Conta Jorge Amado que, certa feita, conheceu uma senhora que vivia atormentada. Tinha sido casada com um boêmio, enviuvou, casou-se de novo – desta vez, com um português bem comportado. Ia tudo muito bem, até que o primeiro marido começou a aparecer em seus sonhos, querendo ir para a cama com ela. Daí a sua perturbação. Uns trinta anos mais tarde, caminhando com um amigo pelas ruas de Salvador, Jorge Amado viu um sujeito todo vestido de branco, estirado numa escadaria, num tremendo porre. Lembrou-se, de imediato, de um amigo de juventude, Vadinho – sujeito rico, farrista, jogador, que vivia “perdendo dinheiro e ganhando mulheres”. Alguns quarteirões adiante, topou com uma placa, fixada na porta de uma casa, onde se lia: Escola de Culinária Sabor e Arte. Para completar o quadro, Jorge Amado e seu amigo se extasiaram, nessa mesma tarde, com a visão de uma belíssima morena, debruçada na janela de um sobrado. Jorge Amado comentou então que, àquela morena deslumbrante, Vadinho certamente teria dito: “quero saborear-te”. De repente, as cenas desse passeio a pé por Salvador se fundiram com as imagens da senhora aflita, assediada em sonhos pelo primeiro marido. Tudo se acoplou de tal forma que, no dia seguinte, Jorge Amado já estava em cima da máquina, escrevendo um novo romance. E assim veio à luz, em 1966, a história de Flor, dona da conceituada Escola de Culinária Sabor e Arte, e de Vadinho e Teodoro, seus dois maridos.
Literatura Brasileira