A Política da Fé e a Política do Ceticismo

A Política da Fé e a Política do Ceticismo Michael Oakeshott




Resenhas - A Política da Fé e a Política do Ceticismo


3 encontrados | exibindo 1 a 3


Quedali 10/07/2019

Menos do que esperava
Talvez por ser escrito na forma de ensaio, ou por conta de nem mesmo o autor ter se inclinado por sua publicação (pelo menos em vida), o texto de Oakeshott parece ter sido escrito como um guia de idéias e rumos interpretativos a serviço do autor . Às vezes se torna árduo entender um ponto de vista seu a partir da circunscrição histórica e geográfica a qual Oakeshott mesmo se limitou (a política européia moderna, sobretudo inglesa). Seus exemplos não são auto-evidentes para quem não partilha do profundo conhecimento sobre a história política e social de seu país nativo.
É evidente que suas análises e discussões muito devem a Burke. Não vi nada propriamente orginal em dua abordagem, o que nào quer dizer quenão seja interessante ter contato com o texto para se aprofundar nas abordagens e problemas suscitados por um pensador conservador.
Oakeshott em momento algum esconde suas preferências e parcialidades ao analisar as duas categorias de política que conceitua. Ele é bem mais severo com os pressupostos e conseqüências da política da fé do que com às da política do ceticismo.
Sua proposta intelectual neste livro, que volto a dizer, talvez ele mesmo nunca pensou em publicar, não é difícil de ser acompanhada, em tese. Entretanto, a tendência em ligar fatos pouco conhecidos fora do mundo ou esfera anglófilo à propostas interpretativas especulativas, faz com que nos percamos e fiquemos em dúvida sobre a justiça do que Oakeshott nos propõe.
Fiquei com a certeza que este texto não foi pensado para publicaçào fora do âmbito dos países de língua inglesa, pois seus exemplos e discussões são circunscritos, quase que totalmente à política inglesa.
Terei que ler outros livros de Oakeshott para ter certeza, mas este livro me parece claramente um texto preparatório para outras obras ou um diálogo que o autor mantinha consigo mesmo.
comentários(0)comente



Eduardo 23/01/2022

Oakeshott faz ótimo trabalho ao analisar a política europeia moderna e demonstrar que ela se desenvolve na relação entre dois estilos diferentes (e extremos) de fazer política: a política de fé e a política de ceticismo.

A primeira, tente alcançar a “perfeição” humana e utiliza o Governo como uma ferramenta para se alcançar esse fim último da humanidade. A segunda, a seu turno, não acredita em “perfeição” humana e é extremamente cética no que diz respeito ao uso do poder governamental. Justamente por isso, utiliza o Governo tão somente como uma ferramenta de estabelecimento de ordem social e manutenção de um sistema de direitos e deveres. E ambas, quando agem sozinhas e sem o contrapeso da outra, são autodestrutivas (o que ele chama de “nêmesis”).

A escrita é fluída e a análise desenvolvida, em que pese seja bastante direta, é bastante profunda. O autor não esconde sua preferência: como um autor conservador, ele demonstra uma clara preferência pela política de ceticismo, tradição a que pertencem nomes como Hume, Burke, Locke e Hobbes.

Talvez seja por isso que ele “pega mais pesado” com as críticas à Fé do que ao Ceticismo. Isso fica claro quando o autor deixa claro que a nêmesis da Fé ocorre pelo seu excesso de vícios, enquanto a nêmesis do Ceticismo ocorre pelo seu excesso de virtudes.

