narrativa, mas que tem, genialmente, sua presença percebida nas entrelinhas, é um ouvinte que funciona como repositório das aventuras de Riobaldo ao longo dos sertões do cerrado do norte de Minas Gerais, oeste da Bahia e norte de Goiás (sempre lembrando que até 1988 o estado de Goiás englobava todo o atual Tocantins) no período em que o protagonista estava num bando de jagunço.

O movimento jagunço, apesar da sua importância histórica na região, não chega a ter uma decisiva relevância para o entendimento da obra. Trocando em miúdos, o movimento, surgido a partir da segunda metade do século XIX, era uma espécie de "força paramilitar" composta por vários bandos que vagavam pelo sertão, sem um objetivo definido, mas praticando atos de justiça como também massacres, roubos e muitos outros crimes. É nesta concepção que a narrativa de Riobaldo se desenrola, não julgando o caráter dos jagunços em suas práticas. Apesar de haver no início da história um dualismo entre forças do governo e o jagunço como elemento subversivo a ser dramaticamente combatido, ele se perde em milhões de outros "causos" paralelos e pequenas reviravoltas, que, juntas, conduzem o simpático Riobaldo e suas sensações ao longo da aridez e até então abandono do sertão (não há menção alguma a datas, mas presume-se por meio de certos eventos que a narrativa se passe durante os primeiros anos do século XX).

Estas sensações de Riobaldo são, em sua maioria, causadas pelo impacto narrativo que certo "par de olhos verdes" causa-lhe: trata-se de Diadorim, o coadjuvante que está à altura da obra. É ele quem, como o leitor perceberá, guia Riobaldo ao longo do sertão, em uma viagem aparentemente aleatória, mas que vai adquirindo contornos tangíveis com o passar das páginas. Diadorim é a bússola, o fio condutor de todas as ações e omissões de Riobaldo durante sua vida de jagunço. É também, de longe, o personagem que mais bem dialoga, tanto com o próprio Riobaldo em seu narrar, como também com o interlocutor e o leitor.

A relação amorosa e devocional que Riobaldo nutre por Diadorim corresponde ao mais nítido dos vários paradoxos trazidos pelo livro. É um amor puro, verdadeiro, que se distancia de qualquer rótulo fútil, atual ou da época, mas que não encontra, por motivos óbvios, contexto para consumação nem mesmo possibilidade de ser compartilhado. Diadorim é um personagem amplamente complexo cujo passado é o que conduz Riobaldo a este mundo da "jagunçagem" (mundo este que não estava destinado ao protagonista).

Para mencionar os outros paradoxos de Grande Sertão: Veredas, é preciso um olhar mais treinado academicamente e este é trazido de forma pluralizada pela espetacular edição de 2019 da Companhia das Letras, que traduz em termos estéticos toda a grandeza da obra. Não somente em termos visuais, mas também conceituais: cinco textos de apoio são trazidos após o fim da narrativa e lançam vários escopos reveladores sobre o que a epopeia de Riobaldo traz em seus significados ocultos. Todos estes textos, contudo, são mais impactantes ao estudante de Letras, o que não impede que o leitor ambientado dentro das ciências exatas não capte a essência do que se relata.

Um destes paradoxos é trazido pelo texto da crítica literária Walnice Nogueira Galvão, Segundo ela, Grande Sertão: Veredas se resume a "pequenas coisas que estão dentro de outras coisas". Sem pormenorizar o ótimo texto da autora, percebe-se que esta é uma análise muito feliz porque traduz de uma forma erudita os mistérios, grandes e pequenos, breves ou que duram toda a história, que são um artifício forte para prender o leitor. Uma grande vereda, um pássaro da região, um animal, um causo, um personagem importante, enfim, quase a universalidade do que está sendo narrado possui um lado oculto, misterioso, um lado que não se vê num primeiro momento. E muitas destas "coisas" (que não são apenas coisas propriamente ditas) nem trazem à luz esta outra face; mas outras o fazem com tamanha violência que impactam a leitura de uma forma assustadora e/ou positiva.

