Cemitério de pianos

Cemitério de pianos José Luis Peixoto




Resenhas - Cemitério de Pianos


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DIRCE 01/10/2011

Histórias de Francisco contadas por Franciscos.
Depois de ter lido 2 livros de JLP ( Nenhum Olhar e Uma Casa na Escuridão), iniciei a leitura desse livro me perguntando o que ele me reservaria.
Sem muita surpresa me deparei com "ela" : com a dificuldade da leitura .
Digo sem muita surpresa porque "ela" ( a dificuldade) se fez presente nos 2 livros de JLP lidos anteriormente, ainda que, em Cemitérios de Pianos, a causa não tenha sido as metáforas predominantes nos livros Nenhum Olhar e Uma Casa na Escuridão.
O que tornou a leitura difícil foi que as vozes:as dos Franciscos, se intercalam de maneira abrupta ( perdi a conta das vezes que tive retornar às páginas anteriores) e as palavras suspensas no ar.
Mas não encontrei somente dificuldade em Cemitério de Pianos, encontrei também uma história que poderia até ser considerada feia, uma vez que ela é recheada de traição, de adultério, de violência doméstica , de confronto entre pai e filho, de desafetos, de sonhos esvaecidos e de perdas, não fosse a habilidade e a sensibilidade de JLP de tranformar desencanto em encanto.
Uma história que se desenrola a partir do seio familiar de uma família de artesões de Benfica/ Lisboa em data longínqua – uma história sob a visão de 3 Franciscos, narrada por 3 Franciscos: pai, filho e neto, mas que poderia ser a história atual de um coletivo de Francisco, daqui do nosso país, ou de qualquer outra parte do mundo. Histórias de homens rudes, que só se permitem gestos afetuosos e amorosos, enquanto namorados, ou em relações extraconjugais.
A morte é um tema recorrente nas obras de JLP, e é com ela que o livro se inicia, porém, desta feita, de mãos entrelaçadas com a vida o que dá um sentido de continuidade, de repetição.
As teclas danificadas dos pianos que são utilizadas no reparo de outros pianos, o olho cego de Simão, também sugerem que o curso da vida segue em frente, sempre, sempre se repetindo.
Uma coisa que muito agradou no livro foi que, diferentemente, de Nenhum Olhar e Uma Casa na Escuridão, que contam com um final atemorizante, Cemitério de Pianos termina sugerindo que, apesar das repetições muitas vezes dramáticas e desoladoras, existe a possibilidade de se entrever a esperança.
Esse é um livro que vai para os meus favoritos. Por quê? Pelo simples fato de ser um livro que emociona, de ser um livro que não terminou com o término da leitura: como um sonâmbula eu revia os Franciscos, o tio com um olho cego, as mulheres dos Franciscos, Marta, Maria, Simão, Eliza, Hermes, Irís, feridas cicatrizadas e o filho do Francisco a nascer.
Pelo simples fato de que, como uma serpente é encantada pelo musicalidade de uma flauta, eu fui encantada pela musicalidade entoada pela escrita de José Luiz Peixoto.
Paula 15/07/2012minha estante
Parabéns pela resenha muito bem escrita!
Botei-o na minha estante junto com Uma casa na escuridão, que pretendo ler esta semana ainda.
Beijos


Manuella_3 23/08/2012minha estante
É admirável a sua sensibilidade de resenhar... e de explicar a dificuldade de ler este autor intenso, profundo, dramático. Fiquei curiosa. Que sentimentos despertará JLP em mim? Não tenho esse eu lírico, fico confusa mesmo... Preciso sentar com calma pra ler mais esta obra. Pronto: mais um na minha intermináfel estante.




Marino 08/02/2010

A jornada de Lázaro

O maratonista Francisco Lázaro entrou duas vezes para a história das Olimpíadas. Ele fez parte da primeira delegação portuguesa a participar dos jogos, em 1912, na Suécia, e foi o primeiro atleta a morrer durante uma prova, a 14 de julho daquele ano, depois de correr 30 quilômetros. Lenda do esporte luso, Francisco Lázaro é também personagem de um romance surpreendente, publicado pela Editora Record: "Cemitério de pianos", do português José Luís Peixoto.

Lázaro é o personagem central de uma narrativa repleta de dramas, tragédias, pequenas alegrias e aqueles segredos que as famílias costumam ocultar sob o manto das aparências. Mas não se trata de uma biografia. Peixoto inspirou-se nesse personagem denso, mas do qual pouco se sabe, para criar um outro personagem, fruto das circunstâncias da ficção. Manejando as ferramentas da literatura com enorme precisão, Peixoto se dá essa e outras liberdades e revela que a sedução do texto não está necessariamente na economia de palavras, mas no bom uso delas.

"Cemitério de pianos" é resultado de uma refinada ourivesaria. O romance é narrado por três homens da família, de três gerações diferentes, cujas vozes eventualmente se confundem ou se cruzam. Embora falem em primeira pessoa, às vezes adquirem onisciência, relatando o que não presenciam, e nem a morte é capaz de calá-los. Suas falas se misturam às de personagens solitários e ecoam em ambientes escuros, eventualmente iluminados por um sorriso tímido. O texto é dividido em blocos, e as vozes se alternam entre um bloco e outro, de forma que o leitor precisa ficar atento aos pequenos detalhes, que Peixoto lhe oferece, pouco a pouco, no interior das frases. A história ganha sentido à medida que as peças se encaixam. Montar esse quebra-cabeças é um dos fascínios da leitura.

A maior parte dos personagens não tem nome, mas apenas caracterização — são referidos como "meu tio", "minha mulher", "o marido de minha filha", etc. Oito personagens são nomeados, os quatro filhos e os quatro netos do primeiro narrador, núcleo da família e do próprio romance. Um dos filhos, e também um dos narradores, é Francisco Lázaro. Os personagens-narradores são marceneiros, e a oficina onde exercem sua atividade passa de pai para filho, o que confere uma aura de imutabilidade ao fluxo da história, a não ser quando um fato trágico ocorre e quebra o clima.

Técnica apurada

Dentro da marcenaria fica o cemitério de pianos do título, e em torno dele e dos mistérios que o envolvem a família se pereniza. É como se houvesse uma melodia conduzindo e embalando história e linguagem, feita de música e poesia. Além de romancista, José Luís Peixoto é poeta, o que se revela na forma como constrói a narrativa, palavra a palavra. Os recursos de linguagem evidenciam uma técnica apurada, e dificilmente funcionariam na mão de artesão menos talentoso. O texto ganha dramaticidade com a repetição de frases e expressões, e o farto uso de dois pontos em alguns trechos traz fluência e emoção.

Peixoto nasceu em Galveias, norte alentejano, em 1974. Seus romances foram publicados na França, Itália, Bulgária, Turquia, Finlândia, Holanda, Espanha, República Checa, Croácia e Bielo-Rússia, além do Brasil. Ele já esteve várias vezes na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) e costuma incluir elementos da cultura brasileira nos livros que escreve.

O escritor já publicou sete livros de ficção e três de poesia. No Brasil, a editora Agir lançou, em 2001, "Nenhum Olhar", prêmio Literário José Saramago, instituído em 1998 pela Fundação Círculo de Leitores, de Portugal, e destinado a autores com idade inferior a 35 anos. "Cemitério de pianos" oferece ao leitor brasileiro a oportunidade de contato com um dos mais talentosos nomes da nova geração da literatura portuguesa. Não seria má idéia publicar aqui também seus livros de poesia.

[resenha publicada no jornal Correio Braziliense]
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