Oakeshott não dá nenhuma solução pronta, mas esboça o que qualquer agente político prudente deve fazer diante dessa polaridade: buscar uma zona de equilíbrio, evitando que os dois estilos de política se destruam, seja pela destruição da política ocasionada pela Fé, seja pelo imobilismo ocasionado pelo Ceticismo.
comentários(0)comente



Sam 18/01/2019

Resumo - Para versão completa acesse https://samuelisidorosanto.wixsite.com/resumoadireita
A Política da Fé e a Política do Ceticismo - Michael Oakeshott - Resumo

Prefácio: Pondé e Timothy Fuller apresentam essa obra praticamente desconhecida de Michael Oakshott. A visão deste autor é conservadora, mas ele não exclui a possibilidade de se acreditar um pouco no potencial humano para grandes empreendimentos. Mas seu apelo socrático é frequente, onde expõe sua visão cética da capacidade intelectual humana de moldar a realidade.
Essa obra foi escrita pelos anos de 1940, ou seja, quando o mundo começava a descobrir a falácia social que era o regime soviético. Por ser muito crítico de suas próprias obras, ele não a público. Estes manuscritos só foram descobertos depois da sua morte na década de 90.
Para ele, a melhor forma de governo é aquela que não tenha concepções de mundo, que não deseja “evoluir” a humanidade. O governo deve ser que nem o alho na cozinha, que se gosto só se perceba quando faz falta.
A obra mostrará os desdobramentos de duas visões politicas: a da fé e do ceticismo. Estes conceitos aqui não estarão associados com seus imperativos religiosos. Porém, vale o adendo que, após a secularização do mundo, uma versão mais crente da política foi desenvolvida. Hoje aqueles que não acreditam em deus, voltaram seus olhos a "infinita capacidade humana" e por vezes cometem erros de julgamentos políticos devido a isso.
Para o autor, a melhor busca por perfeição deve ser a interna, e não uma geral comandada por políticos. “Numa sociedade muitos podem fazer melodias, mas não podem ser orquestrados por um compositor”.
Oakeshott não achava que explorar filosoficamente a politica pudesse produzir uma doutrina simples e unificada. O estudo filosófico da politica como a entendeu não é uma forma mais elevada de defender politicas, é sim entender de determinada perspectiva, o que os agentes políticos não podem assumir com facilidade.
Os céticos não acreditam na capacidade infinita humana, os não céticos acreditam e não podem conceber uma politica que não busque esses fins, assim, esse ensaio se mostra uma visão contra o excesso politico que surge dessa visão crente do ser humano.

Capítulo 1 - Introdução
I
Por se considerar um individuo levemente acima da média de seus companheiros intelectuais, o autor focará em reflexões de filosofia da politica moderna, essa caracterizada por ele como a politica surgida depois da revolução francesa. Focará na politica europeia e se preocupará em específico com o governo, ou mais especificamente, com a atividade de governar e ser governado.
A pergunta ser respondida aqui é “o que o governo deve fazer?”, em geral a pergunta feita é “quem deve nos governar?”. Essas ações que os governos tomam pode parecer algo para uma pessoa determinada, outra para alguém com visão diferente, mas a resposta que importa não é a ação ou seu significado, e sim o caráter concreto da ação em seu contexto de atividade, isto é, qual era a razão baseada no escopo politico daquela determinada ação (historicidade, ideologia etc).
O que é próprio da função do governo mudou com o decorrer do tempo porque nossa própria concepção de governo mudou. Na idade média, por exemplo, não conseguíamos desvincular a pessoa do politico (reis eram reis), hoje, vemos indivíduos que podem tomar atitudes que individualmente não os faça bem, mas para o todo isso pode ser útil. Três elementos são cruciais para se compreender essa dimensão da ação governamental perante a história, o padrão da prática, o discurso e os escritos, a primeira é a mais confiável, a segunda é a mais abundante e a terceira é a mais difícil de interpretar.

