Ramires6 12/07/2010Vôo perfeito, pouso desastroso.
A narrativa começa meio morna, com a pequena órfã Florence contando (em 1ª pessoa) sua história ao lado do seu meio-irmão Giles, mantidos por seu misterioso tio – que jamais viram – em Blithe House, uma distante e decadente mansão situada na Nova Inglaterra de 1891.
O início revela a proibição de que a menina aprenda a ler, fato que ela contorna rapidamente ao descobrir a enorme biblioteca do casarão, aprendendo a ler em segredo e tornando a leitura a sua principal atividade na monotonia em que vive (não considere isto como uma revelação do enredo, pois é um acontecimento irrelevante na estória, e seu título deve ter tido essa tradução do original “Florence and Giles” provavelmente para tomar emprestado o sucesso do fantástico “A menina que roubava livros”).
O enredo começa a tomar corpo, tornar-se interessante e cativar o leitor com a introdução de novos personagens, como Théo e a Srta. Taylor, quando fatos inexplicáveis, misteriosos e até sobrenaturais começam a ocorrer, ameaçando a segurança de seu amado irmãozinho Giles. Neste ponto Florence passa a travar uma batalha cerrada com a preceptora do garoto, se valendo de toda sua inteligência e ardis possíveis e imagináveis para impedi-la de roubar-lhe a pessoa a quem mais ama no mundo.
Na sinopse divulgada pela editora, várias perguntas são jogadas no ar, tais como: Quem eram seus pais? Por que Florence sonha sempre com uma misteriosa mulher ameaçando Giles, seu irmão caçula? O que esconde a Srta. Taylor? E por que o tio a proibiu de ler? No entanto, pasmem: nenhuma delas é respondida ao final do livro.
O autor deixa algumas pistas do que realmente poderia estar ocorrendo, mas tudo é muito vago e, no final, a máxima de que “o bem sempre vence” é deixada de lado e o desfecho final deixa muito a desejar, não por fugir do clichê ou do politicamente correto, mas por desrespeitar a inteligência do leitor simplesmente ignorando as respostas que são esperadas desde o início da leitura.
Por diversas vezes, nas críticas e na própria divulgação da obra, são citadas semelhanças do estilo do autor com Edgar Allan Poe e Henry James, como se isto pudesse justificar o final ambíguo, mas convenhamos: John Harding não é e nunca será nem Poe, nem James.
Este foi um livro que me prendeu a atenção desde o início da leitura, apesar de notar uma grande semelhança de cenário (e até de alguns personagens) com “O Jardim Secreto” de Frances Hodgson Burnett, tendo chegado a cogitar colocá-lo entre meus seletos livros de cabeceira, mas a constatação de um final um tanto forçado, talvez até mesmo visando chocar e surpreender, me decepcionou.
Muitos poderão declarar que adoraram o livro pela simples razão de seu final não seguir o tradicional e esperado, mas minha opinião é de que uma boa obra deve ser como a confecção de uma teia: o autor pode seguir em diversas direções, até inesperadas, procurando envolver e prender seu leitor, mas ao final ele precisa juntar todas estas linhas com um grande e forte laço, para impedir que todo o seu esforço caia por terra com seu próprio peso.
Na minha opinião, pelo nível do argumento que John Harding demonstrou até pouco antes de seu epílogo, sua idéia de “um final diferente” deixou muito a desejar, e considero esta obra como algo que tinha tudo para dar certo, isto se o seu autor não tivesse se perdido na sua conclusão.