Outro aspecto paradoxal é o da mistura, comentado pelo texto do crítico Davi Arrigucci Júnior. Nele, há uma longa descrição de elementos simbólicos capazes de confundir quem queira definir Grande Sertão: Veredas sob um único estilo: há vieses de um romance de formação, histórico, mítico, pactário (o pacto com o Diabo ou pacto faústico, conhecida lenda alemã de recorrentes presenças na literatura universal), de cavalaria, de redenção, de vingança, entre outros estilos. Nenhum deles casa totalmente com o que se percebe nas linhas da obra, mas todos eles ilustram o caráter multifacetado que corresponde a uma das principais características da obra-prima de Guimarães Rosa.

Mas um elemento que todos estes textos de apoio da referida edição trazem, e que são a marca mais palpável do livro, é a linguagem que Guimarães Rosa empregou para construí-lo. Obviamente que ela é uma consequência do plano narrativo que é desenvolvido, que trata de um cidadão do interior dos "Gerais" contando a história de sua vida a um ouvinte atento, que toma notas do que está ouvindo. Mas é vasta a expansão filológica que o autor utilizou na narrativa, empregando muitos termos que ainda existem no vocabulário "oficial" e evidenciando uma miscelânea de outras palavras, gírias e neologismos. Assim, Grande Sertão: Veredas se abriga num púlpito que é só seu dentro da literatura brasileira, mas atua com igual esplendor em outra frente: o idioma "português brasileiro", herdado de Portugal e adaptado à realidade e ao povo daqui.

Não pode ser ignorado também o tratamento dispensado por Guimarães Rosa aos "personagens" do título: o "grande" do "sertão" e suas "veredas" correspondem juntos a uma caracterização riquíssima, incomparável em nenhuma outra obra já lançada em terras brasileiras. E isto pode ser traduzido em números relatados numa série de reportagens lançadas pelo Jornal O Estado de São Paulo, em 2017: estima-se que o livro foi ambientado numa área de quase 260 mil quilômetros quadrados (área maior que a do Reino Unido e Irlanda do Norte somadas). A obra cita 424 localidades reais e 66 cursos d'água, entre rios, riachos e ribeirões. Mesmo assim, estes não são dados capazes de ilustrar dignamente a habilidade do autor em montar a narrativa. Quando jovem, Guimarães Rosa era fascinado por geografia e isso certamente muito contribuiu para que ele trouxesse no texto várias descrições precisas de vegetações, árvores, pássaros e muitos répteis.

A linguagem e a abrangência geográfica e biológica que o relato de Riobaldo emprega são, conjuntamente, pilares daquilo que Grande Sertão: Veredas é para a literatura nacional: um monumento, patrimônio literário e literal do Brasil. Com um estilo totalmente único que combina uma aridez narrativa (o livro não possui divisões ou capítulos, são mais de 400 páginas de relato intermitente) muito presente especialmente nas primeiras 60 páginas (que, como difundido, são bem complexas de serem lidas, pois narram historietas aleatórias. Por volta da página 75, Riobaldo começa a contar o seu passado até chegar na atualidade que ele vinha narrando inicialmente), fica clara no leitor a certeza de que a literatura brasileira, rica e variada, não seria a mesma sem Grande Sertão: Veredas.

Tamanha riqueza contextual acaba por afastar a resenha dos outros personagens. Mas não há o que ser dito sobre Medeiro Vaz, Joca Ramiro e Zé Bebelo, fascinantes líderes que lutavam por ideais distintos... Ou por Hermógenes e Ricardão, os algozes e grandes vilões da história. Falar sobre eles seria desnudar com deselegância a ficção narrativa do livro, que precisa de uma dose de obscuridade e ineditismo para provocar no futuro leitor o encanto que a obra, em todas as suas misturas, causa.

"Travessia". A última palavra de Grande Sertão: Veredas, assim como a primeira, tem um significado especial, que sela o monumento que a obra se torna. As travessias de Riobaldo, Diadorim e seus amigos jagunços ao longo do sertão, desolado naquela época e cada vez mais explorado pelo latifúndio e pelas grandes corporações de atualmente, sugere que nada igual foi ou será visto na literatura brasileira: a obra-prima de Guimarães Rosa se eterniza e se entroniza como um símbolo do povo e ecossistema sertanejo, cuja preservação é fundamental para o entendimento do Brasil em seu vasto interior.
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Nádia C. 03/05/2020