II
Partindo então de governos preexistentes, percebemos que eles cresceram tanto em tamanho quanto em funções. Isso se deve as composições histórias a que os governos e os governados passaram, estes foram agregando elementos e colocando-os todos no escopo do estado. Isso pode ser exemplificado nas experiências educacionais, que a princípio não eram da alçada do estado, mas com a experiencia em alguns locais, os estados perceberam sua utilidade, e as incorporaram. Essa heterogeneidade também promoveu a reinterpretação das leis, que estão cada vez mais inflacionadas devido ao positivismo jurídico. Não só as leis mas como o vocabulário politico mudou, palavras como fascismo e democracia tomam ideias diferentes para diferentes grupos.
Mas não é devido a benesse de uma ação que ela deve ser prontamente aceita. Nada impede de que uma ação que não foi feita tivesse sido melhor. Isso é exemplificado nos extremos políticos, que por vezes são aceitos e até confortáveis para aqueles que convivem, por simples impossibilidade de imaginar outra situação, não são poucos os relatos de pessoas que sentem falta de ditaduras. Assim, a politica moderna é heterogênea e complexa, sendo suscetível a ser tomada pela ambiguidade.


III
Ambiguidades e ambivalências são importantes no processo politico pois definem sentido e valor. As ambiguidades de certas palavras e conceitos dependendo da visão politica são curiosos, como os vários sentidos que o conceito de liberdade ou mesmo a palavra liberal tem em determinados locais.
Estas não são fenômeno moderna, já acontecem desde a Revolução Francesa. Elas são símbolos de uma profunda divisão dentro do nosso modo de governar. Esses polos externos são a anarquia e o coletivismo. Para o autor, existe uma região dentro desse espectro que é a versão ideal do que a politica deve ser.
Tendo esses conceitos em mente, o objetivo principal do autor será examinar o diagnóstico da atual situação política, discutir o que ela significa e dela extrair algumas conclusões teóricas e práticas. Esperasse encontrar com essa investigação não uma versão que rejeitará ambiguidades por uma resposta absoluta, mas sim uma resposta com historicidade.

Capítulo 2 - Identificação da Ambiguidade
I
O autor mostrará a ambiguidade de determinados conceitos e ideias nas visões céticas e da fé na politica. A analogia com arquitetura esboça a ideia proposta, pois nas várias formas arquitetônicas aparecem elementos de beleza que podem ser reinterpretado dependendo da visão de quem a admira.

II
A politica da fé acredita que governar está a serviço de levar a humanidade a perfeição. A ideia de salvação, ou seja, de levar as pessoas a um futuro único e melhor está sempre presente. Pode este parecer um fenômeno iluminista moderna mas já data desde o século XVI.
A ideia de futuro perfeito, para os governantes, não se preocupa muito como será essa perfeição, mas sim se preocupa com o caminho que se deve seguir para alcançá-lo. A função do governo é encaminhar as pessoas por esse único caminho.
Para que isso seja possível, o governo tem atribuições ilimitadas, não se moldando apenas a, por exemplo, a segurança, como pregam os minarquistas. Assim, quanto mais poder o governo tiver, melhor será para todos. O poder alcançado pelo governo é sempre visto como algo positivo.

III
Não deve se entender a politica do ceticismo como os argumentos lógicos contrários a visão exposta, e nem como os adversários históricos a políticos que propuseram essas ideias. O ceticismo nunca é absoluto pois isso é um erro lógico a priori. Aqui o governo não deve se considerar um arquiteto para o futuro melhor de todos, mas também não deve se eximir de suas responsabilidades. Estas estão intimamente ligadas com a justiça e o direito.
As leis num governo cético deve seguir a história, pois ignorá-la é não levar em conta o esforço dos antigos em manter a ordem vigente, e por consequência, acreditar que na mente de quem legisla pode estar o caminho para a “salvação” da politica da fé. Dentro desse limitado escopo, as melhorias legislativas podem ser procuradas.
A atividade de governar não está acima de nenhuma outra no que se refere a importância, este ato não deve ser feito com êxtase, e sim com minuciosidade, para que, como o alho na cozinha, só se sinta a falta quando não exista.

