Assim que vi o livro entre os lançamentos da Bertrand pensei em duas coisas: "parece um ótimo histórico" e "ah não, mais um erótico disfarçado". Entre esses dois pensamentos opostos acabei solicitando o livro a editora em um impulso intuitivo que felizmente se provou acertado. O argentino Federico Andahazi construiu uma história peculiar e riquíssima sobre duas indagações distintas, mas sutilmente ligadas. Gutenberg foi um genial inventor ou um grande falsificador? Quando a sexualidade deixou de ser algo sagrado para se tornar algo proibido?
Mainz, 1455. Enquanto Gutenberg, Fust e Schöffer escutam a inflamada acusação feita pelo promotor e copista Sigfrido de Mangúcia contra o que ele chama invento do diabo do outro lado da cidade Ulva, a prostituta mãe do Mosteiro de Sagrada Canastra lamenta a morte de mais um de suas meninas. O Mosteiro, o mais luxuoso bordel de Mainz, vem sendo alvo de um assassino cruel e silencioso, que chega sem ser visto, sufoca suas vítimas e leva suas peles consigo sem ser notado. Após o terceiro hediondo crime Ulva sabe atrás de que o assassino está. E de uma forma sutil os misteriosos assassinatos estão ligados ao julgamento que acontece na cidade. Por um lado mergulhamos nas lembranças de Gutenberg e por outro conhecemos os segredos e a história do Mosteiro da Sagrada Canastra. A tradição que remonta aos antigos cultos da Babilônia. A arte que era sagrada e que a Igreja tornou profana e proibida.
A narrativa de Andahazi é bastante fluida e o autor consegue levar ao leitor duas histórias, sutilmente interligadas e com fortes bases históricas. Duas perguntas, dois temas distintos juntos em um livro que os interliga de forma sutil em favor de desenvolver cada uma a seu modo. Por um lado essa não foi a melhor decisão tomada pelo autor, mas por outro funciona. A sensação de estar acompanhando duas histórias diferentes é superada pela riqueza e destreza que Andahazi imprimira ao apresentar e desenvolver as histórias. A ambientação é outro ponto que merece destaque, as descrições se sobrepõem as minúcias históricas, aliando o visual as curiosidades dos temas desenvolvidos.
A partir de muita observação e alguma pesquisa Andahazi reconstrói a vida do homem que mudou a forma como a humanidade via os livros. Teria Gutenberg inventado a prensa com a intenção de mudar a forma de fazer os livros, de facilitar e aumentar o mercado de livros ou com a simples intenção de falsificar algumas bíblias em busca de dinheiro? Sim, devemos a evolução dos livros a seu invento, mas indo além da genialidade de seu invento Andahazi desconstrói a vida de Gutenberg a partir de suas lembranças, desde criança quando conheceu com fascínio o ofício do pai, cunhador na Casa de Moedas e a silenciosa reverência que tinha pelos copistas até a desgraça da família, a fuga dos judeus de sua cidade natal a vida financeira apertada e aos estudos que o levam a prensa.
Do outro lado da história o autor mergulha dos detalhes da antiga tradição babilônica, desde o culto a deusa Ishtar até os detalhes cerimoniais, enquanto especula sobre a sobrevivência através dos séculos do que para um pequeno grupo ainda é considerado sagrado. Andahazi faz viver a impressão de que seu relato é mais do que ficção e enquanto acompanhamos os tormentos da vida de Gutenberg especulamos sobre o estranho culto do Mosteiro da Sagrada Canastra.
Leitura rápida e curiosa, que instiga o leitor e conta duas histórias curiosas, com riquezas históricas próprias e que debatem questões interessantes. A prosa de Federico Andahazi é bastante rica e a desenvoltura com que ele debate suas perguntas na trama é notável, sendo um dos pontos que mais surpreende e cativa durante a leitura. No mais a estranheza diante do segundo tema é passageira frente ao tom da narração e a curiosidade do assunto. A edição (...)
Termine o último parágrafo em:
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