O sertão é paciência
3 meses lendo esse livro, passei por sentimentos diversos: encantamento, paixão, raiva, desassossego, desistência, impaciência, devoção, e por fim o amor... grande sertão: veredas é experiência. Falar da narrativa em si, o que é que acontece, quem são os personagens, até ajuda para entender os caminhos que as vezes são muito confusos, mas não é sobre isso. Falar dessa leitura só tem sentido em falar de uma experiência pessoal, esse é realmente um livro que se transforma para cada um que tira um tempo da vida para lê-lo e que nos transforma inevitavelmente.
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Paulinha 25/05/2020

?O diabo na rua, no meio do redemoinho?
Depois que vc lê Grande sertão: Veredas, quer lê-lo pra sempre! Depois de ler o romance fui conhecer a Graphic Novel, que livro, que adaptação!!! Sugiro que leiam o romance primeiro, é uma experiência única, a HQ tb é uma experiência surreal, mt bem produzida, pois através dela conseguimos materializar todo o sertão das Gerais e seus icônicos personagens - mas nada substitui a riqueza da obra original.
Recomendo mt, a hq é uma obra-prima que complementa magistralmente o romance.
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30/05/2020

Monumental
Guimarães Rosa criou uma linguagem literária nova e única para falar de um lugar tão ímpar quanto o sertão.
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BetoOliveira_autor 08/06/2020

Como assim? Sabe da Terra Média, não o Liso do Sussuarão?
Como assim? Você sabe da Terra Média e ignora o LISO DO SUSSUARÃO?

Meu senhor, minha senhora, não se vexem de tal lapso. Carece não. Vem. Mire e veja:

?

Estou relendo o romance Grande Sertão: Veredas. A primeira vez que o li foi há vinte anos, e me lembro de como fiquei fascinado pelo mundo rosiano, da jagunçada, do sertão mineiro, do cerrado, dos rios, das veredas, dos buritizais, dos passarinhos, e até das pedras.

Geografia ali é de sobejo, mas com bons olhos o que se vê é para além, os universais mistérios, os segredados nas entrelinhas. Cada uma delas, todas cavernas de rica essência, dos elementares. Há uma alquimia no conjunto das palavras, pois difícil não se elevar no susseguinte. Teste, pois. Se bobear, vai encontrar até um semelhantemente Fausto, de mefistas e cabrunhãs avençadezas, por entre burizais.

Ler GSV não é o comum de se debruçar em outras obras. Primeiro que, por espanto, já na forma não sabemos se a obra, narrada em primeira pessoa pelo ex-chefe de jagunço Riobaldo, é um monólogo ou, como lá dizem as pessoas da academia, um diálogo de única voz, em que o interlocutor, que tudo ouve, não aparece em fala, só pelo ouvido da mente do leitor, que entrevê o oculto.

Confesso, sem falsa modéstia. Creio que por ter nascido no interior de São Paulo, em cidade pequena, de diversos encontros de gente de paragens todas do Brasil, no enriquecer a nossa caipirice, não tenho muita dificuldade de compreender a escrita de Grande Sertão: Veredas. Até as palavras inventadas, por mor de poesia, logo apreendi-as, com boas exceções, o que me socorro dos especialistas. Tem muita resenha disponível da lavra de brilhantes estudiosos das Letras. É saboroso complemento, o que de sobra recomendo.
Bom vendo ao que eu vinha a dizer, a minha dificuldade é manter o correr dar águas da leitura, sem parada. Amigo, amiga, amigx, é uma escrita tão linda, tão diferente, tão rebelde, de engenhosa musicalidade lírica, que se dá na forma, na insubordinação da pontuação, na brincadeira, com logos, de construir, de inventar palavras, que eu acabo por parar e sorrir de alegre, mas de alegre mesmo. Aí eu risco o trecho extasiante. Deixo ele amarelo com canetinha. E não me contenho. Corro compartilhar com alguém. Muitas vezes procuro minha mãe e leio o belo texto. É um presente que dou.

E agradeço o escritor, o versado, letrado, brilhante, gênio, mas caipira de cidade pequena, esse senhor Guimarães Rosa. Porque nele me vejo, nos vejo: espio toda a nossa gente. Ele fala é de nós ali. Não trata de reis, de poderosos. Não. Ele dá voz à quem nunca se deu o microfone. É uma humanidade o conjunto da obra. E o mais bom, o imprevisível. Guimarães Rosa nos encanta porque também foi encantado em antes, por aquela gente simples, rude, esquecida, bruta, paradoxal de tanta sabedoria, de pedras filosofais.