IV
Os extremos das duas ideias são totalmente abstratos, mas podemos compreendê-los com o ferramental que nos foi dado historicamente, por mais que existam as ambiguidades de conceitos já citados. Estas datam da época de Roma, na importante frase politica “populi suprema lex esto” que teve seus termos totalmente moldados a visão da politica regente de cada época.
Essa ambiguidade se reflete na questão do direito de forma relevante. Podemos estudar a compreensão do direito como uma linha que vai de um extremo da interpretação a outro dependendo da visão politica. Quando Jefferson citou o direito a vida nos Artigos Federalistas, estava bem claro que a ideia era de proteger a própria vida, mas hoje existe a interpretação, por parte de algumas pessoas do lado esquerdo do espectro politico que esse direito se refira a desfrutar de certo tipo ou padrão de vida. A busca da felicidade, também citada por Jefferson não corre sobre esse problema pois está fixo o processo de busca, e não de finalidade. Essa reinterpretação positivista do direito que nos faz incorrer em absurdos como leis que tentam ditar comportamentos alimentícios entre outros.

Capítulo 3 - Contingencias da fé
I
Diferente do que muitos imaginam, a politica da fé como descrita nesse livro não data da era do Iluminismo, mas sim de períodos anteriores, desde o século XVI. Este tipo de politica não foi o estopim para o aumento do poder dos governos, mas sim uma causa desse aumento ocorrido em épocas remotas.
Em comunidades primitivas não é possível que esse aumento acontecesse, pois as atividades a serem controladas não são discrepantes, pois nasceram e cresceram juntas com o governo. Um dos motivos para que este controle fosse aceito pela massa é a aparência de ordem que um governo centralizado dá, nas palavras de Macaulay “uma insurreição ocorria quase tão facilmente como uma petição hoje em dia”.
O começo desse aumento do poder do governo pode se dar em dois níveis: nos séculos XI e XVI houve a centralização na figura do rei e a participação do governo em uma porção maior do aumento da capacidade técnica.
A mão do governo ia chegando a todos os locais, diminuindo assim o poder de autoridades intermediarias. "Sem facilidade de movimentos e comunicação, sem um pronto fornecimento de papel e tinta, sem aqueles informes e registros que sempre surgem quando papel, tinta e curiosidade humana se unem, sem linguagem comum, ou seja, sem a técnica moderna por parte dos homens mas na mão do governo, foi fácil abrir caminho para o maior poder do governo e a busca por seus projetos.
O governo da fé é aquele que quer controlar as ações dos cidadãos para a utilidade do governo, dentro deste conceito, Francis Bacon foi o primeiro expoente. Alguns poderiam arguir que Maquiavel foi anterior, mas ele acreditava num príncipe que lidasse essencialmente com questões de defesa, e não que buscasse obter súditos que pensassem e fizessem atividades em favor do governo e da perfeição.
Essa perfeição, nos escritos de Bacon, estaria associada com a Queda, com aquele conhecimento e poder unidos com Adão e Eva tinham, mas lhe foram tirados pelo Criador. Bacon, diferente de seus posteriores intelectuais da era iluminista, não acreditava que as mentes do passado eram totais ignorantes, de tal forma que ele menosprezava seus contemporâneos, o que lhe freava um pouco as ideias de perfeição, por mais que pensasse existir um caminho único para isso e fazer o povo seguir por esse caminho era a função do governo. Da parte das pessoas, isso só seria possível, nas palavras modestas de Bacon: com fé na redenção da humanidade na história e pelo esforço.
O governo teria a incumbência de levar as pessoas ao bem-estar, e para isso devia dar conta de questões bem individuais como cuidar do desperdício e da ociosidade. Sua função mais geral como governo seria supervisionar a indústria e o comércio, aprimorar a agricultura, regular os preços, etc.

