Léo Araújo 17/01/2024
Não é uma novela; é um sonho...
Marlow, o protagonista e alterego do autor já diz logo no início da narrativa: "Parece que estou tentando contar um sonho para vocês...".
A NARRATIVA
Ela gira em torno da busca por uma viagem ao interior da África (interior de si mesmo) em um barco a vapor, lugar nunca pisado por ele. E recebe justamente a missão de encontrar o Mr. Kurtz, um funcionário da Companhia que explora marfim, chefe do Entreposto do Interior (referência a eu interior), que desapareceu.
Desde o início do livro, existem dualidades opostas, como luz e trevas, civilização e barbárie, externo e interno. Além disso, toda variação de palavras para exprimir a escuridão e trevas já assombram a narrativa. A própria descrição do Tâmisa e do grande rio em forma de serpente é a representação dessa dualidade, apesar do livro não falar nada sobre onde é esse rio. No entanto, como diz Marlow, "a cobra o enfeitiçou".
O REAL SIGNIFICADO
O livro vai penetrando, camada por camada, tornando-se mais sombrio, rumo ao desconhecido, representado pela densa floresta virgem (a alma humana). Os personagens, as paisagens estranhas são pura simbologia, como a cidade que se parece um sepulcro branqueado, a Companhia, as duas mulheres, o médico, a tia, o gerente, o oleiro, o marfim, os rebites e a floresta grandiosa. Até mesmo o arlequim representa algo, a juventude da época. Acredite, grandes passagens permanecerão inexploradas para a maioria.
Conforme penetra-se mais e mais na floresta, Mr. Kurtz vai sendo revelado mais detalhadamente, de modo contraditório, mas que vai ganhando admiração de Marlow. Essas visões que são reveladas por outras pessoas vão sendo adensadas. Além disso, a cada história contada faz Marlow ter diálogos internos, submetendo-se ao seu próprio escrutínio, tornando-se introspectivo e analítico. Há momentos de fluxos de consciências complexos e reflexivos.
O fato é que ao se buscar o marfim, o grande ídolo, símbolo material, a mentira, encontra-se a verdade: o horror! E esse antagonismo entre a selva feroz e a civilização é evidente até o fim do livro.
CONCLUSÃO
Entenda uma coisa: Mr. Kurtz é mais uma voz do que um homem. É a voz que responde ao inconsciente de Marlow e do leitor. E é justamente na imagem central de Mr. Kurtz que o leitor deve procurar conhecer-se, pois o que se pode esperar da vida é um certo conhecimento sobre si mesmo. Ler o livro com essa perspectiva vai facilitar sua absorção.
O filme Apocalypse Now de 1979, influenciado diretamente pelo livro, reflete nitidamente a autorreflexão que Marlow se submete a cada momento em que sobre o rio e que recebe informações novas sobre Kurtz, cada vez mais ao rumo do interior em busca dele. Assistir o filme após ler o livro irá ajudar em sua compreensão. O horror! O horror!