Veneella 25/10/2019Uma fraude, de fatoDepois de ler Mentirosos é impossível não ficar seca em qualquer romance de mistério escrito por E. Lockhart e isso foi o que mais me impulsionou quando saiu Fraude Legítima pela editora Seguinte. Porém, onde o primeiro é impecável, o segundo deixou a desejar.
No livro temos Imogem Sokollof, uma órfã adotada por um casal de ricaços de Nova York, e Jules -Julietta West Williams-, uma órfã que não teve tanta sorte assim. Immie quer ser livre para ser quem ela é, sem pressão e responsabilidades, como toda boa herdeira de respeito, já Jules… não sei bem o que ela quer ainda. Ser como Immie? Ser amiga dela? Ser ela?
A narrativa é bem ao estilo viciante, maravilhoso e misterioso de Mentirosos, onde a linha de tempo retrocede aos poucos, aumentando a visão do leitor até finalmente revelar a pintura completa. É um pouco confuso, mas me fisgou em ambas as leituras. Até aqui o livro estava funcionando pra mim, a narrativa de Lockhart é o que mais adoro no estilo da autora, porém seus personagens se perderam nessa linha confusa de acontecimentos.
Primeiro temos Imogem, que, convenhamos, não cede completamente ao estereótipo de riquinha mimada -embora chegue muuuito perto. Entre romances vitorianos, gentilezas, mentiras e impulsividade, não sabemos ao certo quem é a personagem, deixando uma sensação esquisita. Devíamos gostar dela? Desgostar? Seria ela um daqueles personagens vistos da ótica distorcida da protagonista e, sendo essa a única fonte a qual temos acesso, jamais saberemos a realidade? Talvez e por isso eu talvez também possa perdoá-la, mas não posso perdoar Jules.
“(…) Mas depois todos aqueles livros começaram a me dar náuseas. As heroínas estavam tão felizinhas o tempo todo. O exato paradigma da abnegação feminina. Tipo: “Estou morrendo de fome, mas aqui está, coma meu único pão!”. “Não consigo andar, estou paralisada, mas ainda enxergo o lado bom da vida, porque sou feliz!” A princesinha e Poliana estão vendendo um monte de mentiras horríveis.”
pág. 37
A protagonista desta história é, no mínimo, tão confusa quanto a narrativa, mas nem de longe tão boa. O que ela quer? O que a motiva? Quais são seus desejos, seus medos, seus sentimentos? Jules parece um robô, ela faz tudo de maneira seca, indiferente, sem propósito além da tarefa em mãos que ela simplesmente resolveu fazer, como se outra pessoa tivesse apertado um botão para tal. Ao final de tudo ainda não sei nada sobre ela, não entendi o que a levou a fazer nada no livro e não sei como ela se sentiu sobre basicamente nada do que fez.
Todos os personagens secundários, ao mesmo passo dos principais, também não fazem muito sentido. Forrest, o namorado de Imogem, talvez tenha sido o mais constante e por isso o que mais fez sentido. Ninguém é aprofundado, desvendado, desenvolvido, todos passam como figuras rasas em uma história que não tem motivação para existir.
Fraude Legítima faz jus ao título, me recuso a acreditar que seja a mesma autora de romances como Mentirosos e O Histórico Infame de Frankie Landau-Banks que escreveu algo tão raso e irrelevante.
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