Daniel Rocha 13/03/2019Uma reparação que levou 28 anosA primeira e única vez que li É Tarde Para Saber foi na Sétima Série, quando as coisas da vida estavam para acontecer. No ano seguinte, quando as coisas da vida começaram a acontecer, deveria ter lido uma segunda vez, pois na Oitava Série fizemos outro trabalho sobre ele. Aos 15, quando troquei de colégio e as coisas da vida começaram a acontecer MESMO, eu deveria ter lido uma terceira vez, pois também fizemos um trabalho sobre ele.
Não li, e só muitos anos depois me tornei um bom garoto acadêmico.
Terminei de reler hoje. Minha segunda leitura, portanto. 28 anos me separam daquela primeira leitura. É difícil avaliar quando você já sabe o que vai acontecer, e não lembro exatamente o que pensei da primeira vez que o li. Mas pensar em um romance “adolescente” antes de ter vivido a adolescência é uma coisa. Depois de ter vivido – e minha adolescência foi um pouco mais colorida do que a da Mariana – é outra.
A primeira publicação do livro é de 1977, quando ainda estávamos na ditadura. E não lembro exatamente se eu entendia o contexto no qual a história se passava (inclusive fiquei hoje na dúvida se quando o narrador chama as pessoas que morreram para a gente poder ter liberdade hoje de “terroristas”, se ele realmente quis dizer isso ou apenas assumiu a voz vigente do senso comum desde então. Sei que um ano depois de ler esse livro, fomos às ruas protestar contra Collor, em 92, mas isso é outro papo).
De qualquer forma, 28 anos depois acho que entendi melhor o drama de Cássio e por que afinal se escondia de Mariana. E que, não pude deixar de notar – até porque muitos anos depois me tornei estudante de psicologia -, é não apenas uma garota romântica, mas também tem traços depressivos evidentes. Aliás, assim como sua mãe.
Italo Calvino disse que todo mundo deveria reservar uma parte da vida adulta para reler os livros da infância e adolescência. Deveria ter lido É Tarde Para Saber três vezes. Levei 28 anos, mas me reparei com Josué Guimarães.
De qualquer forma, ainda te devo uma leitura. Que não leve mais 28 anos.