Coruja 06/11/2012Li esse volume no aeroporto, enquanto esperava para embarcar – e talvez parte do desalento que senti ao virar a última página tivesse também a ver com o cansaço de uma longa espera e a ansiedade de chegar em casa – sentimentos que, de certa forma, o amargo protagonista de O Ladrão e os Cães compartilhou comigo.
Naguib Mahfouz é conhecido por suas obras intrinsecamente ligadas à História do Egito, passado e presente juntos de forma quase esquizofrênica, dividido entre a grandeza dos faraós e uma modernidade presa entre o fundamentalismo, a miséria e a corrupção. Nobel de literatura, é considerado por muitos críticos como o Balzac de seu país.
A comédia humana de seu protagonista aqui, porém, é tudo, menos cômica. Said Mahran, que outrora se imaginara um Robin Hood, foi traído pela esposa e pelo melhor amigo e entregue à polícia, passou quatro anos preso – tempo em que se consumiu com o desejo da vingança.
Ao finalmente se ver livre, a primeira coisa que faz é procurá-los e tudo o que ainda podia impedi-lo de embarcar sem volta no caminho de sua própria destruição – sua filha – é o que o joga de vez no desespero, pois a menina não é capaz de reconhecê-lo, ficando aterrorizada ao ser trazida a sua presença.
Daí por diante, Said está perdido. Incapaz de se encontrar em meio às ruínas de suas ideologias pós-revolução egípcia, preso em seu absoluto rancor e surdo a qualquer apelo, ele se volta contra aqueles que considera culpados, mas só acerta inocentes até se tornar, ele mesmo, uma vítima de seus atos.
A prosa é soberba, mas deixou-me bem deprimida: retrato fiel da realidade, é um livro que termina com o sepultamento de todas as ilusões, toda a inocência e esperança. Mais triste ainda talvez seja ver agora a história se repetindo, no mesmo lugar, pelo mesmo caminho...
(resenha originalmente publicada em www.owlsroof.blogspot.com)