2013

2013 Roberto de Sousa Causo...




Resenhas - 2013


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Ednelson 04/12/2012

Análise:

“Permaneceram apenas ruínas de um mundo perdido, quase esquecido. Mesmo assim, as palavras contidas nas páginas de seus livros ainda emanavam uma poderosa energia, como se sussurrassem pelos corredores, exigindo reverência e respeito.”

—Pág. 113, “Os Filhos do Dragão”.

Saudações, caros leitores! Desde que o homem obteve o conhecimento de sua finitude, isso costuma aterrorizá-lo, o medo pode não se manifestar sempre no mesmo indivíduo, mas todo o tempo está rondando a humanidade e arrebatando alguém. No embate contra este fato, muitas sociedades chegaram à conclusão de que esta linha que vai do nascimento ao falecimento se estenderia ao planeta ou até mesmo o universo, logo as mais distintas perspectivas se formaram acerca da questão. Há quem viva em um mar de desespero, mesmo que saiba maquiar as suas emoções para aqueles que o cercam, e outros que veem nisso o incentivo para aproveitarem as suas existências ao máximo, a coisa vai de oito a oitenta nesse âmbito. A literatura fantástica, como palco para suscitar debates e estimular a nossa imaginação, não poderia se ausentar de dizer algumas palavras sobre o tema, portanto, irei comentar o que achei dos contos presentes na antologia “2013 – Ano Um”.

O prefácio fala um pouco sobre os efeitos da ideia do fim do mundo no nosso dia-a-dia, como afeta a nossa relação interpessoal e interfere na percepção de grandes tragédias, algo que não deixa de ser um apocalipse, no sentido amiúde associado à palavra, uma vez que aqueles que morrem perdem a consciência de tudo. Também são citadas algumas obras clássicas e outras mais recentes da literatura que abordaram o tema, possibilitando ao leitor que busque os livros ou contos mencionados a fim de saber melhor como a literatura se debruçou nisto até o presente momento. Antes que os contos comecem, somos convidados a pensar se um grande evento é necessário para que alteremos o destino de nossos passos como coletividade, criando um futuro diferente daquele que está sendo pintado. Com a indagação final do prefaciador, a leitura começa perfeitamente, pois somos instigados a formular uma solução para o problema e ficamos ansiosos para saber como cada escritor trabalhou a proposta apresentada pelas editoras.

Terra Brasilis – Gerson Lodi-Ribeiro:

Nessa história um fenômeno muito estranho na linha do tempo ocorreu no mundo, contudo no Brasil o efeito foi singular. Os protagonistas são um grupo de militares, daí poderíamos imaginar que algum grande conflito poderia ser travado, mas o que vemos é uma jornada rumo a um foco de esperança (sem mais informações para evitar spoiler). Durante o texto há trechos em inglês, os quais consegui compreender, entretanto acho que notas de rodapé deveriam ser usadas. O desfecho deixa muito a desejar. Histórias curtas, como é caso das presentes neste livro, devem criar ao menos um grande ponto de virada para realmente impactar o leitor, mas ao concluir a leitura deste conto fiquei com o pensamento: “E...?”. Não consegui me emocionar de alguma forma.

A Rapineira – André Zanki Cordenosi:

Aqui não temos tempo para respirar, uma mulher empreende uma missão, porém o terreno em que está situada é infestado de inimigos perigosos que não chegam a ser claramente definidos pela autora, mas a própria indefinição somada ao nome que é usado para designa-los (Predadores) é o suficiente para nos incutir com uma agonia que vai crescendo cada vez mais e só nas últimas páginas começa a ser aliviada. A protagonista também nos demonstra que o apocalipse tornou-a ainda mais “humana”, ampliando o seu senso de comunidade, após ver que para sobreviver seria indispensável unir-se em um grupo bem coordenado. Gostei como foi dosada a ação, suspense e drama.

Antigos – Duda Falcão:

Em “Antigos”, o conhecimento histórico é analisado como uma ferramenta de dominação. É do conhecimento de todos que a história normalmente é contada pelos vencedores, sendo a perspectiva dos derrotados conhecida somente mediante a exposição de alguém que trabalhe para nos trazê-la. O texto é dividido em cenas-ambientes, o que faz o leitor sentir-se ao lado do personagem principal que procura tomar ciência da sua origem e como o mundo atingiu o estado atual. Apesar de estarmos muito perto do protagonista, acabamos nos surpreendendo com uma revelação.

A Imagem do Homem – Carlos Relva:

O conto começa com um clima de paranoia, sustentando pela formulação de uma conspiração contra uma instituição responsável por regular a sociedade, porém o que vemos é somente um borrão do verdadeiro contexto, pois a parcialidade dos personagens que assumem o papel de interlocutores é absoluta e isso gera algumas surpresas. O título assume um sentido extraordinário quando conhecemos a verdade, mas antes disso não entrega sequer um pingo do que nos espera.

O Último Homem – Ademir Pascale:

Tudo começa demasiadamente simples, mas o autor consegue desenvolver bastante o personagem e até me surpreendeu. Era uma história para a qual não pensava que fosse bater palmas, talvez seja uma das que mais me surpreendeu, mas não necessariamente a que mais gostei. A história começa em um ponto do futuro e depois retrocedemos para elucidarmos as coisas. A narração pode parecer um pouco confusa, mas avalio essa desorientação como necessária para nos sentirmos na pela do personagem, com a leitura vocês poderão compreender melhor o que estou dizendo.

Projeto Olimpo – Paulo Fodra:

A mente de uma criança apresenta o esboço do projeto que visa salvar a humanidade ou pelo menos alguns representantes da espécie para que o planeta seja repovoado, esse é o estopim do texto do Paulo Fodra. Fico fascinado quando a ficção se torna um canal para suscitar um debate extremamente pertinente e durante essa leitura vi nos parágrafos uma reflexão sobre a grande importância que damos ao avanço tecnológico, mesmo que isso nos custe alguns anos da expectativa de vida ou prolongue, mas ainda nos jogando em um mundo com pouca qualidade. Obviamente o desenvolvimento de máquinas nos trouxeram várias maravilhas, mas elas por si mesmas de nada valem. O que confere valor à máquina é o uso que fazemos dela. O final me deixou boquiaberto, uma mensagem forte como um soco no estômago.

