Eu, Mulher Da Vida

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Resenhas - Eu, Mulher da Vida


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Alexandre 27/11/2009

Gabriela Leite, socióloga, prostituta aposentada, fundadora da ONG DaVida e idealizadora da grige DASPU, conta neste livro sua história de vida e os preconceitos de que as prostitutas são vítimas e a forma como grupos religiosos e políticos tentam tirar proveito na realização de projetos em prol das profissionais do sexo. Tudo isso, de uma forma absolutamente natural, sem hipocrisias.
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Gideon 31/07/2009

A Arte de Gabriela
Trata-se de uma prostituta que tornou-se líder de todas as outras prostituas. Ela, hoje, deve ter uns 54 anos, mas na época em que escreveu o livro tinha 40. O livro foi editado em 1992. Devorei-o em 3 dias, dando descanso para um outro que estava lendo.

Vejam que trecho maravilhoso deste delicioso livro:

(...) O Lula estava no palanque com o Gabeira, que fez questão que eu falasse...
Não tive dúvida quando me deram a palavra. Contei a história,
dizendo mais ou menos assim: "Ao conhecer pessoalmente o cara que eu via de longe falando em São Bernardo do Campo, como sindicalista, a sensação que eu tive foi uma baita raiva porque ele me molhou de suor quando me abraçou. É que isso me fazia lembrar dos homens na zona, no verão, e uma coisa que eu detestava era quando eles iam transar com o corpo suado e ficavam pingando o suor em cima de mim.
Senti que o povo se assustou um pouco, os políticos mais ainda ( a não ser o Gabeira, que dava um sorrisinho cúmplice), aí acrescentei: "Depois que a raiva passou, eu fiquei pensando.
Então, ele é um homem igual aos outros, porque ele também sua. É igual aos homens que iam na zona e transavam comigo nas tardes de
verão."

Continua ela:

"Quando desci do palanque, tinha um monte de gente chorando, querendo me abraçar. Era gente comum, que eu nunca havia visto na vida. Mas vieram também meus companheiros católicos do PT, (...), esbravejando comigo, que aquilo não era discurso para se fazer em comício. (...)
Quando foi à noite, estava ainda bastante confusa, achando que no fundo tinha feito mesmo algo errado. Envergonhada do meu discurso, fui à Churrascaria Majórica, no centro de Friburgo. Ainda na porta, o Lula me chamou meio de lado, e me disse com aquele vozeirão rouco:
“Gabriela, eu queria fazer uma perguntinha a você. Minha mulher sempre me disse para eu usar desodorante, mas eu não gosto. Ela diz que eu transpiro demais e que meu suor fede. E hoje você falou disso no seu discurso. Me fala com sinceridade, não precisa mentir: eu estava fedendo muito naquele dia? Foi por isso que você ficou com raiva?”


Imaginem que este livro foi escrito muito antes do Lula ganhar as eleições presidenciais. O mais interessante do livro é uma coisa que ficou clara para mim. A Gabriela era prostituta e não queria deixar de sê-la. As pessoas e instituições que tentaram ajudá-la o faziam com a intenção de que ela deixasse a sua vida indigna. Ela sempre afirmou que gostava de ser prostituta e mesmo assim ser útil para a sociedade e para as outras pessoas que precisassem dela. Por aí vai o livro.

É uma visão realmente chocante. Confesso que me chocou também. São os nossos preconceitos que são revolucionados com situações que ela conta no livro. Achei bom ler este livro. De fato fez-me ver um pouco o outro lado da moeda, apesar de achar que existem formas de vida muito mais saudáveis e que nos fazem infinitamente mais felizes que a que ela optou, ou seja, a prostituição. A felicidade da família é algo inigualável.

Impossível não associar o estilo de vida de Gabriela com uma obra de Arte. Seria a Arte da Vida? Os lugares que ela freqüentou, as pessoas que ela conheceu em situações e momentos singulares parecem todos tons das tintas de uma palheta de aquarela. Eu aqui, lendo o seu livro e paralelamente pintando na imaginação um quadro!

No início achei Gabriela meio grosseira, mas a medida em que fui passando as páginas fui descobrindo uma erudição espontânea e, talvez, inconsciente. A erudição de Gabriela é especial por não permitir que a sua narrativa tome forma clássica e torne-se comum. Ela pincela, vez outra, doses de “grosseria” na linguagem coloquial que nos faz lembrar a sua origem e forma de vida. Isso é deliberado e me fascinou na leitura, pela sutileza e inteligência que ela demonstrou.

A Arte, pelo menos no meu ponto de vista, não tem de ser necessariamente materializada. Tem de ser sentida. Que seja por uma só pessoa, e isto, de alguma forma é uma característica da Arte, de nos dar a liberdade de subjetivamente vivê-la, experimentá-la. O livro de Gabriela fechado, é como uma partitura na estante. Lido, torna-se uma música executada, com todas as suas componentes, melodia, harmonia e ritmo. Ou seja, a sua Arte somente é sentida quando entramos em seu mundo, quando a ouvimos, quando nos chocamos com a sua firmeza em ser chamada de prostituta. Talvez pelo seu deboche da sociedade careta e hipócrita, como ela repetidamente declara.. Desesperadamente procuro referências nas formas de Arte existentes, como a música, a pintura, para decifrar Gabriela. Mas deveria? Ou seria a prostituição a própria Arte de Gabriela? Gabriela não é prostituta. Gabriela é artista! Não, com certeza, ela gritaria ao ler essa abominação à sua maneira de viver:

- Mais um idiota tentando me redimir para o seu mundo!

E assim segue Gabriela, pintando na vida a arte da prostituição, e com isto me chocando e fazendo-me mais sensível à Arte, a mãe de todas as Artes. A vida!.
Julia 24/08/2016minha estante
Muito boa a resenha! Vamos torcer para que os livros sejam cada vez mais uma ferramenta de quebrar preconceitos.




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