Andre.Pithon 18/09/2022
Bingo de Fantasia/Sci-fi do Reddit
5.5 - Relações Familiares (Modo difícil: Envolvendo 3 gerações distintas)
Quando eu escrevo, eu gosto de ser subjetivo. Meio púrpura. Buscar não só a história, mas a beleza nas palavras, ordenar em um ritmo agradável, esconder significados detrás das linhas, nunca simplesmente dizendo algo que pode ser mostrado, muitas vezes até arriscando confundir o leitor. Capítulos que por vezes são mais prosa que trama, um mundo nublado pelo viés dos personagens.
Jade War é a antítese do meu estilo pessoal. E ainda assim é magnífico.
Uma mistura de fantasia urbana, drama familiar e guerra de gangster, toques de geopolítica, uma pitada de romance trágico. Atravessa a fronteira do que deve ser considerado ou não fantasia chegando próximo do real, muito mais Godfather que LotR.
O livro foca na família dos Kaul, todos seus membros, como suas histórias se cruzam e deformam, em sua eterna luta para manter o controle sobre Kekon, em uma guerra velada contra o principal clã inimigo, Ayt. É uma história que se desenvolve em quase cinco anos, e dá tempo dos personagens crescerem, e mudarem, e suas vidas se transformarem. Mas não é só a vida deles que muda, mas o mundo, com guerra estourando entre as duas grandes potenciais mundiais, e Kekon se vendo travada no meio, sua vida tradicional baseada em clãs e honra ameaçada, pressões internacionais, acordos comerciais, tráfico explodindo, o mundo tornando-se mais complicado.
O segundo livro conserta todos os problemas que eu tinha com o primeiro, o qual parecia mais uma grande introdução. E realmente era, as peças ali posicionadas se movem de uma forma incrivelmente satisfatória aqui, o mundo se expande, e os momentos grandes batem forte, dramáticos e intensos. O livro também não termina sua história, mas a avança muito bem, e com o terceiro livro já escrito, e a saga terminada, podemos contar com Fonda Lee para terminar suas histórias, coisa rara no gênero. Não a toa essa saga é um dos mais influentes pilares de fantasia desses últimos anos.
Eu gosto como os protagonistas não necessariamente são as pessoas lutando pelo lado certo. Como existem argumentos de que ideologia é ultrapassada, e que o mundo deve avançar, mas eles lutam pela memória. Gosto como os Ayt, e a Pilar da Montanha, grandes antagonistas da história, talvez não sejam tão antagonistas assim. Pela perspectiva de Ayt Madashi, nada que ela fez foi errado. E eu não consigo discordar completamente. Há muitas atitudes extremamente questionáveis do lado que acompanhamos. Tudo é cinza, mas sem ficar se autoparabenizando "hehe personagens cinzentos OLHA QUE LEGAL OLHA COMO SOU FICÇÃO ADULTA" como certos livros por aí. Tudo é intrigante, bem construído, politicamente suculento.
Eu gosto de política gente, é uma forma ótima de elevar um livro. Tiveram momentos perto do final que ri em choque e admiração. Fui pego de surpresa. Quase chorei. Nada melhor que ler capítulos inteiros com um sorriso no rosto.
E sobre a escrita? Foi assim que comecei, não é? Assim devo terminar.
Ela é seca. Ela não é descritiva, mas extremamente objetiva, com poucas tentativas poéticas, se carregando unicamente na trama e no diálogo. Nas poucas cenas de ação consegue ser poderosamente visual, uma das mais simultaneamente evocativas e fáceis de seguir que já li. Muitas vezes o narrador dá uma afastadinha para explicar alguma coisa, ou se aprofundar em algum aspecto do mundo, quase infodumps, mas não cansa, mesmo nesse colosso de 600 páginas. Sanderson, o grande nome da fantasia contemporânea é famoso por um estilo similar, prosa funcional, mas o acho entediante nesse aspecto, até repetitivo. Lee não, existe um movimento, uma aceleração, um ritmo magnífico em seus capítulos curtos e prosa direta.
Baixei esse romance para ler na rua, para pontos de ônibus e na aula de Discurso. Não consegui me segurar, preso, cada momento livre era o ReadEra que eu abria no celular na fome de consumir mais um capítulo.
E honestamente?
Eu adoro o meu estilo pessoal, de ser exagerado e melancólico, de deformar o mundo pela ótica do narrador do momento, objetividade que 🤬 #$%!& . Não tenho nenhuma intenção de mudar.
Mas como é bom adorar algo completamente oposto.