Carlos & Mário

Carlos & Mário Carlos Drummond de Andrade




Resenhas - Carlos & Mário


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Renata CCS 18/03/2015

Quando a amizade contribui para a literatura.
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“A amizade é um meio de nos isolarmos da humanidade cultivando algumas pessoas.” Carlos Drummond de Andrade.


As 161 cartas trocadas ao longo de 21 anos entre Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade não só reconstituem um diálogo intenso entre dois escritores fundamentais à nossa cultura, mas mostram a afeição e a admiração entre dois amigos, numa complexa e completa sintonia entre razão e sentimento.

É difícil de resistir à curiosidade sobre a vida pessoal de nossos escritores mais queridos, como é o caso do meu amado Drummond. É a visão que ele tem de si próprio, e as facetas que não aparecem em suas obras. Suas cartas e as de Mário de Andrade são um riquíssimo e precioso tesouro deixado por ambos. Um presente raro.

Não são nada formais, mas tampouco despretensiosas. Com essa leitura entendemos como funcionou a relação entre duas personalidades tão distintas, e o quanto eles se admiravam e o quanto fortaleceram esta bela amizade à distância. Amizade que começou em abril de 1924, quando a trupe modernista de São Paulo – que incluía Mário, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral - passou por Belo Horizonte. Interessados no movimento literário de 1922, Drummond e alguns amigos mineiros foram conhecer o grupo paulista. Alguns meses depois, iniciou-se a correspondência entre os dois, que só terminou com a morte de Mário, em 1945.

O livro, lamentavelmente, não teve a merecida revisão. Não foram poucos os erros ortográficos e há uma visível ausência de padronização, principalmente quando ao uso de trechos em maiúsculas e itálicos. Em compensação, a qualidade gráfica da obra é excepcional, e traz uma das mais lindas e ricas iconografias que já vi! São documentos, fotografias, desenhos, mapas e obras de arte que contribuem na reconstituição das épocas e locais narrados em diversas passagens das cartas.

Ler a correspondência desses escritores não somente trouxe uma nova dimensão humana de ambos, mas foi uma prova definitiva de como cartas, diários, entrevistas e outros documentos da intimidade são preciosos, não só para o conhecimento e enriquecimento de suas obras, mas também porque são de um valor inestimável para a teoria literária.

Uma leitura imprescindível para qualquer pessoa que se interessa pela história da literatura, para amantes de poesia e pelo valor e contribuição preciosos de uma amizade que encorajou e inspirou um ao outro.

E para deixá-los com mais vontade do livro, leiam os trechos a seguir:

“Tudo está em gostar da vida e saber vivê-la.(...) Eu sempre gostei muito de viver, de maneira que nenhuma manifestação da vida me é indiferente. Eu tanto aprecio uma boa caminhada a pé até o alto da Lapa como uma tocada de Bach e ponho tanto entusiasmo e carinho no escrever um dístico que vai figurar nas paredes dum bailarico e morrer no lixo depois do romance a que darei a impassível eternidade da impressão.”
- Carta de MA para CDA - 10/11/24 - pg. 46.

“Com a inteligência não pequena que Deus me deu e com os meus estudos, tenho a certeza de que eu poderia fazer uma obra mais ou menos duradoura. Mas que importam a eternidade entre os homens da Terra e a celebridade? Mando-as à merda. Eu não amo o Brasil espiritualmente mais que a França ou a Cochinchina. Mas é no Brasil que me acontece viver e agora só no Brasil eu penso e por ele tudo sacrifiquei. A língua que escrevo, as ilusões que prezo, os modernismos que faço são pro Brasil. E isso nem sei se tem mérito porque me dá felicidade, que e a minha razão de ser da vida.”
- Carta de MA para CDA – 10/11/24 - pg. 51.

“Tenho sentido uma comoção boa nesses dias de sétimo centenário de São Francisco de Assis. Que santo gostoso pra gente gostar dele, Mário! Estive algum tempo imaginando que o motivo da simpatia unânime que ele desperta está no fato de ser um santo literário. Hoje me arrependo desse juízo. Não só ele não e literário como também não há literatura que o corrompa. Debaixo de tudo que já se escreveu sobre ele, continua a mesma criatura simples como água, amável e amorosa. A poesia dele foi um êxtase. E sua vida foi sua melhor poesia.”
- Carta de CDA para MA, 7/10/26 - pg. 246.

“Tenho sempre, diante de um livro novo de você, um surto criador. Fico pensando que diabo de novas coisas admiráveis você foi descobrir pra gente, pra dar sustância, coragem, entusiasmo à preguiça da gente. Seus livros todos têm isso de profundamente sério, que eles obrigam a gente a trabalhar.”
Carta de CDA para MA - 7/02/27 – pg.268.

"Às vezes até desejo ser um pouco mais desconhecido de mim..."
- Carta de MA para CDA - 29/03/27 – pg. 286.

“Vou vivendo a vida que Deus quer, sem essa vontade férrea de extrair felicidade de tudo, que e a própria felicidade afinal, e que constitui a grande força de você na vida.”
- Carta de MA para CDA - 2/10/27 – pg.294.

“Vontade não cumpre o que a gente prometeu a si mesmo...”
- Carta de CDA para MA - 10/07/28 – pg.325.

“Engraçado: estava escreve não escreve pra você quando recebi sua carta. O desejo sossegou e pude esperar mais estes dias. Na verdade eu não conto carta com você e escrevo por precisão de me sentir mais junto com os amigos. Já sei mesmo como você é folha ao atá, levada pelos ventos. O engraçado é que se trata duma folha pensante, reagente como sensibilidade, que espiritualmente caminha contra os ventos as que até já está achando um certo sabor nessa malinconia de se deixar levar. Porque apesar de todas as reações e projetos e desejos, você continua folha.”
- Carta de MA para CDA - 19/05/29 – pg.350.

“Mario,
estive relendo tuas cartas
meu amigo
e logo um pensamento bom
pensamento de Natal
pensamento de Ano Novo
voou de mim para você.

Corre, pensamento bom,
sobre as montanhas de Minas
sobre a verde mantiqueira,
vai dizer ao meu amigo
em São Paulo
que estou me lembrando dele,

lembrando com amizade...”

- Carta de CDA para MA - 01/01/31 – pg. 399.
Arsenio Meira 18/03/2015minha estante
Renata,
Eu li sua resenha. Tomei um fôlego e reli. Pensei: "vou ler novamente e quantas vezes se façam necessárias." O zelo, a emoção, os trechos que você cuidadosa e carinhosamente destacou para todos os que quiserem ler, são para mim, um bálsamo, um presente, um aceno de esperança e alento. O que mais posso dizer? Obrigado. Sempre.
Um abraço do amigo


Catharina 19/03/2015minha estante
Linda resenha. Uma bela homenagem para escritores tão fundamentais à nossa literatura.
Deve ser uma leitura preciosa para amantes de poesia!


Renata CCS 20/03/2015minha estante
Queridos amigos,
Obrigada pelo carinho! É a minha paixão por Drummond que ajudou, sem dúvida.
abraços carinhosos.


Helô 19/06/2015minha estante
Estou ansiosa para ler esse livro.




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