Literatania 17/10/2021
Mulheres de Cinzas. 1° das Areias do Imperador.
Sempre em suas entrevistas, Mia Couto diz que o ato de escrever é um processo de revisitação do passado. Foi assim com Camões, Saramago, Euclides da Cunha e outros grandes escritores da literatura em língua portuguesa.
Neste incrível romance, ?Mulheres de Cinzas?, primeiro livro da triologia ?As areias do Imperador? temos um retrato do infeliz período histórico da colonização de Moçambique (século XIX), os conflitos entre os portugueses colonizadores, e as etnias contra o império africano de Gungunhane.
É através da voz e do olhar da africana Imani, a narradora, cuja identidade é constantemente questionada por ter sido educada por uma missão portuguesa, que veremos uma África, que embora tente resistir, cederá lugar a uma nova identidade africana, caracterizada pela mistura de crenças, culturas, e a desmistificação dos valores tradicionais africanos . Ela sintetiza a cultura africana, os conflitos étnicos e religiosos. Imani é a metáfora da África ingênua e ao mesmo tempo guerreira, mas que se deixa seduzir pelos olhos azuis do europeu Germano, personagem este, que divide a narrativa com Imani.
A voz narrativa de Germano é o olhar do exilado em terras africanas que oscila entre o amor que sente por Imani e o preconceito, e incredulidade devido às diferenças culturais entre eles. Por meio de imagens grandiosas, o romance antecipa o declínio do império português e a vitória do africano sobre sua terra, e a permanência de sua identidade híbrida. A fabulação em linguagem poética do romance não se prende a História em si, mas deixa aberto as várias possibilidades de leitura sobre a impermanência identitária tanto dos africanos como dos portugueses em Moçambique. É simplesmente belíssimo! Vamos ao romance 2.