II
A política da fé (esse empreendimento da direção minuciosa, por parte do governo, de todas as atividades do indivíduo a serviço da perfeição, em que “perfeição” é entendida não como um tipo de caráter humano, mas como uma condição das circunstancias humanas) é ambígua. O que levou o surgimento de várias formas diferentes dessa politica no século XVI. A ideia mais geral presente em todas essas ideias era a importância do poder: o governo deveria ter poder, e quanto mais o tivesse, melhor seria, pois assim poderia agir de forma mais enérgica em direção da perfeição.
Duas versões dessa politica podem ser vistas a princípio: a versão religiosa e a versão econômica. Na religiosa, florescia os movimentos protestantes, que associavam a posição dos governantes como que imbuídos do poder de deus na Terra. Puritanos e membros da Quinta Monarquia são exemplos dessa versão.
Na versão econômica, os poderes do governo são empregados na direção e na integração de todas as atividades dos indivíduos, de modo que convirjam na busca de uma condição das circunstancias humanas, como bem-estar e prosperidade. O produtivismo é uma dessas visões, ela se encaixa bem a ideia de Bacon, pois buscava um governo que controlasse todas as ações dos seus governados, para que os mesmos agissem de forma economicamente ativa. Várias atitudes individuais são rechaçadas para o bom funcionamento dessa visão, como transformar a ideia de segurança em bem-estar, elevando-a a um tipo de salvação. O trabalho aqui começa como um direito e depois acaba como um dever.
Essas práticas (lembremos, que datam dos séculos XVI-XVII) já tinham elementos de vigilância e controle vistos em sociedades comunistas.

III
Em síntese, três conclusões podem ser retiradas aqui sobre a politica da fé: que ela não é um invento recente, pois suas ideias já datam do século XVI. Que ela não deve ser identificam com nenhum movimento político concreto, partido etc, pois seus elementos estão presentes, em maior ou menor grau, em todos as ideologias politicas. E terceiro, que ela não é, nem nunca foi, o único, ou o único significativo, estilo de forma de compreender a política que a história do mundo moderno revela. Por mais que seguidores de Gramsci tentaram destruir qualquer conceito ou ideologia que está a direita do espectro das ideias, elas estão presentes na história e na atualidade.

Capítulo 4 - As Contingências do Ceticismo

I
As politicas do ceticismo também necessitam de contingências para serem aplicadas, a mais obvia é a contingência a priori de que é necessária a presença e não a ausência de poder.

II
A plausibilidade de considerar o ceticismo como o mero adversário da fé reside na situação histórica do início da era moderna, quando a corrente apontava para a politica da fé e o ceticismo, para esse momento importante, surgia como um impedimento. Um exemplo disso são as concessões pedidas por industriais, que se achavam como o motor do desenvolvimento da humanidade, o que ia contra a tradição liberal desenvolvida por toda a idade media.
A partir do século XVII, muitos políticos ingleses consideravam certas atitudes que o governo estava tendendo como erradas. Uma delas eram as regulações de mercado. Foi nessa época que surgiram nomes importantes para o conservadorismo como Hume, Burke, Benthame Macaulay. Adam Smith pode entrar nesse seleto grupo devido a algumas interpretações que teve dos erros que os governos cometiam em sua ação planejada economicamente: interpretação otimista do comportamento humano, tendência de empobrecer a humanidade ao reduzir sua atividade aquilo que poderia facilmente ser controlado pelo governo, equivocado conceito radical acerca do significado político da propriedade privada, o fato de levar a lei ao descrédito ao exigir que ela tentasse o que não poderia realizar, e sua promoção, dentro e fora do país, daquela insegurança que, em sua opinião, deveria mitigar o governo como sua principal função.

III
Novos nomes vieram no decorrer do século XVII, como Hobbes, Espinosa e Milton. Em especial Milton acreditava no puritanismo (já citado anteriormente) este que leva, erroneamente, um credo de certos intelectuais sobre toda a consistência da politica da fé no conceito de “pecado original”.
Montaigne, outro pensador importante da época, não tinha ilusões a cerca do poder. Não acreditava que alguém poderia estar tão seguro a ponto de dirigir toda a energia e a atividade da humanidade para alcançar um fim que não se entendia.
A Inglaterra usufruía de uma tradição que datava da época medieval, de hábitos e instituições que não precisava de nenhuma interpretação sofisticada para divulgar o modo de compreender o governo no estilo cético.