Para Viver na Barriga do Monstro – Roberto de Sousa Causo:

É mostrado como o sistema em que vivemos é baseado em uma estrutura frágil, extremamente necessitada de mecanismos que se falharem vão trazer consequências pavorosas. Realmente o conto é assustador por ser tão real, o temor dos personagens é algo plausível. É interessante citar a escolha da Amazônia como palco dessa narração, pois isso serve para nos apresentar a seguinte pergunta: O que é civilização? Constatamos que evidentemente não é sofisticação no modo de vida, uma vez que pessoas que se matam com armamentos de última geração por disputas mesquinhas não são um símbolo de evolução intelectual, ao menos a lógica nos grita que não. A minha única crítica é quanto ao uso de palavras em inglês, pois mesmo que eu entenda, outros leitores podem não compreender, mais uma vez, recomendaria o uso de notas de rodapé.

Os Filhos do Dragão – Sandro Quintana:

Nesse conto o autor retrata como os livros são importantes para a preservação da identidade de um povo. O que vemos é um ancião conduzindo um grupo de crianças por uma biblioteca para lhes falar sobre o tempo antes do avô do avô do seu avô, ou seja, é uma grande viagem ao passado, um tempo em que as coisas eram radicalmente diferentes, com um clima de épico. A imagem fantástica é construída magistralmente, o ancião faz as crianças silenciaram com as suas palavras ao redor de uma fogueira. Cheguei a ver o texto como uma grande poesia, realmente belo! No final das contas, descobri que eu sou um filho do dragão. O que seria isto? Vocês só irão descobrir quando lerem.

Reino – Josué Oliveira:

Nesse caso o apocalipse é comentando pela ótica de alguém que antes mesmo do grande evento já sabia o quanto a sociedade estava imersa em um culto ao efêmero, consumindo de forma desenfreada sem notar os sinais de que as coisas não estavam indo bem. Essa perspectiva lembrou-me do clássico cinematográfico de George A. Romero, “Madrugada dos Mortos”, em que os mortos-vivos são usados como uma metáfora para o consumismo. O protagonista, alguém que esteve sempre à margem da antiga sociedade, coloca-se como um Rei, visto que conhece a cidade como a si mesmo e a sente como parte de seu organismo, o que não deixa de ser verdade, uma vez que ele sempre pôde enxergar a face mais crua da selva de pedras. O final deixa espaço para especularmos sobre qual a real necessidade de uma figura central de autoridade para a conservação das sociedades.

O Dia em Que as Nuvens Caíram – Adriano Siqueira:

O conto é ágil, a explicação sobre o que trouxe a destruição, assim como todos os acontecimentos subsequentes, é breve, talvez deixando alguns leitores com vontade de que a história fosse mais desenvolvida. Acho que a ideia central poderia render um bom livro. O grande ponto alto é a nova leitura que o Adriano fez dos zumbis.

Irmãos do Espírito – Daniel Tréz:

Uma crítica ácida à cultura de controle massivo, dando ênfase na esfera religiosa. O autor não formula um parecer sobre as religiões, mas usa esse viés para expressar como a liberdade é muitas vezes sacrificada em nome de uma tranquilidade, dentro da qual a vida se torna infrutífera e as pessoas não possuem o direito à palavra, independente do cargo que ocupem. O final nos demonstra a falta de sentido no pensamento da guerra como instrumento para edificar a paz, algo recorrente em nosso próprio mundo em países imperialistas.

Deixando o Condado – Ana Lúcia Merege:

A referência a Tolkien vai além do título, mas não direi os detalhes para não estragar a leitura de vocês. Gosto de histórias com referências, mesmo que não sejam literárias, pois isto enriquece o texto e aumenta o entretenimento. Aqui, algumas pessoas manifestam o desejo de irem além do local em que estão refugiadas após o apocalipse a fim de descobrirem como a terra realmente está, contudo outras pessoas acham que isto pode representar um alto risco ao modo de vida de todo o grupo. O conto termina em aberto, deixando o leitor com a mesma emoção dos personagens acerca do futuro: um mar de sombras.

Sempre o Sol – João Rogaciano:

O conto é narrado em primeira pessoa e nele, como em alguns dos textos anteriores, o personagem principal conduz uma busca pela verdade, ação que pode lhe custar a vida. O legal é o sentido que tudo ganha com a revelação final, cheguei à conclusão de que de certa forma algumas pessoas vivem como na realidade imaginada nessas linhas.

O Retorno – Marcelo Bighati:

O Marcelo optou por realmente trabalhar a profecia Maia em seu texto e trás um excelente conto de ficção científica, a sensação que tive é que a história poderia ficar ainda melhor, caso o autor dispusesse de mais espaço para explorar a trama, mas o final não decepciona. A conclusão encontra respaldo na realidade, pois quantas vezes não vemos ações benéficas serem retribuídas com barbáries? Sim, meu objetivo é lhes despertar a curiosidade pela obra, portanto não darei mais informações.

Mariana – Tibor Moricz:

Esse foi o conto que mais gostei porque o autor trata a ideia do apocalipse muito diferente do que as demais histórias fizeram, não que isto seja motivo para desmerecimento do trabalho dos outros escritores, mas já é um diferencial que me cativou e a qualidade da escrita é excelente. Nesse caso, um homem vive um fim do mundo particular, a sua vida é completamente amarga, sem alento, ou seja, antes mesmo do mundo ruir, o protagonista vive em desolação e o advento do apocalipse surte um efeito contrário ao que costumamos ver em histórias escatológicas, pois o fim do mundo ao seu redor faz com que ele se impulsione para ir obter aquilo que até então ignorou.

O posfácio fecha a antologia comentando como o tema da antologia sempre cativou o ser humano e vai continuar despertando reflexões, seja pela trilha da espiritualidade ou ciência, afinal o nosso próprio fim é algo com o qual todos vão ter de lidar, não importa cor, etnia, sexo, convicções etc. A morte, afinal, é uma grande expressão da nossa igualdade.

Gostei do trabalho gráfico, os poucos erros de revisão e diagramação que encontrei não chegam a afetar a leitura, tornando-os motivos para críticas, as páginas pretas que vem antes de cada conto funcionam como representações das trevas associadas ao fim do mundo, mas a escuridão é seguida pela luz de um novo começo (as páginas com as histórias). O tom amarelado das páginas é agradável aos olhos e as bios ao final de cada conto são legais, pois os leitores sabem os meios para entrar em contato com os escritores ou se eles possuem outros trabalhos publicados. Recomendo este livro e dou quatro selos cabulosos!