Há o mundo, há os planetas, há as galáxias, há o universo, o cosmo. E, numa replicação, há os microcosmos, e nesses há cada um de nós. Eu acho que o Rosa visava ao fundo de uma Unidade, sempre no esforço dele em mostrar que em tudo, até no mais humilde ser humano, o todo se replica, e ninguém é o mais importante num círculo desses complexos engenhos. Quiçá, eu esteja enganado. Mas que tudo é muito sublime em GSV, isso é!

Vamos, enfim, ao modo da escrita dele. Ao mundo FANTÁSTICO, tão no aqui, agora em.

A língua portuguesa do Guimarães Rosa não é a mesma do nosso ramerrão, da rotina. Quer dizer: é e não é, pois cuida de um "idioma" peculiar, por próprio, de revoltantes linhas que a todo segundinho deturpa a sintaxe, se revela com os advérbios, em usufrutos de lirismo de fazer brilhar o olho da gente.

Vejo muita gente que se arvora apaixonado pela literatura fantástica, e tais e quais levam ao extremo a sabência em Tolkien, em George R. R. Martin, em elevado sentimento de êxtase. Ora, não se negue e não, em sequer, admite desprestigiar as obras dos escritores renomados da língua inglesa, e seus "mundos-mais-do mesmo-mundo-do-sempiterno-deles" contado eurocentrismo. Mas, contudo, há os poréns, eis que.

Precisamos, nós amantes da literatura, do fantástico, do mágico, desabrochar o nosso próprio "eu", pois em terras nossas, além da Terra Média, da branquitude, há uns espaços tão nossos, de imensa epopeia, esquecidos, encobertos, por toda nossa gente, com parcas exceções.

Tal neblima, tal bruma, nevoeiro em nossas vistas, será que é por manejos de bruxaria do além-mar ou no interno supro da gente, de ignorar-se?

Há que desembaçar esse nosso espelho para que nos vejamos defronte em si.

Que encantamento é esse, sobejo, que faz a gente enxergar as terras de Frodo, de Gandolf, do Hobbit, do Khal Drogo, da Terra Média, além-mar, atlântico-e-pacifico-em-trás, mas não cega, nos tapa para esses mundos tão essencialmente nossos, tais sertões que se confiam com as bordas distantes do universal?
Como é possível, nós leitores brasileiros, amantes e degustadores da boa literatura, da fantástica, da mágica, da mística, ignorar em pleno desatino a existência do LISO DO SUSSUARÃO?

Ah! Bem sei que você desconhece tal paragem. Pois bem, conto-lhe como tem por anos contado Riobaldo, mire e veja:

????

"LISO DO SUSSUARÃO, é o mais longe ? pra lá, pra lá, nos êrmos. Se emenda com si mesmo. Água, não tem. Crer que quando entesta com aquilo o mundo se acaba: carece de se dar volta, sempre. Um é que dali não se avança, espia só o começo, só. Ver o luar alumia do, mãe, e escutar como quantos gritos o vento se sabe sozinho, na cama daqueles desertos. Não tem excrementos. Não tem pássaro."

O mundo atravessado de banda a banda por Riobaldo e sua jagunçada, homens do líder Medeiro Vaz, é cheio de grotas, de nascentes d'água, de flores, mas há as maldades, os ruins, o Belzebu, as bruxarias e os feitiços. Lendas de vila em vila, em corrente. Na Terra Média há os deuses e as deusas, no intervir por algo, contudo, o sertão é rude, rústico a ponto de se afirmar que "Viver é muito perigoso". E até Deus se vier, previna-se:

?? "O senhor sabe: sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, QUE VENHA ARMADO!"

Ah, mas no Senhor dos Anéis tem o sábio Gandalf, que enriquece a história, pode me alertar um ávido leitor dos estrangeiros.
Gandalf tem aforismos profundos, como esse :

???? "Tudo o que temos de decidir é o que fazer com o tempo que nos é dado."

Contrarrazões, em pois.

Quem disse que as veredas estão desguarnecidas de sabedoria Apresento-lhes um homem muito querido de Riobaldo, seu compadre Quelemém, de doutrina Cardéque. Luz para seus entes, seus queridos.