IV
Algumas revoluções deram início no século XIX, nelas podemos perceber as ideias de visão cética, como na Revolução Americana e no começo da Revolução Francesa, que descambou ao poder total a seus revolucionários, ou seja, visão da fé.
Neste ponto da história ocorreu umas das grandes vitórias da politica do ceticismo, que foi distinguir política da Religião (por mais que Santo Agostinho já tivera proposto isso em tempos remotos).
Vimos que as ideias da politica do ceticismo datam da idade média, mas foi entre XVIII e XIX que elas ganharam trajes modernos, nos textos de Hume e principalmente Burke. Alguns movimentos políticos importantes foram frutos desses estudos, mas acabaram descambando em problemas, como o republicanismo e certas interpretações do direito natural.
Ter uma boa interpretação dos direitos naturais, que essencialmente falam do direito a vida, a propriedade privada e a liberdade, de forma negativa, era importante, isso foi feito nos textos de John Locke, Burke e Hegel.
O republicanismo foi tomado por positivistas como Conte e Sydney, que acabaram o levando para mais próximo da visão da fé, onde buscam em Bacon a ideia de que o povo poderia buscar o “bem comum” e assim o governo tinha o papel de guiá-lo.

V
Como regra, as politicas do ceticismo tem desfrutado de um grau maior de autodisciplina e autoconhecimento, e raras vezes pretendeu parecer algo mais importante do que é. Ocorre que nos últimos 100 anos, devido a fortes pressões do meio "intelectual", seus pensadores foram deixados de lado, e algumas de suas ideias reinterpretadas negativamente, como por exemplo, a repartição dos 3 poderes. A princípio era uma forma de reduzir o poder, mas acabou se tornou num jogo de tomá-la da-cá.
Conclui-se a importância da politica do ceticismo, que em hipótese alguma é apenas uma contramão da politica da fé, mas sim é de onde a compreensão da função do governo deriva.

Capítulo 5 - A Nêmesis da Fé e do Ceticismo
I
O movimento politico na Europa é heterogêneo, e tem dois polos opostos, a politica da fé e do ceticismo. Essa ambiguidade da linguagem politica não decorre de nenhuma corrupção temporal, mas do fato de que temos a nossa disposição o mesmo conjunto de palavras para expressas diversos entendimentos sobre o que é governar.
Para o autor, essas duas formas de governo tem suas nêmesis (uma consequência má) quando aplicadas a seus extremos. Caso conseguisse destruir o oponente, haveria destruído a si mesmo também, e isso, para o autor, é um dos motivos de que só existiram politicas que, em algum nível, tinham elementos dos dois polos.

