Jô 16/04/2024
Assim como nos demais livros, a autora ousou ao abordar sobre um tema muito pesado e que tem sido muito presente no mundo contemporâneo: a depressão. Narrado em primeira pessoa, o livro retoma a alguns momentos do passado para entendermos a crise que a protagonista vem enfrentando. E esse foi o motivo de muitas pessoas não terem gostado tanto desde livro, já que Helen sempre foi a filha mais ousada, determinada e que perturbava todos. Era descrita como uma personagem forte, destemida e que sempre estava disposta a enfrentar o que quer que tentasse atrapalhar o seu caminho.
Eu particularmente adorei a escolha da autora ? Foi sim uma surpresa, mas Marian Keyes retrata em seus livros sobre mulheres reais, que passam por problemas sim e muitas dificuldades. Retratar Helen Walsh com um quadro de depressão mostra que até as pessoas mais fortes têm suas fragilidades, e ainda que não existe mulher maravilha.
Ao acompanhar a narrativa podemos entender como funciona a cabeça tão caótica de uma pessoa que passa por uma crise depressiva:
?Havia dois anos e meio, eu aprendera a parar de esperar consolo e conforto das pessoas à minha volta, porque elas não conseguiam me fornecer isso. Todos estavam apavorados demais. Eu estava aterrorizada e eles também. Ninguém parecia compreender o que acontecia comigo e, ao perceber que não podiam me ajudar, sentiam-se impotentes, culpados e, por fim, ressentidos. Sim, é claro que eles me amavam; minha mente sabia disso, embora o coração não conseguisse sentir esse amor, mas o fato é que uma parte deles estava zangada comigo. Como se fosse escolha minha ficar com depressão, ou eu estivesse resistindo de propósito à medicação que deveria me consertar.? (Págs. 173/174)
?Já ouvi pessoas dizerem que ter depressão é como ser perseguido por um imenso cão preto. Ou estar preso em uma redoma. Para mim era diferente. Eu me sentia envenenada. Como se meu cérebro quisesse e precisasse se livrar de toxinas marrons, muito escuras, que poluíam tudo: minha visão, minhas papilas gustativas e todos os meus pensamentos.? (Pág. 292)
Apesar do tema ser muito pesado a autora consegue intercalar os momentos de crise de Helen com episódios muito hilários, afinal, é uma das características marcantes de Marian Keyes. O melhor é que a autora não só descreve o estado de Helen de forma melancólica e sem solução, ela apresenta possíveis ajudas para enfrentar o problema. Quantas pessoas também não passam pela mesma situação e não sabem o que fazer, ou que não acreditam que há uma forma de amenizar o problema?
Crise financeira na Europa
Quando eu li esse livro em 2014 lembro que eu ficava com muito peso na consciência por ler este livro. Isso porque eu estava estudando para o ENEM e a FUVEST e não tinha tanto tempo para ler coisas ?aleatórias?. Mas era o livro que vinha esperando desde o fim da leitura de Tem alguém aí? em 2010. Mas o contexto histórico do livro me ajudaram a estudar de certa forma (eu até uso isso como justificativa hahaha).
Devido a crise financeira mundial em 2008, a Irlanda entrou em recessão, ou seja, diminuição da atividade econômica, com queda da produção, desemprego e muita crise. O período de 2008 a 2010 foi muito crítico, e ainda em 2012 o país lutava para se recuperar da crise. (G1 / Vermelho) Uma das características dessa crise, foi que as pessoas não estavam mais conseguindo pagar a prestação de suas casas. Muitas pessoas foram despejadas nesse período, e Marian Keyes retrata essa situação durante o livro todo, tanto que Helen Walsh perde seu tão sonhado apartamento.
Para Helen a crise foi muito crítica devido à sua profissão. A filha mais nova da Família Walsh é detetive particular, e como é retratado no livro, esse é na maioria das vezes um serviço de luxo. A maioria dos casos que investigava era sobre adultério e com a crise financeira, as pessoas preferiam não contratar um detetive particular para tentar comprovar a traição de seu parceiro. Mesmo porque se realmente houvesse uma traição, a separação não seria vantajosa devido à crise. Sim, isso está no livro, rs.
O mistério de Mercy Close
O principal mistério que a história envolve é o chá de sumiço (trocadilho com o título do livro, rs) de Wayne, um músico da banda Laddz. A banda foi muito famosa há 15 anos atrás na Irlanda e o produtor Jay Parker com mais dois outros produtores decidiram unir os 4 músicos para 3 shows. O problema é que Wayne simplesmente desaparece uma semana antes dos shows acontecerem e seria um grande prejuízo e decepção dos fãs se os shows não acontecessem.
Foi muito interessante a forma com a autora conseguiu desenvolver o mistério de Mercy Close, lugar que Wayne mora. Seguindo várias linhas de raciocínio, Helen passa por várias situações de tirar o fôlego e outras muito engraçadas para descobrir o paradeiro de Wayne. O mistério é desenvolvido de forma muito surpreendente, vários pontos são lançados ao longo da narrativa, mas ao final a autora conseguiu fechar cada ponto que lançou. A detetive é contratada por Jay Parker, o produtor da banda, que nada mais é do que seu ex-namorado. Há entre eles uma relação do passado mal resolvida que aos poucos vai sendo apresentada aos leitores, bem como o porquê do fim da amizade de Helen com Bronagh, sua amiga inseparável, até então.