Queria Estar Lendo 17/05/2017
Resenha: A Lista Negra
A Lista Negra é um dos livros que eu esperei muito tempo para ler, criando expectativas, e fico muito feliz por não ter sido desapontada. Esse é o primeiro romance escrito por Jennifer Brown, mesma autora de Amor Amargo, que aborda temas tabu que precisam ser discutidos.
O dia 2 de maio é um dia que o colégio Garvin nunca vai esquecer. Na manhã do dia 2, Nick Levil, estudante do terceiro ano do segundo grau, abriu fogo contra seus colegas de classe na cafeteria, matando cinco pessoas e ferindo várias outras -- inclusive sua namorada, Valerie. Nick tinha alvos específicos marcados na infame Lista Negra, um caderno de capa vermelho no qual ele e a namorada escreviam o nome das pessoas que praticavam bullying com eles. Pessoas que eles acreditavam merecerem uma punição por seus comportamentos agressivos, pessoas que nunca tiveram que lidar com as consequências do que faziam à eles.
"Isso era apenas outra coisa que Nick tinha roubado de mim, de todos nós, naquele dia. Ele não roubou apenas a nossa inocência e sensação de bem-estar. Ele também conseguiu roubar nossas lembranças."
Agora, depois de acordar no hospital, Valerie precisa lidar com muitas coisas: seu namorado está morto, ela tomou um tiro ao defender uma de suas maiores atormentadoras, e por causa da Lista Negra, a polícia acha que ela está envolvida no tiroteio. Pior, seus pais, colegas e toda a comunidade de Garvin acreditam que ela está envolvida.
Depois de passar o verão inteiro afundada em depressão e auto-piedade, dividindo seu tempo entre sua cama e o consultório do dr. Hieler, Valerie precisa se preparar para voltar a escola -- agora que eles decidiram que, ao invés de cúmplice, ela é heroína. Porém, parte do colégio não se sente assim e, para ser sincera, Val também não. Ela ainda se sente responsável e culpada pelo que aconteceu.
Como ela não viu que Nick estava falando sério? Como ela não percebeu que aquilo ia acontecer? Como ela não impediu que Nick destruísse a vida de tantas pessoas, destruísse a vida deles?
O livro é contado pelo ponto de vista da Val, mesclado com pedaços de matérias do jornal local a respeito da tragédia, que junto dos pequenos trechos que descrevem o dia do tiroteio, servem para nos situar melhor dentro dos acontecimento e nos relacionamentos de Val.
"Eu tinha mudado mamãe. Mudado seu papel de mãe. Seu papel não era mais tão fácil e claro como tinha sido no dia em que eu nasci. Seu papel não era mais de me proteger do resto do mundo. Agora, seu papel era proteger o resto do mundo de mim."
A vida da protagonista está completamente fraturada, sua vida em casa está difícil: a mãe vive no extremo, com medo de que Val machuque a si mesma ou outra pessoas, culpando-se por não ter sido mais presente, não ter visto o que acontecia na vida da filha, por não tê-la impedido de se relacionar com Nick; já seu pai está distante, culpando-a por tudo que eles passaram nos últimos meses e sem um pingo de interesse nela. Enquanto isso, seu irmão mais novo, Frank, é cada vez mais negligenciado e, apesar de amar a irmã, sente-se tão atingido por tudo aquilo quanto ela.
Enquanto isso, na escola, seus colegas de classe a culpam, preferindo acreditar que ela era a "mandante" e Nick apenas executou o plano. Seus melhores amigos se afastam, mesmo que estejam vivendo um dilema semelhante, sem conseguir conciliar o Nick que amavam com o Nick que matou seus colegas de classe, jogando a culpa em Val para não terem de perguntar a si mesmos "onde estávamos que não o impedimos de fazer isso?".
Uma das coisas que Jennifer Brown fez e que eu mais gostei foi não vilanizar completamente Nick pelo que ele fez, ela soube fragmentar a personagem e mostrar os dois lados de uma mesma moeda. Val relembra constantemente de seus momentos felizes ao lado de Nick, pintando a imagem de um garoto doce e apaixonado -- o que contribui para seu sentimento de culpa, sentindo-se responsável por não perceber o momento em que as piadas passaram a refletir desejos reais de Nick e quando ele parou de conseguir lidar como bullying. O momento em que ele caiu pelas fendas da depressão.
Grande parte do crescimento de Val no livro é, também, sobre perdoar a si mesma. Ela passa tanto tempo compenetrada em garantir que as pessoas a sua volta, especialmente seus pais, possam perdoá-la, que demora a perceber que ela também precisa se perdoar. Como todos os seus colegas de classe, ela também foi uma vítima das ações de Nick.
A partir do momento em que ela para de se esconder atrás do rótulo de vítima dos colegas e passa a perceber que todos -- inclusive ela e seus amigos -- são tanto vítimas como perpetuadores de bullying, ela é capaz de entender e superar seus traumas.
"Entre lágrimas, o padrasto de Nick acrescentou: "Nosso filho também está morto. Por favor, não se esqueçam disso"."
É um tema sensível, especialmente na comunidade norte-americana que lida tanto com incidentes do tipo, mas uma discussão necessária. É preciso entender que todas as nossas ações tem reações e que nunca saberemos como nossas palavras e provocações serão recebidas por outras pessoas. É preciso enxergar além do estereótipo que criamos e enxergar pessoas, não apenas um rótulo que usamos para nos separar e odiar.
Na minha opinião, é uma história corajosa sobre amadurecer, perdoar, enfrentar seus medos e lidar com a parte feia da realidade. É uma das minhas leituras preferidas do ano e me sinto na obrigação de indicar para todos -- que sentem-se mental e emocionalmente estáveis para lidar com uma história emotiva e sensível, com discussões a respeito de bullying, depressão, suicídio e tudo que habita entre um e outro.