II
Sendo a sociedade europeia uma organização complexa, existem várias atividades que as compõe. Como dizia Adam Smith, é uma falha da politica coletivista limitar os governados apenas a atividades que o governo consegue controlar, mas para a argumentação feita aqui vamos supor essa possibilidade.
Essa direção escolhida pelo governo pode ser tomada de modo gradual ou revolucionário, mas nunca é um caminho inteiramente novo, já existe uma ideia de perfeição a modo dos que estão no governo, e essa será buscada com todo o poder possível de ser obtido, não fazê-lo seria um erro para eles.
Com a ideia de perfeição em mente, um politica da fé ao extremo acredita que todas as atividades devem ser feitas em função do encontro dessa perfeição, mesmo os prazeres como futebol ou artes só existem na medida em que promove a perfeição. Esta ideia é levada a todos os níveis de uma sociedade, não havendo assim diferença entre governar e dirigir uma empresa. Todos os indivíduos e todas as suas atividades se tornam em função desse estado que levará a perfeição.
A ação do governo na Europa moderna já segue parte dessas leis, os dois principais elementos já estão postos: a submissão da sociedade a manutenção da submissão em uma única direção de atividade.
Uma versão da politica da fé, como já citada, é a “retidão” baconiana. Elementos dela ocorrem na visão extrema quando associamos o conceito de salvação ao caminho da perfeição que somente o governo pode induzir. Ela acaba por fazer o individuo não só escravo do estado, mas de sua própria metafísica, que agora terá que ser devoto dessa perfeição, e por consequência devoto do governo, buscar com fervor esses elementos. Ser o “Cavalo Sansão” da Revolução dos Bichos.
Supondo a situação (que nunca ocorreu) de um desses regimes chegar a perfeição prometida. Os indivíduos desse lugar só poderão pagar com ódio, sendo essa perfeição um grande ou um pequeno prêmio. Na observação de Tácito: “Os benefícios recebidos são um deleite para nós, desde que pensemos que seja possível pagá-los; quando essa possibilidade é amplamente excedida, os benefícios são pagos com ódio em vez de gratidão”. Ou seja, as pessoas se tornariam mesquinhas, e não teriam o empenho para, por exemplo, direcionar seus intuitos para o futuro.
No caso de que a perfeição não chegue, os membros da massa podem sofrer da incessante busca por ideais que nunca serão obtidos em seu tempo, mas no tempo de filhos ou netos, e estes o verão como os grandes pioneiros do Admirável Mundo Novo.
Outro elemento importante da busca da perfeição é a segurança. Esta tem limites importantes pois, a condição de segurança absoluta é também uma condição de precariedade absoluta. Apenas numa situação de igualdade e total controle, o que só seria possível em situações frágeis, é que essa segurança total poderia ser exercida. Nenhuma comunidade pode desfrutar de uma segurança abrangente sem um domino absoluto do mundo, e nenhum individuo pode desfrutar de uma segurança total sem submissão completa a um poder suficientemente grande para exercer esse domínio. É somente quando o individuo se reduz a nada, dando todo seu pequeno poder a um grande monopólio, que esse tem a possibilidade do controle total da segurança, mas, sem dúvida, terá o controle total sobre o individuo.
A autolimitação, quando analisada na visão da fé da politica, mostra algumas incoerências a priori. A perfeição, em virtude de sua própria falta de limites, é incapaz de autolimitação. Isso acaba por criar elementos que vão se retroalimentando, independente de existir uma necessidade mercadológica para a mesma. Podemos ver isso na educação, por exemplo, onde vários estudos sobre temas que não são de interesse publico algum são pagos pelos contribuintes, apenas pela possibilidade de abrirem caminhos para um “mundo melhor”.

III
O fracasso da política cética é menos devastador e mais sutil. Ele não é o extremo oposto do controle total e busca da perfeição da politica da fé. Neste tipo de politica o problema é a passividade.
O fato da politica do ceticismo não ter grandes objetivos acaba por fazê-la ser mais devagar e menos enérgica em relação a problemas que as pessoas possam perceber. Diferente da politica da fé, que toma tudo em modo de emergia, e encima disso se torna soberana, tomando atitudes ilegitimas sobre seus governados, a politica do ceticismo age, neste caso de inconveniência, sem intenção, com vontade de não fazê-lo. Uma comunidade que vê o estado como seu "pai" não terá com bons olhos esse tipo de governo, que espera de seus governados as soluções para seus próprios problemas.
A politica, para os céticos, acaba virando um jogo, onde não existe vontade de se obter um resultado, nem energia durante o processo. A guerra ideológica é sempre amistosa, a oposição é tratada como um amigo, ao qual se deixa ganhar as vezes para ficar feliz.

IV
Caso a nêmesis da visão cética fosse o anarquismo, na visão do autor seria uma contradição e a levaria a autodestruição. A mesma autodestruição que a politica da fé chega por seus próprios meios. Assim, para o autor, a única forma dessas duas visões se autodestruírem é quando elas buscam elementos uma a outra:" enquanto o influxo do ceticismo pode resgatar a fé da autodestruição inevitável, o influxo da fé salva o ceticismo apenas de uma provável autodestruição".
Diferente da visão da fé, a do ceticismo tem uma autolimitação, o que lhe permite ter voos mais baixos, preciso e efetivos. Na alegoria de Oakshott: “O pródigo pode dispor de tudo o que possui e mais um pouco, contudo, mesmo o avarento precisa gastar algo; o atirador de elite, cujo primeiro tiro fica aquém da marca, pode ver onde a bala caiu e se corrigir, podendo acertar o alvo na próxima vez; mas o atirador cujo primeiro disparo voa além do que a visão pode acompanhar, não está mais perto de acertar o alvo do que se nunca tivesse disparado antes”.