Extra:

Este extra não diz respeito à “2013 – Ano Um”, mas a um miniconto do autor parceiro do blog, Sandro Quintana. Este miniconto segue como um bônus para quem encomendar a antologia com ele.

A história chama-se “O Pesadelo dos Pesadelos” e ao que tudo indica acompanha a rotina de um homem em seu trabalho exaustivo devido à repetição. O caráter cansativo das ações para o personagem se reflete no texto com o uso constante de um trecho do conto (“Preencheu, assinou, carimbou, e digitou”). É admirável como as coisas mais rotineiras podem se transformar em boas narrações de terror, bastando para isso o uso de algumas palavras mais apropriadas para que o clima desejado seja alcançado. No final das contas, vemos que o que chamamos de realidade pode ser o pesadelo de outra pessoa, sendo ela parecida ou não conosco. Dou cinco selos cabulosos para o conto!

Escrevo no: http://leitorcabuloso.com.br/
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Leitor Cabuloso 14/11/2012

Saudações, caros leitores! Desde que o homem obteve o conhecimento de sua finitude, isso costuma aterrorizá-lo, o medo pode não se manifestar sempre no mesmo indivíduo, mas todo o tempo está rondando a humanidade e arrebatando alguém. No embate contra este fato, muitas sociedades chegaram à conclusão de que esta linha que vai do nascimento ao falecimento se estenderia ao planeta ou até mesmo o universo, logo as mais distintas perspectivas se formaram acerca da questão. Há quem viva em um mar de desespero, mesmo que saiba maquiar as suas emoções para aqueles que o cercam, e outros que veem nisso o incentivo para aproveitarem as suas existências ao máximo, a coisa vai de oito a oitenta nesse âmbito. A literatura fantástica, como palco para suscitar debates e estimular a nossa imaginação, não poderia se ausentar de dizer algumas palavras sobre o tema, portanto, irei comentar o que achei dos contos presentes na antologia “2013 – Ano Um”.

O prefácio fala um pouco sobre os efeitos da ideia do fim do mundo no nosso dia-a-dia, como afeta a nossa relação interpessoal e interfere na percepção de grandes tragédias, algo que não deixa de ser um apocalipse, no sentido amiúde associado à palavra, uma vez que aqueles que morrem perdem a consciência de tudo. Também são citadas algumas obras clássicas e outras mais recentes da literatura que abordaram o tema, possibilitando ao leitor que busque os livros ou contos mencionados a fim de saber melhor como a literatura se debruçou nisto até o presente momento. Antes que os contos comecem, somos convidados a pensar se um grande evento é necessário para que alteremos o destino de nossos passos como coletividade, criando um futuro diferente daquele que está sendo pintado. Com a indagação final do prefaciador, a leitura começa perfeitamente, pois somos instigados a formular uma solução para o problema e ficamos ansiosos para saber como cada escritor trabalhou a proposta apresentada pelas editoras.

Terra Brasilis – Gerson Lodi-Ribeiro:

Nessa história um fenômeno muito estranho na linha do tempo ocorreu no mundo, contudo no Brasil o efeito foi singular. Os protagonistas são um grupo de militares, daí poderíamos imaginar que algum grande conflito poderia ser travado, mas o que vemos é uma jornada rumo a um foco de esperança (sem mais informações para evitar spoiler). Durante o texto há trechos em inglês, os quais consegui compreender, entretanto acho que notas de rodapé deveriam ser usadas. O desfecho deixa muito a desejar. Histórias curtas, como é caso das presentes neste livro, devem criar ao menos um grande ponto de virada para realmente impactar o leitor, mas ao concluir a leitura deste conto fiquei com o pensamento: “E…?”. Não consegui me emocionar de alguma forma.

A Rapineira – André Zanki Cordenosi:

Aqui não temos tempo para respirar, uma mulher empreende uma missão, porém o terreno em que está situada é infestado de inimigos perigosos que não chegam a ser claramente definidos pela autora, mas a própria indefinição somada ao nome que é usado para designa-los (Predadores) é o suficiente para nos incutir com uma agonia que vai crescendo cada vez mais e só nas últimas páginas começa a ser aliviada. A protagonista também nos demonstra que o apocalipse tornou-a ainda mais “humana”, ampliando o seu senso de comunidade, após ver que para sobreviver seria indispensável unir-se em um grupo bem coordenado. Gostei como foi dosada a ação, suspense e drama.

Antigos – Duda Falcão:

Em “Antigos”, o conhecimento histórico é analisado como uma ferramenta de dominação. É do conhecimento de todos que a história normalmente é contada pelos vencedores, sendo a perspectiva dos derrotados conhecida somente mediante a exposição de alguém que trabalhe para nos trazê-la. O texto é dividido em cenas-ambientes, o que faz o leitor sentir-se ao lado do personagem principal que procura tomar ciência da sua origem e como o mundo atingiu o estado atual. Apesar de estarmos muito perto do protagonista, acabamos nos surpreendendo com uma revelação.

A Imagem do Homem – Carlos Relva:

O conto começa com um clima de paranoia, sustentando pela formulação de uma conspiração contra uma instituição responsável por regular a sociedade, porém o que vemos é somente um borrão do verdadeiro contexto, pois a parcialidade dos personagens que assumem o papel de interlocutores é absoluta e isso gera algumas surpresas. O título assume um sentido extraordinário quando conhecemos a verdade, mas antes disso não entrega sequer um pingo do que nos espera.

O Último Homem – Ademir Pascale:

Tudo começa demasiadamente simples, mas o autor consegue desenvolver bastante o personagem e até me surpreendeu. Era uma história para a qual não pensava que fosse bater palmas, talvez seja uma das que mais me surpreendeu, mas não necessariamente a que mais gostei. A história começa em um ponto do futuro e depois retrocedemos para elucidarmos as coisas. A narração pode parecer um pouco confusa, mas avalio essa desorientação como necessária para nos sentirmos na pela do personagem, com a leitura vocês poderão compreender melhor o que estou dizendo.

