[…]
à deriva trocávamos entre memórias e amassos
ânsias maltrapilhas
a despeito de qualquer alcunha
dada aos nossos antepassados
(e também a despeito de qualquer imprópria fama
nosso peso bem comporta o lugar possível
de uma cama)
[…]
Bianca Gonçalves escreve a poesia que pesa a água salgada e que corre como o rio necessário em tempos de seca. Poesia necessária porque é palavra de mulher completa e crível. Jogos das nossas referências, que crescemos rebolando nas calçadas e que temos em nosso repertório a política da história.
Este livro é uma oportunidade. Uma chance peculiar de expansão. Um enfrentamento ao que se pode esperar da poesia política. Bianca Gonçalves escreve com o corpo aberto, com o corpo que pesa mil atlânticos, com a pressa de quem tenta salvar cabeças, mas se demora em frente ao espelho, em profundidade.
Meu sincero amor pela escrita de Bianca está na estética racial e sexual de sua conversa poética. Pungente, dona do seu próprio humor, entregando imagens irretocáveis para que cada história seja contada, pois suas poesias contam histórias palpáveis.
Os poemas deste livro marcam a história da literatura escrita por mulheres negras. Não apenas pela relevância que Bianca Gonçalves construiu e possui como escritora e intelectual, mas, sobretudo, pela linguagem única, instigadora e completamente fora dos lugares comuns.
Como se pesassem mil atlânticos entrega tudo aquilo que a poesia deseja de nós.
Jarid Arraes
Literatura Brasileira / Poemas, poesias