Henrique 25/08/2021
Se Count Zero não existisse, o livro seria muito melhor...
Count Zero é o segundo livro da trilogia do Sprawl e mantém o mesmo ritmo de escrita e desenvolvimento que Neuromancer, porém, agora, trás a presença de três narrativas sendo contadas ao mesmo tempo.
Gibson consegue, de forma muito interessante, dar um ar único a cada narrativa, uma sendo mais voltada para as grandes histórias de espionagem e missões de resgate de grandes corporações, tendo Turner como protagonista; outra seguindo Marly, com uma narrativa investigativa e com um ar contemporâneo, demonstrando que, em meio a todo o desenvolvimento tecnológico criado por Gibson, ainda há pontos naquele mundo extremamente palpáveis à realidade; e uma última narrativa, mais familiar ao leitor, totalmente voltada para o universo cyberpunk, na mesma linha de Neuromancer, que tem Bobby como protagonista.
Todas as histórias começam muito bem, até, duas delas, desandarem sem freios. Marly demonstra um desenvolvimento dinâmico e interessante, com personalidade e questionamentos críveis. Até certo momento, seu núcleo se mantém sólido e entretêm o leitor, mas Gibson parece se perder e a personagem cria uma urgência sem sentido visto que sua personagem já foi caracterizada como de índole não totalmente justa, criando um falso senso de justiça que confunde o leitor e o faz se questionar se a personagem realmente faria suas escolhas durante a história. Bobby sofre um problema contrário a Marly, o personagem é extremamente passivo à história e parece existir apenas para o leitor estar por dentro de revelações da história. Suas interações são mínimas, servindo apenas para passar informações para personagens, não passando de um garoto de recados durante toda a história (pessoalmente, também não gostei da personalidade de Bobby). E, por fim, temos o núcleo de Turner, que divide os holofotes com uma personagem de origem muito intrigante, mas que é muito mal explorada. Apesar de que é muito boa e bem desenvolvida, e, de longe, apresenta os melhores personagens do livro.
Sinto que Gibson tinha uma ideia genial de história, mas pecou em querer dividi-la em mais de uma narrativa. Dentre três linhas de desenvolvimento, temos uma que é realmente boa, que deveria ter tido mais enfoque, e duas que, em certo momento, perdem até mesmo seu sentido de estarem lá, dando um certo sentimento de que o autor está forçando demais estas histórias a estarem conectadas num mesmo livro.
Count Zero é uma leitura interessante para aqueles que querem continuar no universo do Sprawl e buscam por um pouco mais de Neuromancer, porém o que é apresentado como Neuromancer (neste caso, a narrativa de Bobby e um pouco de Turner) é fraco e mal apresentado, com Bobby sendo um protagonista ruim e pouco carismático.