Projeto Olimpo – Paulo Fodra:

A mente de uma criança apresenta o esboço do projeto que visa salvar a humanidade ou pelo menos alguns representantes da espécie para que o planeta seja repovoado, esse é o estopim do texto do Paulo Fodra. Fico fascinado quando a ficção se torna um canal para suscitar um debate extremamente pertinente e durante essa leitura vi nos parágrafos uma reflexão sobre a grande importância que damos ao avanço tecnológico, mesmo que isso nos custe alguns anos da expectativa de vida ou prolongue, mas ainda nos jogando em um mundo com pouca qualidade. Obviamente o desenvolvimento de máquinas nos trouxeram várias maravilhas, mas elas por si mesmas de nada valem. O que confere valor à máquina é o uso que fazemos dela. O final me deixou boquiaberto, uma mensagem forte como um soco no estômago.

Para Viver na Barriga do Monstro – Roberto de Sousa Causo:

É mostrado como o sistema em que vivemos é baseado em uma estrutura frágil, extremamente necessitada de mecanismos que se falharem vão trazer consequências pavorosas. Realmente o conto é assustador por ser tão real, o temor dos personagens é algo plausível. É interessante citar a escolha da Amazônia como palco dessa narração, pois isso serve para nos apresentar a seguinte pergunta: O que é civilização? Constatamos que evidentemente não é sofisticação no modo de vida, uma vez que pessoas que se matam com armamentos de última geração por disputas mesquinhas não são um símbolo de evolução intelectual, ao menos a lógica nos grita que não. A minha única crítica é quanto ao uso de palavras em inglês, pois mesmo que eu entenda, outros leitores podem não compreender, mais uma vez, recomendaria o uso de notas de rodapé.

Os Filhos do Dragão – Sandro Quintana:

Nesse conto o autor retrata como os livros são importantes para a preservação da identidade de um povo. O que vemos é um ancião conduzindo um grupo de crianças por uma biblioteca para lhes falar sobre o tempo antes do avô do avô do seu avô, ou seja, é uma grande viagem ao passado, um tempo em que as coisas eram radicalmente diferentes, com um clima de épico. A imagem fantástica é construída magistralmente, o ancião faz as crianças silenciaram com as suas palavras ao redor de uma fogueira. Cheguei a ver o texto como uma grande poesia, realmente belo! No final das contas, descobri que eu sou um filho do dragão. O que seria isto? Vocês só irão descobrir quando lerem.

Reino – Josué Oliveira:

Nesse caso o apocalipse é comentando pela ótica de alguém que antes mesmo do grande evento já sabia o quanto a sociedade estava imersa em um culto ao efêmero, consumindo de forma desenfreada sem notar os sinais de que as coisas não estavam indo bem. Essa perspectiva lembrou-me do clássico cinematográfico de George A. Romero, “Madrugada dos Mortos”, em que os mortos-vivos são usados como uma metáfora para o consumismo. O protagonista, alguém que esteve sempre à margem da antiga sociedade, coloca-se como um Rei, visto que conhece a cidade como a si mesmo e a sente como parte de seu organismo, o que não deixa de ser verdade, uma vez que ele sempre pôde enxergar a face mais crua da selva de pedras. O final deixa espaço para especularmos sobre qual a real necessidade de uma figura central de autoridade para a conservação das sociedades.

O Dia em Que as Nuvens Caíram – Adriano Siqueira:

O conto é ágil, a explicação sobre o que trouxe a destruição, assim como todos os acontecimentos subsequentes, é breve, talvez deixando alguns leitores com vontade de que a história fosse mais desenvolvida. Acho que a ideia central poderia render um bom livro. O grande ponto alto é a nova leitura que o Adriano fez dos zumbis.

Irmãos do Espírito – Daniel Tréz:

Uma crítica ácida à cultura de controle massivo, dando ênfase na esfera religiosa. O autor não formula um parecer sobre as religiões, mas usa esse viés para expressar como a liberdade é muitas vezes sacrificada em nome de uma tranquilidade, dentro da qual a vida se torna infrutífera e as pessoas não possuem o direito à palavra, independente do cargo que ocupem. O final nos demonstra a falta de sentido no pensamento da guerra como instrumento para edificar a paz, algo recorrente em nosso próprio mundo em países imperialistas.

Deixando o Condado – Ana Lúcia Merege:

A referência a Tolkien vai além do título, mas não direi os detalhes para não estragar a leitura de vocês. Gosto de histórias com referências, mesmo que não sejam literárias, pois isto enriquece o texto e aumenta o entretenimento. Aqui, algumas pessoas manifestam o desejo de irem além do local em que estão refugiadas após o apocalipse a fim de descobrirem como a terra realmente está, contudo outras pessoas acham que isto pode representar um alto risco ao modo de vida de todo o grupo. O conto termina em aberto, deixando o leitor com a mesma emoção dos personagens acerca do futuro: um mar de sombras.

Sempre o Sol – João Rogaciano:

O conto é narrado em primeira pessoa e nele, como em alguns dos textos anteriores, o personagem principal conduz uma busca pela verdade, ação que pode lhe custar a vida. O legal é o sentido que tudo ganha com a revelação final, cheguei à conclusão de que de certa forma algumas pessoas vivem como na realidade imaginada nessas linhas.

O Retorno – Marcelo Bighati:

O Marcelo optou por realmente trabalhar a profecia Maia em seu texto e trás um excelente conto de ficção científica, a sensação que tive é que a história poderia ficar ainda melhor, caso o autor dispusesse de mais espaço para explorar a trama, mas o final não decepciona. A conclusão encontra respaldo na realidade, pois quantas vezes não vemos ações benéficas serem retribuídas com barbáries? Sim, meu objetivo é lhes despertar a curiosidade pela obra, portanto não darei mais informações.

Mariana – Tibor Moricz:

Esse foi o conto que mais gostei porque o autor trata a ideia do apocalipse muito diferente do que as demais histórias fizeram, não que isto seja motivo para desmerecimento do trabalho dos outros escritores, mas já é um diferencial que me cativou e a qualidade da escrita é excelente. Nesse caso, um homem vive um fim do mundo particular, a sua vida é completamente amarga, sem alento, ou seja, antes mesmo do mundo ruir, o protagonista vive em desolação e o advento do apocalipse surte um efeito contrário ao que costumamos ver em histórias escatológicas, pois o fim do mundo ao seu redor faz com que ele se impulsione para ir obter aquilo que até então ignorou.

O posfácio fecha a antologia comentando como o tema da antologia sempre cativou o ser humano e vai continuar despertando reflexões, seja pela trilha da espiritualidade ou ciência, afinal o nosso próprio fim é algo com o qual todos vão ter de lidar, não importa cor, etnia, sexo, convicções etc. A morte, afinal, é uma grande expressão da nossa igualdade.