Foi compadre Quelemém quem disse, ciente, em enfrentamento de raciocínio incauto do Riobaldo:

??"Riobaldo, a colheita é comum, mas o capinar é sozinho..."

????
Convite para viagem ao LISO DO SUSSUARÃO

Sendo assim, fica o convite para a DESCOBERTA de um mundo fantástico bem em solo que pisamos, na sua continental extensão,
Grande Sertão: Veredas

? Recomendação para os aventureiros ao ler Guimarães Rosa

A escrita do Rosa é bem peculiar, oral, de modo que nos trechos de maior dificuldade, leia em voz alta, a compreensão ganha clareza. E não se sinta limitado. A obra dele é enigmática, e há especialistas para cada singular elementos dela. Sinta-se numa Palavroteca, divirta-se e siga adiante. Rosa cria palavras, neologismo. Com um pouco de esforço e quiçá pesquinha rápida no Google, tudo se alumiará. Não desista.

Em epígrafe, alertando os necessários eventuais revolteios de parágrafos.

??"Daí, pois, como já se disse, exigir a primeira leitura paciência, fundada em certeza de que, na segunda, muita coisa, ou tudo se entenderá sob luz inteiramente outra"
(Schopenhauer)

??

??Uma obra rica em reflexão randomizada, de amplitude universal

O ex-chefe da jagunçada, Riobaldo, enquanto narra sua vida a um homem instruído da cidade, traz a lume, às claras, a sua conclusão sobre a vida, sobre o homem, sobre Deus, sobre o Diabo, sobre a religião, sobre o amor, a guerra e as tantas coisas do que vê, vive e se ouve dizer no transcorrer existencial, na travessia.

Atente. Jusante, infra, por modo dadivoso de agradar nossa e minha "amizadagem", recolho excertos do Grande Sertão, em que Riobaldo fala de Deus e da religião, cuja matéria ele trocou muita sábia conversa com seu Compadre Quelemém, de doutrina Cardéque.

??"Compadre Quelemém nunca fala vazio, não subtrata", afirma Riobaldo.

Riobaldo, um socrático, por velhaca sabedoria, sem falsa modéstia, na solta palavra, avisa seu interlocutor, o homem instruído da cidade:

"EU QUASE NADA NÃO SEI. MAS DESCONFIO DE MUITA COISA."

????

Trechos "cogito", por substancial

? "Eu cá, não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo o rio? uma só para mim é pouca, talvez não me chegue."

?"O grande-sertão é a forte arma. Deus é um gatilho"

??"A força de Deus quando quer ? moço! ? me dá o medo pavor! Deus vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é na lei do mansinho ? assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se discutindo, se economiza."

?"Refiro ao senhor: um outro doutor, doutor rapaz, que explorava as pedras turmalinas no vale do Arassuaí, discorreu me dizendo que a vida da gente encarna e reencarna, por progresso próprio, mas que Deus não há. Estremeço. Como não ter Deus? Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdidos no vai-vem, a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar ? é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois, no fim dá certo."

? " Deus existe mesmo quando não há. Mas o demônio não precisa de existir para haver."
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Antonio.Junior 08/06/2020

Fenomenal!
E por que Grande Sertão: Veredas é um fenômeno? Porque uma linguagem incomum e difícil consegue prender o leitor do início ao fim. Porque ele nos transporta para os sertões nos fazendo crer que estamos acompanhando um bando de jagunços. Porque ele trata de amor, aventura, dramas, filosofia e romance em uma única novela. Porque ele é um dos melhores livros da língua portuguesa.
Só por isso?
Claro que não. Mas aí você terá que descobrir lendo.
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MRZA98 12/06/2020

Viver é muito perigoso!
Um dos melhores livros que eu já li na minha vida! Existem tantas coisas para se pensar e se refletir sobre Grande Sertão: Veredas. Recomendo como leitura obrigatória para qualquer brasileiro. Travessia!
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Nando 14/06/2020

Claro que eu vou ter que reler...
Quando eu comecei a ler esse livro e ver que eu não tava entendendo nada, pensei "bom, talvez não seja a hora ainda". Mas eu fui teimoso, e vi que apesar de estranhar a estrutura, dava pra compreender a história. Mas duas dicas preciosas, vindas de duas amigas, salvaram a experiência de ler "Grande Sertão: Veredas" e eu vou falar quais foram daqui a pouco.

