Munduruca 04/06/2010
Um dos filmes que eu tinha marcado para assistir na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo ano passado foi 'Os famosos e os duendes da morte', de Esmir Filho. Acabei não tendo como assistir por algum motivo que não me recordo, provavelmente alguma outra sessão no mesmo horário. Permaneci desde então ansioso para ver. Quarta passada vi um twitter do Sergio Miguez mandando ficar de olho no Ismael Caneppele, autor do livro 'Os famosos e os duendes da morte', "texto incrível", que teria dado origem ao filme do Esmir. Corri para a livraria e me presentiei com o livro.
Durante o feriadão de páscoa mergulhei na história. Me apaixonei assim que li as primeiras páginas. Em alguns momentos me perdia um pouco na história porque eu começava a viajar, a lembrar do meu passado, a lembrar de muitos amigos. Algumas passagens me marcaram especialmente. Tem uma frase no livro que diz que "longe é o lugar onde se vive de verdade", e por muito tempo acreditei nisso. Depois vi que, para mim, realmente era verdade. Passei dez anos da minha vida em Rondônia na espectativa de um dia ir embora. Ir para um lugar no qual haveria cinema, teatro, shows, prédios aglomerados, trânsito, festas, pessoas que falassem sobre o mundo, um lugar no qual eu tivesse a oportunidade de me arriscar mais, de experimentar mais, de viver coisas que dentro da proteção que a minha família me oferecia, dificilmente eu conseguiria experimentar. Eu sai de lá. Demorei, mas estou aqui, em São Paulo, cercado de tudo aquilo que desejei. Longe daqueles que amo mas vivendo de verdade as oportunidades profissionais na área que eu quero, vivendo de verdade minha sexualidade, vivendo de verdade tudo que essa grande cidade pode me oferecer. Me lembrei também da Lara, uma amiga baiana, que conheci nos tempos de Minas, que consigo ver apaixonada por Dylan e desejando sair de sua cidade natal, também em busca de coisas parecidas com as que eu busquei, querendo estar em shows distantes e com pessoas que, longe, viviam de verdade.
Esmir, na contracapa do livro, avisou: 'Não existe essa bobeira de ler o livro primeiro, para depois ver o filme, ou saber o final, etc. É mais que isso. Tudo dialoga e se completa'. Eu acreditei nisso e, quando faltavam cerca de quinze páginas para acabar o livro, fui ao cinema. Outro mergulho. Senti falta de algumas cenas e neuroses que considerava importante, como o roubo do chocolate e a questão do nome sujo. Fiz mais algumas confusões. Ou não. Para mim, no livro a maioria das personagens são masculinos e Jingle Jangle é homem, até porque em vários momentos o protagonista se refere a ele como o irmão do Diego. O livro inicia com a frase "o menino sem nome conheceu o garoto sem pernas" e o filme abre com a frase "o menino sem nome conheceu a garota sem pernas". A possível troca da relação entre três meninos por dois meninos e uma menina me lembrou um pouco o tema do Festival Mix Brasil do ano passado que dizia que "nem todo filme acaba sendo como gostaria". Liberdades de autores? Liberdades poéticas? Liberdade de interpretação!? Liberdade... é isso que busca o filme, é isso que busca o livro, é isso que busca o menino sem nome, julian e o outro...
No livro há muitos lirismos que conseguem ser traduzidos para a tela com bom desempenho, destaco muitas cenas na ponte, também a das estrelas no teto do quarto, e a da morte da borboleta. Sobre o fim, ainda estou formulando minhas teorias... e não ousaria acabar com o seu prazer em descobrir um pouco mais da história sozinho. Sinta-se livre para ler e assistir 'Os famosos e os duendes da morte'. E depois me diga o que achou...
**postado em http://rafaelmunduruca.blogspot.com/2010/04/os-famosos-e-os-duendes-da-morte.html