Gostei do trabalho gráfico, os poucos erros de revisão e diagramação que encontrei não chegam a afetar a leitura, tornando-os motivos para críticas, as páginas pretas que vem antes de cada conto funcionam como representações das trevas associadas ao fim do mundo, mas a escuridão é seguida pela luz de um novo começo (as páginas com as histórias). O tom amarelado das páginas é agradável aos olhos e as bios ao final de cada conto são legais, pois os leitores sabem os meios para entrar em contato com os escritores ou se eles possuem outros trabalhos publicados. Recomendo este livro e dou quatro selos cabulosos!
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Leitora Viciada 09/08/2012

Apesar de existirem falhas na revisão e diagramação bem pequenas, devo elogiar o livro como um todo, analisando sua qualidade gráfica. Fonte no tamanho ideal e cor da página perfeita para a leitura, embora as margens sejam um pouco estreitas. Todos os escritores possuem uma mini biografia ao término de seu conto e a primeira página de cada um ser de fundo preto deixa o livro interessante.
As orelhas são de bom tamanho com informações sobre o livro e antes do prefácio existe um sumário.
Elogio muito a capa, que ao vivo é mais rica e detalhada que pela internet. Ela não é apenas preta e cinza, dá a sensação de possuir um levíssimo prateado conforme a luz incide na capa, que é de brilho, não fosca.

O prefácio é um resumo sobre como civilizações gigantescas antigas já ruíram e pouco se sabe sobre a maioria delas. Cesar Silva escreveu uma ótima introdução ao tema e a melhor parte, sem dúvidas, é uma breve história do assunto abordado na ficção contemporânea.

O primeiro conto é excelente e um dos melhores, apesar de pequenas falhas: expressões militares que podem parecer confusas ao leitor e frases em inglês. Embora seja um inglês muito simples, sempre acho que todo livro precisa traduzir expressões, palavras ou frases em idiomas que não seja o próprio.
Em Terra Brasilis, Gerson Lodi-Ribeiro mostra uma Terra pós-apocalíptica onde aparentemente existe apenas o Brasil. Será a mesma Terra ou uma realidade alternativa? O Brasil foi transportado para outra dimensão? Para onde foram as outras nações?
Mistérios a parte, o autor detalha uma fauna e flora exótica, façanha enriquecedora da história. A narrativa é o destaque do conto, que de certo modo me lembrou os filmes de Tropa de Elite. Interessante também a motivação política do Governo brasileiro em colonizar o restante do mundo e ser único e soberano, sem a preocupação de se descobrir exatamente o que ocorreu com o mundo.
Um conto ótimo que classifico como noveleta, por ser um pouco mais longo. Poderia gerar um excelente livro no estilo de algumas ficções escritas por Michael Crichton, porém com ares nacionais. Gostaria de ver mais intrigas apresentadas e mais descobertas.

A. Z. Cordenonsi escreveu um conto que é ao mesmo tempo de ação e de suspense, com leve carga dramática no final. Uma história que mais parece um filme, de tão bem descritas as cenas, quase todas de ação e que deixam o leitor aflito. A Rapineira possui uma narrativa frenética e cheia de perigo sofrido pela protagonista.
Uma Porto Alegre devastada, onde bons cidadãos tentam sobreviver em meio a ataques de saqueadores violentos de várias fações. A protagonista é empolgante, motivada e admirável. Torci por ela a cada instante. Uma heroína comovente e corajosa num conto muito bom!
Além disso, o motivo que assolou nosso mundo é simples, fatal e interessante e o autor deixa o leitor envergonhado em como a vida hoje em dia é fácil e prática e as pessoas acomodadas, comparando à esta história.

Assim como todos os contos e noveletas que me recordo de ter lido do Duda Falcão, este também possui uma estrutura planejada, com o conto dividido em partes.
Em Antigos, após a extinção dos humanos descobrimos um mundo onde outra espécie descendente da nossa que herdou inteligência humana e procura desvendar o passado.
Muito criativa a escolha e o desenvolvimento desse novo mundo e suas características. Chocante em alguns aspectos, pois ao mesmo tempo são tão diferentes e tão parecidos conosco!
Gostei em como passa a mensagem de que cultura, busca por conhecimento e dúvidas são mais importantes que a força bruta. Como o conceito de ser humano é relativo; o importante é ser racional.
Apenas resumiria a parte explicativa; ela é essencial, mas eu a encurtaria um pouco e estenderia a parte da ação, mais ao final, que foi curta demais. Acho que a intenção foi certamente a de causar esse impacto, mas o conto termina deixando o leitor pensando que deseja um "algo mais", embora todas as peças tenham se encaixado e eu adorado o texto.

A Imagem do Homem é um bom conto que mistura suspense e Ficção Científica. Ótimo para leitores que gostam de conspirações, intrigas e para fãs de histórias no estilo clássico do Isaac Asimov, que utilizava da Ciência e da Robótica para instigar o homem na busca por si mesmo e diversas outras questões existenciais e sociais. Encontrei ainda referência a futuros distópicos famosos, sendo o principal do filme Matrix. A filosofia de tentar quebrar a barreira ilusionaria que comanda a sociedade, de se rebelar sobre a nova vida existente.
Por trás de um aparente conto pós-apocalíptico simples, Carlos Relva incluiu todos esses fatores de forma natural e original. Porque sim, ele recria itens antes já utilizados num texto próprio e criativo.

Em seguida vem o conto O Último Homem, o que menos gostei na antologia. Escrito por Ademir Pascale, a extinção não é original. Também não gostei da estrutura do texto, que começa no presente, volta ao passado para finalmente retornar ao clímax e final da história. Porém, manobra realizada de uma forma um pouco confusa. O que deveria ser interessante, contar a história do protagonista, acaba fazendo a história perder quase que completamente o foco principal, o "fim" do mundo.
E como cientistas os cientistas erraram tão grotescamente no cálculo?
Apesar dessas falhas e do erro de falar diretamente com o leitor sem existir essa necessidade, a narrativa não deixa de ser fluida e a temática da antologia foi respeitada em sua abordagem, mesmo que o autor tenha fugido um pouco.

Em oposto a isso, Paulo Fodra possui um texto direto e mostra de forma ágil apenas o essencial ao enredo, sem se perder em temas secundários. Admiro isso num conto, o foco no tema principal. Detalhes desnecessários devem ser retirados para deixar o texto enxuto e cada página muito bem aproveitada, como em Projeto Olimpo.
Curto, forte e impactante, me fez gostar também da abordagem do tema pós-apocalíptico, com tanto planejamento humano, tanta precaução e tanta busca por soluções satisfatórias para o legado humano não desaparecer através da escolha dos sobreviventes. Final excelente!

Para Viver na Barriga do Monstro é um conto excelente, porque além da narrativa eletrizante, transmite uma sensação de realidade ao leitor, uma Terceira Guerra Mundial que poderia ocorrer. E mesmo sendo um conto, Roberto de Sousa Causo estruturou personagens, criou romance, rivalidades e intrigas.
Na verdade é o início do fim do mundo. Outro fator positivo do conto é o cenário ser o coração da Amazônia, fazendo o leitor receber as notícias de um ângulo um pouco diferente do qual estamos acostumados a ver, pois geralmente as catástrofes são centralizadas nos centros urbanos grandes.
O autor faz duras críticas sobre a Política mundial atual e não deixa o leitor se esquecer de que alguns povos são sobreviventes a antigos desastres, no caso o destaque aqui fica para as populações indígenas latino-americanas.
Novamente critico na antologia: palavras em outros idiomas, em inglês e não traduzidas. Acho que o leitor nunca é obrigado a procurar traduzir o texto; por mais baixo que seja o nível de conhecimento necessário, deve-se sempre traduzir.
Gostei do realismo e das atitudes do protagonista.

Os Filhos do Dragão possui um tema semelhante ao de Antigos, porém o desenvolvimento de Sandro Quintana é completamente diferente. Aqui uma biblioteca é transformada em Santuário e os livros em relíquias. O conhecimento contido é tratado como fonte incomparável de poder.
A evolução trouxe poderes físicos, uma espécie diferente, um novo mundo. Um futuro muito a frente após o apocalipse sofrido pela Humanidade.
Um ancião, que me ficou na cabeça com uma imagem semelhante ao de Mestre Yoda de Star Wars conta às crianças o que ocorreu ao mundo.
Com narrativa poética e fantasiosa, mesclando lendas à acontecimentos reais - como costumam ser passadas informações de milhares de anos.
Um conto objetivo, interessante e cheio de fantasia e mitologia própria. Poderia gerar um bom livro juvenil recheado de aventuras míticas.

Com narrativa corrida e sem desperdício de palavras, Josué Oliveira consegue descrever os acontecimentos da cidade em ruínas, a breve história do protagonista e a introdução de personagens invasores, alguns vítimas, outros assassinos e torturadores. Aos olhos do protagonista, todos são invasores, esse é um fator interessante.
Em Reino, tudo está muito bem apresentado e tecido. Um texto que não se perde em explicações excessivas ou enfeites; Faz do uso da ação para mostrar o que ocorreu no apocalipse imaginado pelo autor.
Uma crítica às ditaduras, líderes egoístas e tiranos.

A história mais criativa do livro em minha opinião e O Dia em Que As Nuvens Caíram, do Adriano Siqueira. Talvez seja uma das mais diferentes versões diferentes envolvendo zumbis e histórias pós-apocalípticas.
Não posso detalhar o porquê de eu achar o conto tão original para não entregar fatores essenciais para a surpresa.
O texto é leve, divertido (mas não engraçado) e muito fluido. Talvez tudo ocorra um pouco rapidamente, mas acho que é proposital, já que é uma versão bizarra e o autor não desgasta a história com muitos argumentos e explicações; Conta somente o necessário e desenvolve uma história agradável, descolada e diferente.

Daniel Tréz não explica que tipo de apocalipse o mundo sofreu, focando na história dos sobreviventes e na liderança de dois deles, que se tornaram amigos.
A narrativa é contada por deles, líder de uma religião nascida após o "fim do mundo", em forma de confissão. Ele desabafa todos os erros e pecados, principalmente em como ele e seu amigo governaram esse novo mundo, como se aproveitaram da fé deles para serem os líderes dos sobreviventes.
Irmãos de Espírito é um conto dramático e polêmico e uma prova de que religião não deveria se misturar com política e que o poder corrompe facilmente as pessoas.

Deixando O Condado já começa acertando positivamente no curioso e criativo título. Encontrei também diversos fatores interessantes no conto além de referências aos Hobbits. Alguns leitores podem achar que existem personagens demais para um conto, mas Ana Lúcia Merege soube equilibrar seu uso sem deixar o leitor perdido; Ouso dizer que na verdade ela utilizou esse detalhe a favor do texto.
Os sobreviventes da catástrofe, todos socados em bunkers numa região montanhosa da Espanha, comemoram um ano de sobrevivência.
O conto me fez resgatar uma matéria sobre bunkers reais na revista Superinteressante, e a história me envolveu completamente!
Os relacionamentos humanos foram explorados ao extremo, em situações onde a sobrevivência do indivíduo pode prevalecer sobre a do grupo, ou vice-versa. Além da tensão psicológica gerada, a autora parte para a ação e pesado clímax e final cheio de ansiedade e por isso, considero este o melhor conto do livro.
Uma continuação seria uma boa. Poderia gerar uma série de contos.

Mais um conto incrível! E assim como o conto anterior, Sempre O Sol também mostra os sobreviventes vivendo no subsolo, porém aqui, nada foi planejado e a luz do dia e o céu, nunca mais foram vistos por eles.
João Rogaciano, além de revelar ao leitor a história de vida do protagonista de forma rápida, utiliza esta para nos cativar do início ao fim, principalmente no clímax da história, quando ele encontrar um rapaz.
Gostei do conto, faz críticas ao autoritarismo e também ao conformismo perante ele e outras coisas.
Adorei a forma como o desastre o correu e suas enormes consequências. A introspecção do comovente protagonista é especial, ainda mais quando ele faz grandes descobertas, que geram mais reflexões sobre si, a Humanidade e a vida.
No entanto, ao explicar como vive a sociedade subterrânea, numa nova era do vapor, faltou explicar sobre a alimentação das pessoas. Por mais cadavéricas e magríssimas elas devem ter alguma fonte de nutrição que não foi mostrada pelo autor.
E deveriam, aponto novamente essa pequena falha na antologia, ter traduzido o texto em inglês, mesmo sendo apenas uma introdução e não parte essencial do texto.

