milton_rocha 08/08/2020
Alea jacta est
Tratamos aqui de uma narrativa, por sinal espetacular e magicamente escrita, sobre o que te faz ser o seu próprio "Eu". Neste caso a discussão implícita é a individualidade não apenas da personagem principal, Tertuliano Máximo Afonso, mas de tudo o que o faz tornar-se um “ser humano”. Tertuliano leva uma vida pacata e sem relações sentimentais significativas e duradouras, permeado pela depressão e falta de conexão, o descobrimento da existência de um duplo é, por si só, uma fagulha que o motiva a fazer algo com sua vida, buscar o que o torna ele mesmo.
Vivemos uma constante indagação sobre o que somos e como nos compomos, sendo necessária a definição de caminhos que serão utilizados para apresentar e representar a nossa própria individualidade.
Nossas redes sociais são caracterizadas pelo imperativo da divulgação para todos de uma "pseudo-essência" indispensável na promoção de uma figura do “Eu”, individual e único e isto, para muitos, é o que gera a sensação de individualidade. A constante negação da alteridade em uma ponta contra a algum modo dito como o “correto” de se viver em outra, nos mostra a controvérsia que muitos vivem e chamam de vida saudável, consciente e evoluída.
Ao descobrir que, mesmo com seu nome, Tertuliano não é único, a sua situação depressiva se mistura com angústia e curiosidade, afinal, a existência de alguém igual a si destrói a satisfação interna presente no autodescobrimento e estipula uma questão importantíssima: Quem veio primeiro, quem, de nós dois, é o duplo?
A decisão do modo “correto” de se viver é uma tarefa individual não somente uma cópia da vida do “Outro”, visto que todos nós construímos diariamente a nossa essência a partir do choque constante de ideias que já nos agradam com novos modos de perceber e viver a vida, conseguimos atingir infinitas possibilidades de construções pessoais, sendo assim, somos todos singulares através das decisões que nos fizeram o que somos hoje.