Esse livro conta a história do Riobaldo. Ele é todo em primeira pessoa, então o Riobaldo vai tá falando pra gente sobre a trajetória de sua vida. Só que é curioso porque o Riobaldo conta a história não precisamente pro leitor, mas pra um interlocutor a quem ele chama de "Senhor", ou "Doutor", e que esse interlocutor aparentemente faz algumas interferências no decorrer da narração. Então, por diversas vezes, o Riobaldo para de falar o que tava contando e repete o que seria uma pergunta do "Senhor", como por exemplo "se eu tive medo?..." E isso é perceptível ao longo de todo o texto.

Pois bem, o Riobaldo vai tá contando pro Doutor/Senhor a história da vida dele. Ele é um jagunço, que vive em um bando, e que atua pelas regiões de Minas e Bahia (e Goiás?). O livro inteiro narra as experiências pelas quais passam os jagunços em seu meio de vida no sertão, com as guerras contra outros jagunços, as mortes, a divisão de tarefas, etc. Mas o Riobaldo, além de narrar como era a vida de jagunço, ele também vai falar sobre a infância dele e tudo que aconteceu, e as circunstâncias que fizeram com que ele chegasse até ali. Ele teve uma infância difícil, não conheceu o pai e, após a morte da mãe, passou a viver com o padrinho (Selorico Mendes), que era bem de vida e que cuidou bem do Riobaldo. Em dado momento o padrinho lhe manda ajudar um conhecido seu, chamado Zé Bebelo, a fim de lhe ensinar a ler. O Riobaldo passa a conviver com o Zé Bebelo, que conta pra ele sobre seu propósito de - se não me engano e a princípio é - acabar com a jagunçagem. Só que o Riobaldo acaba tendo interesse em virar jagunço e a partir de então ele entra em um bando, chefiado por Joca Ramiro. Posteriormente o bando do Joca Ramiro entra em guerra com o bando do Zé Bebelo (que agora é jagunço?) e o Zé acaba tendo que deixar a região. Mas o Joca Ramiro é traído por Hermógenes, o grande "vilão" da história, que assassina seu chefe. A partir daí, o Riobaldo se une a Zé Bebelo pra vingar a morte de Joca Ramiro.

Durante toda a narração o Riobaldo vai ficar fazendo algumas filosofias sobre a vida, o sertão, Deus, o diabo e o amor. O ponto chave dessa narrativa é justamente o amor que ele nutre por um colega seu de bando chamado Diadorim. Aliás, as minhas partes preferidas na história eram justamente quando ele falava sobre o Sertão, com as definições que variavam em cada circunstância ("Sertão é..."), ou quando ele falava de seu amor impossível por Diadorim.

Até então, eu tava gostando da leitura, mas não tinha tido o prazer de continuar lendo, nem ansiedade nenhuma, porque apesar de falar de algo tão complexo como o amor de dois jagunços, ou sobre a existência ou não do diabo, eu não tinha conseguido captar o espírito do livro.

Até que uma amiga me indicou um vídeo da Maria Bethânia declamando trechos de "Grande Sertão: Veredas". No mesmo dia, outra amiga falou "leia em voz alta". Pena que eu já tava com 60% da leitura, só que a partir daí eu vi que ler esse livro não era apenas "ler". Era preciso sentir! (uau kkkk). E depois de ver a Bethania lendo, e começar a ler em voz alta, e "virar" o jagunço Riobaldo, a história ganhou outro patamar.

É muito bonito ver como Riobaldo conduz sua narrativa, como ele fala sobre o Sertão e Diadorim, e até sobre seu outro amor (esse, possível), por Otacília... Em certo momento a história fica bizarra, com Riobaldo fazendo um "Pacto Fausto" (é assim que chamam o pacto com o diabo?). Enfim... É uma leitura que vale muito a pena.