E finalmente chega um conto que aborda a profecia maia, que marca o dia 21 de dezembro. Pelo menos um dos autores seguiu esta hipótese e criou o conto mais fantástico, incrível e ao mesmo tempo confuso da antologia: O Retorno. São informações demais para um conto, que mesmo assim, é excelente.
Marcelo Bighetti utiliza a mudança de ciclo prevista pelo sistema de calendários maia, unindo povos, espaço e linha temporal numa ótima aventura fantasiosa.
Aconselho uma breve pesquisa sobre um dos calendários que eram utilizados pelos maias, o Tzolkin - o tempo seria a quarta dimensão e não linear; seria uma espiral.
Gostei das mudanças de ponto de vista, o autor mostra a de um povo, e depois reconta sob a visão do outro. São muitos fatos num só conto e por isso me perdi, mesmo gostando dele de uma forma geral.

O último conto é intitulado Mariana. Um conto que se centra mais nas angústias, frustrações e desejos do protagonista. Psicologicamente ele está sofrendo e perdido.
Após o fim do mundo, que eu interpretei como no sentido figurado e não literal, o leitor acompanha através de atos e pensamentos, um cidadão comum e solitário em busca de um recomeço. Uma busca pessoal.
O protagonista percebe o quanto a nossa sociedade é supérflua e nem sempre as pessoas notam e valorizam o que realmente é importante. Serão necessárias catástrofes para cada um aprender essa lição? Será que o ser humano precisa sempre passar por um desastre ou problema gravíssimo para ter coragem de remodelar a própria vida?
Não sei exatamente a intenção de Tibor Moricz ao contar esta história, mas vi através do sentido figurado do fim do mundo, o recomeço de uma vida de uma pessoa antes conformada, fraca e infeliz numa pessoa que ao menos está em busca de superação.

O livro termina com um curto posfácio escrito pelos organizadores que juntamente com cada conto lido deixa a cabeça do leitor com mil reflexões.

O tema do livro é algo intrigante, não tem como o ser humano não pensar numa grande catástrofe global que seja capaz de exterminar, ou quase, a nossa espécie. Não importa a cultura, nacionalidade, classe social, religião ou credo (ou nenhum) para que se imagine esse tipo de situação.
Até os mais incrédulos presenciam a fúria da natureza com maremotos, tsunamis, terremotos, vulcões, chuvas exageradas, nevascas inexplicáveis, seca total ou seja, mudança e inconstância climática em todo o planeta. A camada de ozônio se rompendo, se enfraquecendo, fauna e flora sofrendo mutações e extinções, as calotas polares diminuindo, o mundo à beira de vários colapsos (econômico, político, energético).
Guerras, disputas, crises financeiras. Intolerância racial, sexual ou religiosa. Vírus e bactérias potentes e silenciosas. Rumores de asteroides ou tempestade solar arrasadora, até mesmo de invasões alienígenas.
O medo e a criatividade Humana não possuem limites nem teorias, sejam científicas, religiosas ou esotéricas.

E esse assunto não é atual. Durante épocas passadas, o homem sempre olhou para as estrelas, para os oceanos, para o interior da Terra, para o passado; sempre buscou por respostas dentro de si ou em suas crenças e descrenças. Entre lendas, hipóteses e História, temos diversos exemplos de situações em que espécies ou civilizações inteiras desapareceram.
Atlântida, o principal mito que representa o fim catastrófico de uma civilização. Períodos conturbados da História que fizeram os humanos acreditarem no fim do mundo, como foi a peste negra na Europa no século XIV, que dizimou aproximadamente um terço da população da época, ou períodos de grandes guerras como a 1ª e 2ª grandes Guerras Mundiais na primeira metade do século XX, a Guerra Fria que surgiu em seguida e se estendeu por décadas quando todos viviam com medo de uma eminente guerra nuclear ou a Guerra ao Terror nascida no século XXI após os ataques de 11 de setembro no Estados Unidos.

Isso tudo que escrevi nem parece pertencer à resenha, mas é impossível terminar a leitura do livro sem ficar com várias perguntas na cabeça. Não tem como pensar no coletivo, no que realmente é importante e num equilíbrio ecológico. Não tem como relembrar filmes e livros que já abordaram esse assunto e me sentir pequena e inútil caso o fim do mundo realmente ocorresse.
A cada guerra ou desgraça, pensamos no futuro da Humanidade. A catástrofe natural ou por falha humana, nos perguntamos até onde nós iremos. Se um ciclo pode estar chegando ao fim para um novo recomeçar e renovar o planeta, como acreditavam os maias, datando esse acontecimento para 21 de dezembro de 2012.

O mais interessante de 2013 - no Um, é que não se trata exatamente de um livro sobre o fim do mundo. Não exatamente em como tudo ocorre. O livro deu total liberdade para que os autores abusassem da criatividade e escrevessem sobre um futuro pós-apocalíptico. O que aconteceria? Como estariam os sobreviventes? Como a Terra continuaria, mesmo após os humanos sofrerem quase uma extinção?
As teorias e contos são variados e de uma forma geral são classificados por mim do bom ao excelente, apenas um não me agradou.

O livro deixa também reflexões sobre como passamos por situações onde o mundo parece acabar somente para nós. Quando passamos por um momento traumatizante, angustiante, complicado e todo o resto do mundo não se importa; a vida continua naturalmente. É o nosso apocalipse interior. Todo mundo passa por alguns momentos assim na vida, mais cedo ou mais tarde e precisa buscar seu recomeço.
Ao contrário, às vezes vemos na mídia uma notícia de catástrofe, pode ser um desabamento de um prédio, um tsunami, uma guerrilha e pensamos em como vários mundos podem ter terminado com aquela situação. Em como muitas pessoas tiveram seus mundos desmoronados e nós estamos com o nosso cotidiano imutável e intacto, exceto por notícias que vemos na televisão, na internet... afinal, sobreviver a uma tragédia é diferente de observá-la.

Contos que mais gostei: Terra-Brasilis, A Rapineira, Para Viver na Barriga do Monstro e Deixando O Condado.
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Andarilho® 28/07/2012

O mundo acabou, e agora?
E se o calendário maia, as previsões de Nostradamus, as teorias mais catastróficas estiverem todas corretas? E se o fim estiver próximo? E depois?

