Danilo Barbosa Escritor 26/03/2012Muitas vidas, um só aprendizadoVeja mais resenhas minhas no Literatura de Cabeça:
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Se falarmos sobre as religiões atuantes no Brasil, a umbanda é uma das mais comentadas e menos conhecidas. Muitos a criticam, falam mal de suas cerimônias, transformam o tema em Tabu, mas não se interessam em conhecer maiores detalhes.
Isso acontece, muitas vezes, até entre os seguidores da mesma. Isso eu digo com propriedade, já que tenho pais praticantes da umbanda. Sabemos todos os rituais, nomes de entidades, acreditamos na existência e no poder de cada um deles, mas raramente alguém tenta se aprofundar no assunto.
Mônica de Castro, conhecida autora espírita resolveu unir através de seu novo romance o kardecismo e a umbanda. Com Jurema das Matas (Vida e Consciência, 367 páginas), ela conta as trajetórias carnais de uma das mais famosas entidades da umbanda - a Cabocla Jurema, já cantada em tantas canções religiosas ou populares e desenhada das mais distintas formas.
Nessa obra, ela mostra as 04 últimas encarnações deste espírito tão evoluído, correndo pelas mais diversas épocas e situações: o espanhol Alejandro Velázques e sua aventura em um mundo recém-descoberto, sem imaginar que mentiras e intrigas o cercam, enviados por quem ele ama; a pobre mestiça Aracéli, filha de pai português e mãe índia e sua luta pela liberdade da alma, num mundo que a vê como mero objeto; Norma, a escrava inconsequente que paga um preço muito alto pelos seus atos e Eleonora, uma mulher pronta a mudar aos primórdios da espiritualidade.
O livro segue o ritmo de muitos romances espíritas que conhecemos: vidas que se cruzam em busca do amadurecimento e tomam as decisões que acham as melhores. Alguns acertos, erros, muitas venturas e lamentos, mas nesse tipo de livro nós sabemos que, impreterivelmente, no fim tudo irá se explicar. Através da ação e reação, vemos a vida de Jurema passar diante de nossos olhos e percebemos como os destinos se entrelaçam com suas intrínsecas certezas.
A trama passou por mim como um livro de contos, analisando cada vida como uma história em separado. Apesar da escrita fluente de Mônica, assumo que o livro não me trouxe grandes novidades. Cada encarnação em si tem uma série de clichês que estamos cansados de ver, pois fazem parte do nosso dia a dia. O homem traído, a pobre mulher perseguida por um homem que a deseja loucamente, a jovem inconsequente que troca os pés pelas mãos ou a dama à frente do seu tempo... Não importa. Em algum momento, já nos deparamos com dramas parecidos. Sendo literatura espírita ou não.
A melhor coisa desse livro, na minha opinião, é a última vida de Jurema, como Eleonora. No Brasil do começo do século 20, ela é testemunha viva dos acontecimentos que levaram o médium Zélio de Moraes a criar a verdadeira umbanda. Aquele que quebrou as regras da FEB - Federação Espírita Brasileira, que impedia o contato das pessoas com o espírito de negros e índios, pois achavam que essas almas abnegadas não tinham conhecimento suficiente para ajudar os outros. Aí sim, tive várias explicações que nem sequer imaginava e foram muito boas para mim.
"- Se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho, para dar início a um culto em que pretos e índios poderão dar sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano astral lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim.
- Julga o irmão que alguém irá assistir a esse culto? - ironizou o vidente.
- Cada colina de Niterói atuará como porta-voz, anunciando o culto que amanhã iniciarei."
E em meio a tantos fatos fantásticos e coisas surreais, porque não resgatar um pouco da fé em nós mesmos?
Agora é a sua vez.