E que não termina quando acaba. Claro que eu vou ter que reler.
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Maycon.Felipe 17/06/2020

Esse é um daqueles livros que você se pergunta se foi alfabetizado ou não. rs
Mas está claro que entre entender todas as centenas de páginas dele e entender o significado da grandeza da literatura de Guimarães Rosa, é preferível a segunda opção.
É inverossímil compreender que o nosso Brasil, país continental, terra dos sabiás e onde nasce o rio São Francisco não nos deixa decepcionados. Com seus diversos dialetos, o idioma Português é rico, mas não é rico porque nasceu de um só povo, é rico porque nasceu em Portugal, do Latim Vulgar, misturando-se com idiomas da África e dos povos que aqui habitam a milênios, sem contar a influência, principalmente dos italianos e alemães que cá se estabeleceram.
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Nélio 18/06/2020

Terminada a leitura de “Grande Sertão: Veredas”, fico sem saber como me desligar da obra. Ainda gastarei um tempo remoendo o que li, mesmo não sabendo dizer direito o que achei dela!
A princípio, li o livro porque é um clássico, o que, para mim, sempre é motivo para se prestar atenção e ficar na curiosidade para saber o que tem de bom em um livro com essa característica.
Entretanto, li-o principalmente porque uma grande amiga, cuja opinião literária merece o meu respeito, afirma que este é o livro da vida dela! Vixi! O melhor livro que ela leu até hoje – e ela já leu muito, mesmo! Eu tinha que lê-lo!
Assim, encarei o calhamaço. E os sentimentos são vários. Não sei se conseguirei colocar no papel tudo o que senti e ainda sinto com ele.
O final dele valeu a pena.
Pronto, já disse tudo... Só carece de mais comentários meus, mas a verdade está aí.
Primeiro: ao final da obra, as emoções de Riobaldo ao ver Diadorim morto e ao descobrir aquela verdade que está lá no final do livro é de encher os olhos de qualquer leitor mais apaixonado. Gente, fiquei abobado com algumas de suas falas: “Eu não tinha competência de querer viver, tão acabadiço, até o cumprimento de respirar me sacava.” e “Para quê eu ia conseguir viver?”
Segundo: também a sugestão final sobre Deus, alma e existência humana coroa muito do que foi discutido ao longo do texto. Vejamos a fala final: “O diabo não há! É o que eu digo, se for... Existe é homem humano. Travessia.” Vale um café para falar sobre esse ponto na obra. Minha amiga que me aguarde!
Terceiro: posso até apanhar, mas o que menos me agradou foi o uso da linguagem que o autor imprimiu em seu texto. Sei que justamente essa marca é o diferencial e um dos grandes valores de sua obra como um todo. Em seus contos, acredito que funcionou melhor o que G. Rosa aproveitou de suas anotações quando passeava pelo sertão brasileiro a respeito do uso da língua portuguesa em sua escrita. Aqui, no romance, em muitos momentos senti enfado, cansaço e dificuldade de entender. Isso me desagradou.
Paro, agora, a contagem, pois há tantas outras coisas a se dizer! E não falarei tudo aqui, hoje.
Destaco a vontade de Riobaldo de se entender enquanto ser vivente. Ele narra tudo de sua vida a seu compadre Quelemém, mas, na verdade, ele quer é revisitar sua consciência e sua existência para que ele melhor se entenda; e, com isso, ganhamos um narrador que joga sua alma para fora de si. E a resposta do compadre é perfeita para a dúvida final do rapaz; e que vale para todas as dúvidas que ele carregou até o fim de suas narrativas: “Tem cisma não. Pensa para diante. Comprar ou vender, às vezes, são as ações que são as quase iguais...” ..... Uau, que perfeição!
Sobre as questões existenciais e a relação do ser humano com Deus, lembro-me desta passagem:
“Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdidos no vaivem, e a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar – é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois no fim dá certo. Mas, se não tem Deus, então, a gente não tem licença de coisa nenhuma! Porque existe dor.”
As passagens das lutas entre os bandos de jagunços são grandes momentos da obra, assim como as inserções sobre os sentimentos que Riobaldo carrega por Diadorim e que travam suas certezas e seus desejos. Há muita riqueza na obra, não se pode negar; porém, é preciso ter muita disposição para a leitura.
Ler o livro não foi fácil, eu admito. Mesmo assim, é enriquecedor conhecer um texto denso e cheio de passagens memoráveis como as que vamos nos deparando ao longo da leitura.
Há muito que poderia ser dito sobre o livro, mas vamos ficando por aqui. A travessia é longa!
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Julio.Argibay 25/06/2020

Graaaaande sertão.
Grande Sertão Veredas ? João Guimarães Rosa. Este romance é um épico sertanejo e conta de forma visceral o modo de vida dos jagunços, numa época bem remota, século XIX, donde esse povo quase esquecido pelo Estado, desenvolve relacionamentos próprios, endêmicos, de confiança, mas também de traições epicas. A estória eh relativamente simples, sem grandes reviravoltas. Na verdade, narra as brigas, os romances, as paixões e as desavenças entre bandos de jagunços no sertão nordestino. O bando de Joca Ramiro, ao qual nossos dois personagens principais: Riobaldo e Diadorim fazem parte e o bando de Hermogenes / Zé Bebelo, que tem uma ligação forte no passado com Riobaldo. Santa contradições. Esses dois amigos tem uma relação conflituosa. Há algum incomum entre os dois: admiração, companheirismo, desejos, etc e tal. Eh uma amizade, no minimo diferente. Um sentimento não convencional, principalmente, se inserida num contexto de sociedade na qual os dois estão inseridos. Esse eh o foco do romance, essa convivência entre esses dois jagunços. Destarte, como pano de fundo, aprendemos um pouco sobre a cultura do sertão, da caatinga (pelo amor de Deus, não estamos falando de banda sertaneja, aqui eh gente de verdade, com contribuições a dar a sociedade). O ambiente, por sua vez, é o mais hostil possível, urtiga, cansanção, cactos, terra, sangue, poeira, urubu, cobra e navalha. Entre eles, o modo de vida é bastante diferente. Tanto na culinária: carne do sertão, farinha, etc. A linguagem utilizada entre eles, eh muito regional, caracterizada por frases curtas e cheias de expressões próprias, muito difícil. No final das contas, torna-se muito maçante, pois exige muita atenção, é quase outro idioma. Carece de tradução. Sim, temos a bendita religiosidade também, em pleno cangaço. A fé em seus santos e entidades locais. As vestimentas são próprias e adaptadas a vegetação agreste e ao sol escaldante, ao qual os sertanejos estão submetidos. Todos estas características nos demonstram o quanto esse povo é rico em tradições, em costumes, tendo seu próprio modo de produção. O qual entra em choque com a sociedade urbana da época, o que faz com que sejam reprimidos pelo governo. Nesse ínterim, há muito tiroteio, brigas de faca, traições, camaradagem e amores proibidos. Terra de gente braba, viu. Mas, como tudo na vida tem um fim, pois as rixas são resolvidas na faca, na força bruta. A vingança se concretiza, eh verdade, mas o preço é muito alto para todos os lados. Vida que segue, viramos a página, mesmo com o coração doente...
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Tayemi.Oshiro 11/07/2020

Carta para um mano-velho
Mano-velho, descobri nesses preparos do silêncio que palavra tem música, e se a gente quisé tem até autonomia pra recusar o léxico, as regras todas e seguir outro estatuto, em nome da poesia. Que regozijo ouvir escritor nosso dizendo repicado e embaralhado sempremente até o fim, pondo certo no incerto. Cheiro de sensações - "(...) gafanhoto pula, tem um estourinho, tlique, eu figurava que era das estrelas remexida, titique delas, caindo por minhas costas (p.152). Ouvir assim assim. Apreciei a cigarra de entre-chuvas, o saci-do-brejo, o coco do buritizal e as notícias vivas de um lugar todo nosso. Para o fim, encerro a carta com passagem miúda que me fez lembrar das conversas com Paulo Freire, quando ele teimava em dizer e predizer que pensar certo exige viver consciente de nossa inconclusão.
"Mire e veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isto me alegra, montão. E, outra coisa: o diabo, é às brutas; mas Deus é traiçoeiro! (p. 24).
Um abraço carinhoso
Tay
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Marcela Mosqueti 12/07/2020

O sertão é o mundo e Riobaldo nos revela isso logo nas primeiras páginas, mas só vamos começando a compreender tal relação quando a leitura avança.
A vida é uma travessia muito perigosa, porque não sabemos o que nos aguarda pelo caminho e o diabo vem dentro do redemoinho. Que saibamos então reconhecer os diabos que nos habitam, mas não dar ouvidos a eles.
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