O Menino de Palmares

O Menino de Palmares Isa Silveira Leal




Resenhas - O Menino de Palmares


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Marcel.Trocado 16/09/2022

Resistência Que Virou História

O menino de Palmares é Jorge, nome dado pela senhora Sabina, velha mucama de D. Violante. Sabina: “vamo botá nome de Jorge, Sinhá. Santo guerreiro” (p. 27). Na real a intenção da mucama era cultuar o fetichismo dos negros, projetar Ogum, orixá guerreiro, conhecido pela sua coragem e força.

O título, assim como a forma que Sabina nomeou Jorge, é no decorrer do enredo repleto de demonstrações de resistência dos escravos negros dentro da cultura branca colonizadora. Como o nome sugere, o menino de Palmares descende da resistência contra o sistema escravista, Palmares era constantemente atacado, desfeito e novamente refeito em outro local, num dos ataques Jorge tem os pais assassinados e o menino é capturado pelo tenente português Gil Fernandes, que por sua vez deixa-o aos cuidados da sua esposa D. Violante, no Engenho Luango, na localidade de Porto Calvo, Recife.

Os anos se passam e Jorge vai esquecendo-se de Palmares, da revolta de ser obrigado a servir aos brancos, até que conhece Jacainene, uma jovem vinda de Palmares, cuja missão, imposta pelo feiticeiro Anajuba, é resgatar o Orixá do Macaco, objeto levado pelo grupo de Gil Fernandes no mesmo ataque que Jorge ficou órfão.

Jacainene não conhecia o medo. Nascida e criada em Palmares, tinha já, ao contrário daquele menino, todas as noções práticas da vida na mata (p. 36). Jacainene demonstra ser uma personagem admirável, é captura ainda na mata e é escravizada, moça linda, adapta-se ao mundo dos escravizadores: “tinha inteligência de sobra e vontade indomável” (p. 36). “Senso de oportunidade de aproveitar o momento certo” (p. 37). Aprimorou seus dotes culinários (p. 39), o que a permitia ter certas regalias. Era metódica, acumulou vintém por vintém para propor sua alforria, entretanto, sempre atenta e sorridente valia muito mais do que podia pagar pela própria liberdade, aos olhos do seu escravizador, devia casar logo e dar muitos “escravinhos ao senhor” (p. 39).

André, ainda muito criança, tem uma relação conturbada com o escravo Jorge, ambos vivem brigando e se machucando muito quando se engalfinham nos embates. Mas os conflitos entre eles faz nascer um respeito mútuo, ainda mais quando o pai de André, Gil Fernandes, falece. Jorge demonstra sentimentos ao seu opositor que, a partir de então, o vê como um importante companheiro.

Disposta a continuar sua missão Jacainene foge, porém, no caminho é novamente capturada e seus captores a vendem a senhores de Porto Calvo. Nesta época havia no espírito da moça uma nova luz. Do contato com a nova experiência junto aos brancos e aos companheiros da senzala, recebera uma visão diferente da vida. Sabia agora a diferença entre supertição e religião. Jacainene percebia que religião devia ser amor e não ódio.

“Pensava: preciso encontrar o orixá, levá-lo de volta ao meu povo, para me ouvirem. Mas eles precisam saber que o verdadeiro orixá está dentro deles... Nessa coragem que eles têm. Nessa inteligência para arrumar seu reino de Palmares. Nessa vontade firme deles, é que está o orixá. Eles são o orixá...” (p. 40) Jacainene juntou mais moedas, conseguiu do novo amo que lhe concedesse a carta de alforria. Passou a vender tabuleiros de quitutes, alugando seu trabalho às sinhás (p. 41) até que encontra Jorge, ambos se apaixonam apenas aos olhares.

Passado algum tempo Jorge convence Jacainene a ir com ele para o Engenho Luango, em pouco tempo Jacainene conquista a confiança de todos, sobretudo da D. Violante. Assim, a mais nova moradora do local sabe que entre os pertences do falecido Tenente Gil Fernandes poderia estar o Orixá do Macaco, Jacainene, na primeira oportunidade recupera entre guardados da família o que parece ser o item que a fez sair de Palmares.

Jorge, sabendo sobre a missão de Jacainene, concorda em acompanhá-la até Palmares. Após cinco anos de sua partida Jacainene retorna para seu povo, porém a receptividade não é nada agradável, o feiticeiro Anajuba não reconhece o objeto trazido pela moça e a acusa de traição, impõe o seu sacrifício e julga ser uma armação dos brancos contra os moradores de Palmares (p. 62-63). Anajuba demonstra ser um fanático na busca de um ídolo, não é visto como mau entre os moradores de Palmares, os sacrifícios na sociedade tribal é uma consequência esperada aos que falham numa missão, “seriam também escravizados os submetidos pela lei implacável de Palmares?” (p. 65).

Para salvar Jacainene do sacrifício surge a figura de Machuca, um velho companheiro do Tenente Gil Fernandes acompanhado de André. Jorge retira Jacainene para fora das paliçadas de Palmares, Machuca e André dão suporte para a fuga. Machuca antes do resgate, de posse do real orixá, devolve a Anajuba o ídolo, o que acalma os ânimos entre todos no quilombolo.

Passado mais algum tempo, Jacainene e Jorge, com muitos anos vividos longe de Palmares, se organizam dentro da sociedade escravista com seus três filhos. Numa relação cordial com o casal André e Júlia, ambos os casais terão seus filhos em convivência pacífica.

Palmares que era formado por redutos nesta época vai sendo derrotado por Jorge Velho, o destruidor definitivo de Palmares, com forte aparato bélico e grande número de homens, Jorge Velho vai derrubando um a um dos redutos até o embate final com Zambi e a sua guarda, esses combatem ferozmente, mas com a derrota da resistência negra o quilombo vira uma grande fogueira. Lentamente, o capitão bandeirante ordena a retirada. E só ficam, entre montões de cadáveres, as chamas de um ideal agora disperso, que os negros haviam resumido numa palavra: Palmares.

Estava destruída a história do heroísmo, da organização política, militar e agrária, do sentimento de dignidade do negro em chão brasileiro.

“Agora, quem quisesse contaria a história à sua maneira” (p. 113).
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