Meu último suspiro

Meu último suspiro Luis Buñuel




Resenhas - Meu último suspiro


8 encontrados | exibindo 1 a 8


jota 31/08/2020

Avaliação da leitura: 4,8/5,0 – MUITO BOM (histórias de cinema, da própria Espanha, do México, da França...)
Luis Buñuel (1900-1983), cineasta nascido na Espanha mas que também trabalhou vários anos no México e na França, é considerado o mais surrealista dos realizadores cinematográficos. O que o conterrâneo e amigo Salvador Dali (1904-1989) significou para as artes plásticas, para a pintura especialmente, Buñuel significou para a sétima arte. Aliás, os dois trabalharam juntos numa das obras mais representativas do surrealismo: Um Cão Andaluz (1929), com a famosa cena de um olho feminino cortado por uma navalha. Buñuel também foi amigo íntimo do poeta e dramaturgo Federico Garcia Lorca (1898-1936) e conviveu com muita gente que se destacou em atividades artísticas e políticas no século XX. Meu Último Suspiro aborda longamente tudo isso, especialmente a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), da qual o cineasta participou por trás das trincheiras: ele nutria simpatia pelos anarquistas. Nascido num país tradicionalmente conservador e católico, era “ateu, graças a Deus.”

O livro não é exatamente a autobiografia do cineasta, um relato completo sobre sua vida e carreira artística. Para escrevê-lo contou com a preciosa ajuda do roteirista Jean-Claude Carrière, com quem ele trabalhou em seis filmes, alguns de seus melhores. Buñuel mesmo diz: “Neste livro semibiográfico, ao longo do qual eventualmente me perderei como num romance picaresco, rendendo-me ao encanto irresistível da narrativa inesperada, talvez ainda subsistam algumas falsas recordações, a despeito de minha vigilância. Repito, isso tem uma importância irrisória. Sou feito de meus erros e de minhas dúvidas, assim como de minhas certezas. Não sendo historiador, não recorri a nenhuma nota, a nenhum livro, e o retrato que proponho é, em todo caso, o meu, com minhas afirmações, hesitações, repetições e brancos, com minhas verdades e minhas mentiras; para resumir: minha memória.” Buñuel revela-se aqui, para usar um clichê nietzschiano, humano, demasiadamente humano, especialmente quando declina seus gostos e desgostos acerca de pessoas e coisas.

Sobre a memória escreveu ainda: “Uma vida sem memória não seria uma vida, assim como uma inteligência sem possibilidade de exprimir-se não seria uma inteligência. Nossa memória é nossa coerência, nossa razão, nossa ação, nosso sentimento. Sem ela, não somos nada.” Assim, muito do que ele vivenciou, viu, ouviu, pensou ou mesmo sonhou está em seus filmes. Em Meu Último Suspiro ele apela para a lembrança e vai se recordando de todas aquelas coisas do passado e explicando para o leitor onde colocou isso ou aquilo numa película: mas penso que nem sempre tudo deve ter ficado exatamente claro para quem viu seus filmes sem conhecer essas explicações de agora. Daí que o livro é importante não apenas como registro da vida de alguém que marcou o século XX, também para estudantes, críticos e apreciadores de cinema.

Como tantos outros intelectuais que brilharam no século XX (Freud, Bergman, Fellini, Sartre, Picasso etc.), o cineasta espanhol emplacou o adjetivo buñuelesco, utilizado para designar um tipo de obra em que a realidade é invadida pela imaginação e pelo devaneio, quer dizer, pelo surreal: um sonho fantástico, um pesadelo terrível, uma idéia extravagante que o cineasta teve ou de que se lembrou (geralmente coisas associadas à infância, à religião, ao sexo, caso de Buñuel), ou ainda que alguém lhe contou, podia se transformar em parte de um filme, nele era inserido e depois críticos e espectadores quebravam a cabeça tentando decifrar seu significado. Que algumas vezes podia significar absolutamente nada, como divertidamente o próprio Buñuel conta acerca de uma cena de A Bela da Tarde (1967).

Este é um de seus filmes mais conhecidos, talvez o mais famoso de sua carreira, e foi estrelado por Catherine Deneuve. Ela fazia Séverine, uma moça burguesa que era incapaz de manter relações sexuais com o marido (Jean Sorel) e então procurava emprego num bordel para preencher suas tardes, satisfazer seus desejos e fantasias. Num dia, um cliente asiático traz uma caixinha e mostra às garotas o que ela contém (nós não vemos seu conteúdo). As garotas recusam com gritos de horror, exceto Séverine, que na verdade fica interessada. Depois do filme, muita gente queria saber de Buñuel o que a tal caixinha continha. Ele mesmo não fazia a mínima ideia, então sua única resposta possível era: “O que você quiser.”, palavras do cineasta. Muitas são as histórias relacionadas aos seus filmes, invariavelmente polêmicos, com fortes críticas ou ironia quase sempre dirigidas à burguesia e à religião católica.

