Desi Gusson 16/03/2012
Saboroso
Falar de Escola de Sabores sem usar experiências pessoais é uma tarefa basicamente impossível. O livro não te deixa escolha, você se identifica com uma das personagens, ou se identifica com todas.
Mas, para começar, a estória chega até você mais cedo ou mais tarde, de forma delicada, e quando vê, já está mais leve por dentro.
Para Lillian, a professora dona do restaurante, a comida cura tudo. Não de forma direta, como os remédios, mas de uma maneira mais duradoura, pois ela leva a pessoa a se curar. Fosse a depressão da mãe; a auto-anulação de Claire; a falta de fé na esposa em Carl; a saudade de casa da Antonia; a dor pela morte da mulher amada em Tom; a falta de auto-estima de Chloe; as lembranças de Isabelle; a culpa de Helen e a coragem de Ian. Cada um vivendo prisioneiro da própria mente, sem nem se dar conta.
Para não dizer que gostei de todos os capítulos igualmente vou falar dos quatro que mais me chamaram a atenção.
Começando por Isabelle, uma senhora de cabelos prateados que pouco a pouco foi perdendo o fio das lembranças. Ela que, quando mais nova, achava que poderia passear pelos jardins das memórias quando ficasse velha, percebeu que não seria assim. Aquilo a deixou vazia, pois suas lembranças eram tudo o que tinha construído para si. Através de pratos bem colocados foi que Isabelle percebeu uma coisa –Estou começando a achar que talvez as lembranças sejam como esta sobremesa. Eu a como e ela se torna parte de mim independente do fato de eu me lembrar dela mais tarde ou não.
Carl já estava casado a mais de vinte anos quando Helen contou que tivera um caso. Ela estava arrependida, disse que o amava e que não queria ir embora, não queria que ele a deixasse. Carl sempre achou que tinha permanecido com a esposa por falta de criatividade, por não conseguir imaginar um futuro sem ela em sua vida. Na verdade ele não pode deixá-la por ser ela. Simplesmente a mulher que ele amava e queria a seu lado pelo resto da vida. –Ficou olhando para ela sem dizer nada e, enquanto olhava, sentiu algo se modificar e se assentar dentro dele, um movimento rápido e silencioso como a batida de um relógio [...] Então sorriu. –Esse é o seu lugar.
Tom se casou com Charlie, a mulher mais fantástica do mundo. Ele amava cada pedacinho de sua personalidade esfuziante e viva. Até que Charlie teve câncer e morreu. Assim, em questão de meses, ele assistiu aquela garota cheia de ideias e criatividade murchar até sumir, sem que ele pudesse fazer nada. Levou certo tempo e um molho de macarrão para que ele percebesse que se o tempo não cura tudo, pelo menos faz as coisas melhores. –Olhe só o que você fez –Observou Lillian em voz baixa, em pé ao lado de Tom, diante da mesa. –Eles vão comer e então tudo vai desaparecer –disse ele. –É por isso que é um presente. –retrucou Lillian.
Nem preciso dizer que fiz um tsunami de choro com esse capítulo, né?
Bem, por último, Lillian.
Não vou me demorar dizendo que ela me ensinou a fazer um belo purê de batatas, é a visão de Lilly sobre os alimentos que cativa. Ela os enxerga como pessoas, sacerdotes, talismãs e, à partir disso, consegue obter todos os resultados necessários. Aquilo me tocou mais que tudo.
Quando estou triste eu sei que devo cozinhar. Realmente não me vem a vontade, quando a gente está triste raramente tem vontade de fazer qualquer coisa. Mas eu sei que, no momento em que separar os ingredientes necessários, vou entrar num mundo só meu. Os problemas não somem, as preocupações não esmoessem, o que muda é a forma que eu os encaro. Ali sozinha, aprecio o espaço e a solidão, conversando com os alimentos eu entendo coisas que antes não enxergava, ordeno os pensamentos, chego a conclusões… quando vejo já acabei o que estava fazendo e meu coração está vários quilos mais leve, como se eu o tivesse preparado também ,só que da maneira correta.
Para mim, cozinhar não é uma obrigação, é um momento de intimidade e concentração. Vai ver por isso que até hoje só uma pessoa conseguiu me deixar genuinamente à vontade cozinhando comigo.
Vejam bem, a cozinha para mim pode ser o escritório para você, ou o ateliê, ou a biblioteca, ou a sala de estar… não importa, cada um tem um espaço para abrigar a mente, o coração e a alma de um jeito harmonioso. Aquilo que nos faz feliz.
O que importa não é a cozinha, é o que sai dela.
xoxo
P.S.: Sushi, que vontade que estou de me empanturrar de sushi!
desigusson.wordpress.com