Neste livro, quinze autores expõem sua visão do fim do mundo e como sobreviveremos à ele. Não são histórias sobre o fim, mas sobre novos começos.

Mesmo sendo suspeito, como um dos autores, achei a maioria dos contos indo do bom ao excelente, com apenas um conto caindo na categoria "não gostei".

O livro abre com o prefácio de César Silva que apresenta muito bem a proposta do livro, demonstrando que se trata não de um livro sobre o desespero do fim, mas sobre a esperança de novos começos.

O primeiro conto, Terra Brasilis, traz a versão mais original de "fim do mundo" do livro inteiro. Gerson Lodi-Ribeiro nos conduz por uma expedição na selva que se tornou o mundo de forma primorosa, deixando com a impressão de que o conto é, na verdade, o início de uma história maior (bem adequado com a premissa da antologia). Única falha é não ter traduções para os termos militares e em outra língua, o que dificultou um pouco o fluir da história.

Logo depois somos lançados em uma história de ação em A Rapineira de A.Z. Cordenonsi. O autor sabe como descrever cenas de ação de forma que a sensação é de estarmos assistindo um filme e não lendo um livro. Destaque para o questionamento quanto ao valores em um mundo onde as facilidades modernas se foram.

Fiquei um pouco incomodado com Antigos, de Duda Falcão, devido as semelhanças com meu próprio conto, mas a temática dele é bem diferente, apesar dos elementos em comum. Gostei do foco na continuidade da humanidade como conceito mais do que como raça.

A Imagem do Homem, de Carlos Relva, foi um dos contos que mais gostei. Com uma clara referência à "Matrix" o autor constrói um questionamento interessante sobre o que é ser humano e sobre o nosso sistema social. Difícil falar mais alguma coisa sem entregar a história.

Em contrapartida, O Último Homem, de Ademir Pascale, foi o conto que menos gostei, aliás foi o único conto de que não gostei em toda a antologia. A história simplesmente não se encaixa, começa várias vertentes sem terminar nenhuma. Única coisa que eu gostei foi do final.

Projeto Olimpo de Paulo Fodra é bem interessante ao manter uma história o tempo todo em figura e no final mostrar uma outra história por trás desta. Só senti falta de mais passagens com as interações entre os "deuses" para explorar melhor suas relações, o que tornaria o final ainda mais surpreendente do que já é.

Em Para Viver na Barriga do Monstro, Roberto de Souza Causo nos tráz um olhar sobre o impacto do fim do mundo fora das grandes cidades, fazendo um contraste entre o olhar moderno do fim como algo terrível e o olhar antigo do fim como parte de um ciclo.

O conto seguinte, Os Filhos do Dragão, é muito bom, fantástico e escrito por um autor maravilhoso que vai fazer mais sucesso que o Paulo Coelho. Brincadeira! Não vou avaliar o meu próprio conto, deixo isso para vocês. Quem quiser ler uma degustação veja aqui.

Reino, de Josué Oliveira, traz novamente a temática da sobrevivência com um toque de crítica social. Só não gostei do final por considerá-lo um pouco forçado, já que o elemento que conduziu ao final me causou estranheza por ser algo que não encaixa com a postura do protagonista ao longo do resto da história.

Outro conto com um fim do mundo diferente é O Dia em que as Nuvens Caíram, de Adriano Siqueira, ou seria melhor dizer que é uma forma diferente de apresentar um tema comum, o apocalipse zumbi. só senti falta de um pouco mais de amarração entre as cenas, o conto é um pouco rápido demais, pulando de uma cena para a outra de forma tão vertiginosa que precisei reler alguns trechos para entender "onde" estava. Fora isso, o conto é muito bom e também causa a sensação de ser o início de uma história maior.

Daniel Tréz fez um conto bem polêmico em Irmãos do Espírito, onde o líder de uma seita religiosa que comanda a nova sociedade humana faz um desabafo em seu leito de morte. A história é basicamente uma forte crítica social ao pensamento dogmático e seu final fecha com chave de ouro a temática.

Já tinha ouvido falar de Ana Lúcia Merege e seu romance O Castelo das Águias, e foi com certa expectativa que li o seu conto Deixando o Condado. Expectativas mais do que correspondidas, superadas até! Sendo um dos contos que mais gostei da antologia. Sua visão das relações humanas em uma situação de sobrevivência extrema é uma excelente reflexão. Mais um conto que me deixou curioso quanto ao que acontece depois, fica a proposta para a autora de um dia escrever uma continuação, talvez um ano depois com Octavio e Laura retornando ao condado.

Outro conto que explora as relações humanas ao extremo é Sempre o Sol de João Rogaciano, mas aqui não vemos a tensão inter-psíquica do conto anterior, mas uma tensão intra-psíquica onde o protagonista divaga sobre a sua própria transformação diante das mudanças do mundo. Adorei a forma em que o "fim do mundo" se apresenta no final da história.

Curiosamente O Retorno de Marcelo Bighetti é o único conto da antologia a colher inspiração diretamente do mito sobre o calendário maia, apresentando duas histórias paralelas, uma no presente e outra no passado, que por fim se encontram. Não sei muito bem o que opinar sobre essa história, não é que eu não tenha gostado, eu gostei, mas fiquei com a impressão de que faltou "algo", e eu não sei bem o que. Ou talvez eu esparasse um final diferente do que foi apresentado, apenas isso.

Mariana, de Tibor Moricz, fecha a antologia com uma história de recomeços diante das destruições, mostrando o conceito que foi o foco do projeto como um todo, a resiliência do ser humano, nossa capacidade de nos reconstruirmos diante dos abalos, criando novos sentidos para o mundo ao nosso redor, mesmo quando esse mundo desmorona.

O Pósfácio dos organizadores Alícia Azevedo e Daniel Borba fecha o livro discorrendo sobre a temática do homem diante da finitude, novamente trazendo a tona a questão central da antologia "O que acontece depois do fim?"

O livro é primoroso, tanto em seus autores quanto em sua apresentação, e eu espero ansioso por novas chances de trabalhar com a editora ornitorrinco e de compartilhar espaço novamente com muitos companheiros de caneta que participaram deste projeto comigo.

Contos que mais gostei: Terra Brasilis, Deixando o Condado e A Imagem do Homem.

http://andarilhor.blogspot.com.br/2012/07/resenha-2013-ano-um-varios-autores.html
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