Destaca-se a trilogia formada por A Via Láctea (1968), O Discreto Charme da Burguesia (1972) e O Fantasma da Liberdade (1974), que alguns críticos consideram seus melhores filmes, também os preferidos de muita gente. Mas Buñuel também tinha suas preferências e num capítulo muito interessante de Meu Último Suspiro, denominado A Favor e Contra, lista suas aversões e simpatias por muitas coisas e pessoas. Por exemplo (já que este é um site de livros), ele apreciava bastante Jean-Paul Sartre mas achava que Jorge Luis Borges, um bom escritor, era demasiado presunçoso e adorador de si mesmo. Sobre Guernica (1937), obra máxima de Pablo Picasso, de quem era amigo, registrou: “Tudo que posso dizer é que não morro de paixão por Guernica, que não obstante ajudei a prender na parede. Tudo me desagrada nesse quadro, a feição grandiloquente da obra, a politização a todo custo da pintura.” Diz mais, que se pudesse gostaria de explodi-la, mas que estava velho demais para isso.

Gostei bastante do livro de Buñuel e Carrière, mesmo tendo visto poucos filmes da dupla e penso que nenhum dos outros que o cineasta realizou no início da carreira. Isso não quer dizer muita coisa: também li a biografia de Clarice Lispector e embora tivesse lido vários de seus contos em coletâneas de diversos autores, li apenas dois ou três de seus livros. Importa que as histórias reais e as fictícias que Buñuel conta são suficientemente interessantes para que dediquemos algumas horas de alguns dias à sua leitura. Um homem inteligente como ele, uma grata personalidade do século XX, sempre tem algo importante para dizer ao leitor, coisa séria ou algum caso bem humorado. Para mim ele disse muita coisa: foram várias horas de agradável leitura. Aproveitável leitura, na verdade.

Lido entre 27 e 31/08/2020.
comentários(0)comente



Antonio Passos 27/12/2009

Por Cláudio Assis - Caderno Mais! de 27/12/2009
Entre muitos livros sobre o cinema e seus autores, esse é sem dúvida o meu preferido. Ajudado por seu roteirista, Jean-Claude Carrière, Buñuel deu um depoimento sobre a vida, a arte e o cinema, marcado pela simplicidade e pela lucidez.

Neste livro, tece uma delicada teia de memória que nos projeta com leveza nos momentos mais importantes para a arte no século 20. É uma autobiografia que ensina muito mais sobre cinema que mil livros de teoria.

O cineasta surge, sobretudo, como um homem de seu tempo, atento, político e conectado com diversas formas de expressão artística.
Hoje vejo que a importância deste livro é cada vez maior para o cinema mundial, pois nos mostra que o cineasta não é simplesmente um imediatista que procura sucesso ou simplesmente agradar o público.

Ele é muito mais um artesão de sentimentos, comprometido com ideias e ideais.
comentários(0)comente



Le 06/09/2022

Bafão
O livro é uma biografia desse cineasta do surrealismo, me espantou ele dizer abertamente sobre ter entrado em discussão com a esposa de salvador Dalí e seus desentendimentos terem congelado a amizade dos dois expoentes do surrealismo espanhol. Interessante de toda forma, assim como Buñuel, meu estado favorito da existência é dormindo, ou melhor, sonhando.
comentários(0)comente



r.morel 31/08/2017

Resenha Telegráfica
Autobiografia de Luis Buñuel, o surrealista, o contestador, cineasta máximo, inspirado criador de imagens perfeitas. Da Idade média aos sonhos e devaneios aos comentários sobre quase todos os seus filmes Buñuel destrava a memória: livre como o Cinema.

Trecho: “Os devaneios talvez sejam tão significativos, imprevisíveis e intensos quanto os sonhos. A vida inteira, com grande prazer, como provavelmente muitos outros, imaginei-me invisível e impalpável. Mediante esse milagre eu me tornava o homem mais poderoso e invulnerável do mundo.”

site: popcultpulp.com
comentários(0)comente



Barulhista 24/06/2020

Fôlegom
Tudo que precisamos de um livro. Pra passar o fim de semana em boa companhia.
comentários(0)comente



Paulo 09/09/2010

O Anjo Exterminador
Buñuel é um dos meus diretores de cinema prediletos. Com seu habitual humor e agudo senso crítico neste livro de memórias ele traça uma visão personalíssima do século XX.
comentários(0)comente



Roberta 07/03/2013

...
Eu não tenho muito o que dizer... fez-me renovar minha fé totalmente.
comentários(0)comente



Adriana Scarpin 16/01/2019

Passei tempos achando que nunca daria cinco estrelas para um livro escrito por um cineasta desde que Tarkovski acabara com todo as chances com seu estupendo Esculpir o Tempo, mas eis que aparece essa preciosidade de Buñuel (ajudado por Jean-Claude Carrière).
Ao mesmo tempo que não é a obra-prima narrativa que nos deu Tarkovski, é por si um compêndio do século XX, parece-me que não há baluarte daquele século com quem Buñuel não manteve um tête-à-tête, mesmo assim não é bem isso que torna tal livro grandioso e sim a personalidade deliciosa do cineasta.
Sua vida e linguagem é permeada por diatribes incessantes ao status-quo, o que torna suas histórias muito divertidas (assim como seus filmes), mas a verdade é que devo estar dando cinco estrelas ao livro pela minha total identificação ao modo de vida e pensar do cineasta, que me dá um certo alento em meio à mediocridade reinante.
comentários(0)comente



8 encontrados | exibindo 1 a 8


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR