A filha: Down em alto astral

A primeira fase foi de negação. A gente não aceitava que Cíntia, com síndrome de down, estivesse grávida. Talvez fosse preconceito mesmo. Depois de 38 anos convivendo com uma filha down ainda nos pegávamos nesse tipo de cilada. E também, obviamente, porque confiar cegamente na posição do médico era muito mais confortável e seguro. Segundo ele, quando levei Cíntia para consultar sobre anticoncepcional e para saber se Miguel, apesar de seu retardo, deveria ou não usar preservativos, não precisaria me preocupar, ela não corria risco nenhum de engravidar. Era uma possibilidade muito remota, devido à idade dela e aos hábitos e atitudes dos dois. Mas agora, pensando bem, o fato de eu, como mãe, ter ficado tanto tempo na fase de negação também poderia ser medo. Medo de que Cíntia estivesse certa e que realmente houvesse um bebê na sua barriga. E, se isso fosse verdade, medo de conviver com todas as coisas que estariam por vir. E não seriam poucas.