A atuação de entidades de defesa dos direitos humanos nas prisões brasileiras é tão evidente nos dias de hoje que dá margem à equivocada percepção popular de que elas só agem em favor de "bandidos". No entanto, nem sempre foi assim.
Nos anos 1930, o Brasil vivia sob a ditadura de Getúlio Vargas. Frustradas em seus anseios de redemocratização, as forças políticas estavam agitadas. Os comunistas formavam o grupo mais insatisfeito com os rumos do País. Tanto que decidiram derrubar o governo.
Com a ajuda de militares, a revolução estourou em 23 de novembro de 1935, na cidade de Natal (RN). No dia seguinte, outra sublevação ocorreu em Recife (PE) e, 48 horas depois, mais uma agitou o Rio de Janeiro, então Distrito Federal. Sem nenhum respaldo popular, os revoltosos acabaram esmagados pelas forças legalistas. Em poucas semanas, os líderes da chamada Intentona comunista estavam identificados e presos.
Uma das cabeças da revolta atendia pelo nome Harry Berger. Pensava-se que fosse norte-americano. Na verdade, chamava-se Arthur Ewert e era alemão. Experiente militante de esquerda, ex-deputado, estava no Brasil enviado pelo Comitê Executivo da Internacional Comunista, com a incumbência de planejar a revolução com Luís Carlos Prestes.
Preso no Rio de Janeiro, Berger sofria tantas violências físicas e psicológicas no cárcere que despertou a compaixão do advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto. Sem nenhum instrumento jurídico apropriado para patrocinar a causa do detento, já que a legislação da época era omissa, Sobral Pinto invocou o Direito de Proteção e defesa dos animais, recentemente assinado por Getúlio Vargas, e entrou com pedido de habeas corpus no Tribunal de Segurança Nacional.
Na defesa, lembrou aos juízes que, pouco tempo antes, baseado no Decreto, a justiça havia condenado o condenado o proprietário de um cavalo pelo assassinato do animal. Ora, argumentou Sobral Pinto, se o Estado tutela inclusive animais, por que não haveria de proteger um ser humano?
Embora Sobral não tenha conseguido salvar Harry Berger da prisão, consta que os maus-tratos, que de tão intensos poderiam dar cabo da existência do alemão comunista, cessaram. É exatamente o episódio de como um cavalo salvou a vida de um preso político que será contado nas próximas páginas.
A história em quadrinhos que se segue foi inspirada nas pesquisas do advogado paulista Olavo Aparecido Arruda D'Câmara, que estudou o episódio e defendeu tese de doutorado na Universidad Del Museo Social Argentino, em Buenos Aires, em 2006.
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