Cemitério de pianos

Cemitério de pianos José Luis Peixoto




Resenhas - Cemitério de Pianos


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Pandora 14/06/2017

Um autor excepcional, uma narrativa difícil e maravilhosa com total domínio da linguagem; tramas familiares, piano e música e uma torrente de sensibilidade: assim é "Cemitério de Pianos".

A história é contada por três Franciscos: avô, pai e neto, todos marceneiros no pequeno negócio da família. Mas engana-se quem espera uma narrativa linear tradicional: o livro é um caleidoscópio, um quebra-cabeça cuja imagem só se percebe quando quase todo ele está montado; antes disso, tentar entender as histórias dos Franciscos é como tentar encaixar as peças a espaços aos quais não pertencem.

Para quem quer se situar antes de ler este livro, recomendo que veja a Nota do Autor na última página; eu, como entrei às cegas na narrativa, tive uma certa dificuldade em reconhecer os Franciscos, além de escolher situá-los na época que melhor me aprouve. Porém, se optar pelo caminho do desconhecimento, mais tortuoso, esta também é uma saída interessante.

Tenho vontade de ler tudo o que José Luís Peixoto escreve? mas confesso que tive medo ao saber que este "Cemitério de Pianos" é muito leve se comparado a "Nenhum Olhar" e "Uma casa na escuridão". Porém sei que este medo não será maior do que a minha necessidade de me envolver novamente na escrita deste autor ímpar.

Deixo aqui um poema do autor citado no livro e que, coincidentemente, é um dos meus poemas preferidos:

"na hora de pôr a mesa, éramos cinco:
o meu pai, a minha mãe, as minhas irmãs
e eu. depois, a minha irmã mais velha
casou-se. depois, a minha irmã mais nova
casou-se. depois, o meu pai morreu. hoje,
na hora de pôr a mesa, somos cinco,
menos a minha irmã mais velha que está
na casa dela, menos a minha irmã mais
nova que está na casa dela, menos o meu
pai, menos a minha mãe viúva. cada um
deles é um lugar vazio nesta mesa onde
como sozinho. mas irão estar sempre aqui.
na hora de pôr a mesa, seremos sempre cinco.
enquanto um de nós estiver vivo, seremos
sempre cinco"
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fsamanta (@sam_leitora) 09/06/2013

Ler um caleidoscópio: é isso experimentar este livro. E é realmente uma experiência porque os acontecimentos dessa família calam fundo e o leitor se pega torcendo (inutilmente) para que aquele pressentimento do inevitável não se confirme. Mas é o fado, é a vida.
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Marino 08/02/2010

A jornada de Lázaro

O maratonista Francisco Lázaro entrou duas vezes para a história das Olimpíadas. Ele fez parte da primeira delegação portuguesa a participar dos jogos, em 1912, na Suécia, e foi o primeiro atleta a morrer durante uma prova, a 14 de julho daquele ano, depois de correr 30 quilômetros. Lenda do esporte luso, Francisco Lázaro é também personagem de um romance surpreendente, publicado pela Editora Record: "Cemitério de pianos", do português José Luís Peixoto.

Lázaro é o personagem central de uma narrativa repleta de dramas, tragédias, pequenas alegrias e aqueles segredos que as famílias costumam ocultar sob o manto das aparências. Mas não se trata de uma biografia. Peixoto inspirou-se nesse personagem denso, mas do qual pouco se sabe, para criar um outro personagem, fruto das circunstâncias da ficção. Manejando as ferramentas da literatura com enorme precisão, Peixoto se dá essa e outras liberdades e revela que a sedução do texto não está necessariamente na economia de palavras, mas no bom uso delas.

"Cemitério de pianos" é resultado de uma refinada ourivesaria. O romance é narrado por três homens da família, de três gerações diferentes, cujas vozes eventualmente se confundem ou se cruzam. Embora falem em primeira pessoa, às vezes adquirem onisciência, relatando o que não presenciam, e nem a morte é capaz de calá-los. Suas falas se misturam às de personagens solitários e ecoam em ambientes escuros, eventualmente iluminados por um sorriso tímido. O texto é dividido em blocos, e as vozes se alternam entre um bloco e outro, de forma que o leitor precisa ficar atento aos pequenos detalhes, que Peixoto lhe oferece, pouco a pouco, no interior das frases. A história ganha sentido à medida que as peças se encaixam. Montar esse quebra-cabeças é um dos fascínios da leitura.

A maior parte dos personagens não tem nome, mas apenas caracterização — são referidos como "meu tio", "minha mulher", "o marido de minha filha", etc. Oito personagens são nomeados, os quatro filhos e os quatro netos do primeiro narrador, núcleo da família e do próprio romance. Um dos filhos, e também um dos narradores, é Francisco Lázaro. Os personagens-narradores são marceneiros, e a oficina onde exercem sua atividade passa de pai para filho, o que confere uma aura de imutabilidade ao fluxo da história, a não ser quando um fato trágico ocorre e quebra o clima.

Técnica apurada

Dentro da marcenaria fica o cemitério de pianos do título, e em torno dele e dos mistérios que o envolvem a família se pereniza. É como se houvesse uma melodia conduzindo e embalando história e linguagem, feita de música e poesia. Além de romancista, José Luís Peixoto é poeta, o que se revela na forma como constrói a narrativa, palavra a palavra. Os recursos de linguagem evidenciam uma técnica apurada, e dificilmente funcionariam na mão de artesão menos talentoso. O texto ganha dramaticidade com a repetição de frases e expressões, e o farto uso de dois pontos em alguns trechos traz fluência e emoção.

Peixoto nasceu em Galveias, norte alentejano, em 1974. Seus romances foram publicados na França, Itália, Bulgária, Turquia, Finlândia, Holanda, Espanha, República Checa, Croácia e Bielo-Rússia, além do Brasil. Ele já esteve várias vezes na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) e costuma incluir elementos da cultura brasileira nos livros que escreve.

O escritor já publicou sete livros de ficção e três de poesia. No Brasil, a editora Agir lançou, em 2001, "Nenhum Olhar", prêmio Literário José Saramago, instituído em 1998 pela Fundação Círculo de Leitores, de Portugal, e destinado a autores com idade inferior a 35 anos. "Cemitério de pianos" oferece ao leitor brasileiro a oportunidade de contato com um dos mais talentosos nomes da nova geração da literatura portuguesa. Não seria má idéia publicar aqui também seus livros de poesia.

[resenha publicada no jornal Correio Braziliense]
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