Maria Faria 30/10/2016
Histórias de um psicoterapeuta
O Carrasco do Amor e Outras Histórias de Psicoterapia foi recomendação de uma podcaster e a forma como ela falou do livro me fez correr para o site da livraria para comprá-lo. Sempre quis ler algum livro sobre psicoterapia, mas sempre me preocupei com a veracidade das histórias escritas já que estes profissionais precisam preservar o sigilo dos casos atendidos. Aqui Yalom esclarece que modificou as histórias o suficiente para que os pacientes jamais fossem identificados, mas preservou a essência de cada caso para que psicoterapeutas e pacientes encontrassem em seu livro realidades tão capazes de os fazer sentir parte de cada história. São dez casos escritos como contos. Cada caso aborda um tema diferente e possui sua particularidade, mas ainda assim é possível se identificar com a lição de cada relato. Lendo o livro foi impossível largá-lo até terminar cada história. A curiosidade é atiçada ao limite máximo, principalmente se o mesmo se houver identificação com algum detalhe de cada história.
Comecei a ler o livro antes de dormir e foi uma péssima escolha, pois quase no final as letras começaram a dançar diante de meus olhos. Não encontrei outra solução senão a de deixar para o outro dia. O caso de Thelma, com o título que dá nome ao livro, me fez fazer uma rápida visita em casa em meu horário de almoço já que a vontade de conhecer o desfecho preencheu meus pensamentos.
E engana-se quem pensar que Irvin relatará sessões como um terapeuta perfeito. O autor não mediu palavras para relatar seus erros, pensamentos indevidos e até mesmo seu comportamento às vezes inconveniente, pois, não restará dúvidas após a leitura deste livro: terapeuta também é um ser humano. Sua sinceridade no Capítulo 3 – A mulher gorda – incomoda e causa dúvidas sobre o que ainda poderá ser lido. O psicoterapeuta autor tem uma repulsa por mulheres obesas e para seu castigo, ou redenção, começa a atender uma paciente justamente obesa. Todos os casos possuem particularidades e o que mais ficou claro em todos eles é que a preocupação do psicoterapeuta estava em não tirar do paciente uma “verdade” na qual ele acredita e o sustenta, se não tiver outra crença forte o suficiente para colocar no lugar.
O primeiro caso é de uma senhora de 70 anos que se vê obcecada pelo seu antigo terapeuta, um amor (ou paixão?) platônico que dura oito anos. Ela vive depressiva, lembrando apenas os 27 dias em que viveram um breve romance. O papel de Yalom neste caso foi justamente o de carrasco do amor (olha o título aqui!). Ele passou todas as sessões tentando arrancar esta paixão de Thelma – nome fictício da paciente – para que ela se libertasse da prisão vivenciada por uma paixão avassaladora não correspondida. Seu antigo terapeuta, recém-formado e cerca de trinta anos mais jovem, viveu com ela uma noite de sexo mais vinte e sete dias de romance, abandonando-a de repente sem dar explicações satisfatórias. Ela persistiu oito anos deixando recados em sua secretária eletrônica, passou por sessões de terapia com vários outros psicoterapeutas e não conseguiu se desvencilhar desta obsessão que a perturbava e não a deixava viver. Este caso revelou a impotência do terapeuta diante de um apego profundo do paciente. Por mais que Irvin tentasse, não conseguiu tomar dos braços de Thelma aquele amor platônico que ela cultivava por oito anos. Esse capítulo do livro é uma boa ilustração de que tirar uma ilusão tão profunda sem substituo que preencha o vazio que fica, é quase mais inútil do que deixar a pessoa viver da ilusão. A única saída encontrada pelo psicoterapeuta foi marcar uma sessão para os três juntos: a perdida apaixonada, o antigo terapeuta e o atual terapeuta como orientador do encontro. Será que deu certo? O final deste caso é muito interessante, mas a vida não termina em felizes para sempre como nos contos de fada e enquanto o final de uma vida não chega, não podemos colocar ponto final na história.
No consultório do autor passarão casos que causam empatia e outros que são repulsivos, como o caso de Carlos que mesmo sofrendo com um câncer grave não conseguia conter seus desejos sexuais, a ponto de afirmar que se o estupro fosse legalizado, ele o praticaria.
O livro é sem dúvida uma excelente leitura para pessoas que já fizeram psicoterapia. É possível se identificar com comportamentos e soluções relatadas por Irvin. Para os psicólogos e psiquiatras deve ser também um bom material de estudo, pois em alguns momentos o autor debate temas teóricos, deixando o livro até mesmo um pouco devagar para aqueles que não são estudiosos da psicologia.