belaffig 13/03/2021"Qual seria o cheiro do Tempo?"Que experiência sensacional foi mergulhar nesse livro. Minha segunda obra de Ray Bradbury depois de "Fahrenheit 451" deixa uma marca muito maior que a primeira e de formas tão amplas que é até difícil colocar em palavras. Mas vou tentar.
Primeiramente: que exercício de imaginação incrível. A escrita de Bradbury é concisa, mas cada palavra milimetricamente escolhida causava um impacto, um peso únicos. Ele conseguiu fazer a descrição de todo um outro planeta e modos de vida de um modo sucinto e ainda fantasioso, imaginativo; sem contar na carga dramática e emocional que permearam o livro de ponta à ponta e raramente deixaram a desejar.
É difícil dizer sobre o que esse livro fala. Sobre Tudo, acho. Com T maiúsculo. "Crônicas Marcianas" fala sobre as constantes do universo, a fragilidade da História (humana), o Tempo e a validade dele, a Solidão, nossa Solidão, pois nada mais somos do que Solitários, pegos no meio de algo, estranhos se cruzando no meio das noites. E, claro, sobre a inabalável capacidade do ser humano de destruir tudo ao seu redor na sua busca por familiaridade (trazendo, assim, evolução?) Assim que cheguei na metade do livro, me lembrei de uma resenha que vi do filme "Pulse" (de 2001, de Kiyoshi Kurosawa), que dizia: "A última coisa que a humanidade vai saber fazer junta é perecer." Aqui, essa frase não carece de verdade; mas seu "contrário" também é válido: a humanidade não sabe fazer nada mais junta além de destruir. Como diz meu personagem favorito do livro no meu conto favorito do livro, "Os homens da terra têm talento para acabar com coisas grandes e belas".
Como falar de um livro que fala de tanta coisa? É melhor experiencia-lo. Era difícil imaginar que final ele podia tomar, mas quando chegou, pareceu ser o único plausível. A completude e complexidade de um estudo sobre os seres humanos em todos os seus âmbitos possíveis e inimagináveis termina com a mais assustadora e irremediável das conclusões: tudo que a humanidade conquistou são cinzas ao vento. E apesar de o terceiro ato da obra ter decaído um pouco em notas individuais (e um adendo pessoal: eu não acho que dá para lê-los fora de ordem ou sozinhos e ainda conseguir sentir a magnanimidade da obra), é impossível não dar os máximos elogios para um livro tão universal, surrealmente real e... humano.