Capítulo 6 - Conclusão
I
Ao nos distanciarmos da barbárie, sobra espaço para realização de atividades. Assim, surgem dois campos de visão politica antagônicos no berço da civilização ocidental, a visão cética e a da fé. Essas posições são a cargas que estão dos dois extremos da nossa atividade politica, e moldam toda a amplitude desse movimento.

II
Estas visões destoantes acabam criando ambiguidades de termos importantes para a politica, sobre o que seria igualdade, liberdade etc. A primeira conclusão é que essa ambiguidade deixe de existir, isso simplificará a politica. Criando um padrão simples e removendo acréscimos criados para reiterar movimentos políticos de determinadas épocas, essa missão pode ser feita.
Cada um dos estilos políticos deve deter a virtude da simplicidade, mas de acordo com o autor, nenhum deles é capaz por si só de ser um estilo concreto de atividade politica.

III
Sendo a politica complexa, devemos então aprender a explorar suas virtudes. O autor impõe que a única forma de explorar por completo é buscando um “ponto médio”. Foi, nos escritos de grandes pensadores como Locke, Berkeley, Hume etc que a visão cético ganhou contornos de intelectual, o que permitiu um pé de igualdade com os vários pensadores de esquerda do século XVIII. Como um estivador (Aquele que aproveita o peso para manter o barco em equilíbrio) um politico deve agir, percebendo a carga que as duas visões causam na politica e utilizá-las da melhor forma possível. Em uma palavra, a politica da média na ação é a adequação.

IV
A observação de propostas politicas não serve para uma analise geral, pois ocorrem em situações bem específicas. Isso pode ser uma medida perigosa e cara, e governos que buscam a perfeição tendem a fazê-lo. Assim, buscar nos escritos de pensadores como Burke uma visão a priori do que deve ser feito em politica pode resumir muitos grandes problemas

V
A única forme de eliminar a ambiguidade da política é pela imposição de um caráter simples (uma única direção da atenção) que atualmente não existe. Isso também se deve ao fato de que a política não é a atividade que propõe provar ou elucidar argumentos, mas sim a conservação entre interesses diversos.
Podemos esboçar essa situação com a palavra democracia, que é vista como positiva pelos dois tipos de politica. Na da fé ela é melhor que a monarquia porque gera mais poder, na do ceticismo, porque protege a comunidade contraprojetos do governo. Toda essa ambiguidade mostra que é impossível impedir que o governo imponha um padrão único de atividade a comunidade pois a qualidade da democracia não é intrínseca a ela, podendo operar em qualquer dos estilos correntes de governo.
Quando perguntaram a Confucio o que ele faria se fosse governante, ele disse: “A única coisa necessária é a retificação dos nomes”. Ou seja, nada pode ser endireitado enquanto as palavras forem ambíguas. Buscar o melhor uso do que é estudado, reduzir conflitos secundários e afirmar a inconsistências de discrepâncias falsas serão então o caminho para a melhora.

Posfácio
Um professor de direito da UFRGS resume um pouco a vida de obra de Oakshott. Este autor que é expoente do pensamento conservador mas pouco conhecido no Brasil, principalmente por sua obra não ter sido traduzida até agora. Suas principais obras tratam da divergência entre pensamentos de uma forma bem metafísica, ou seja, não existem soluções para problemas concretos, mas a ideia geral para isso está presente.

site: https://samuelisidorosanto.wixsite.com/resumoadireita
Thiago 27/08/2019minha estante
?tima explanação. Obrigado!




3 encontrados | exibindo 1 a 3