Residindo há mais de 30 anos no Posto 6, Copacabana, em ruas arborizadas com amendoeiras, não foi difícil ao poeta-cronista Carlos Drummond de Andrade entender-se com uma dessas árvores, bem em frente de sua casa. Puxou conversa, e pediu-lhe que respondesse. E a amendoeira falou.
Este livro, publicado pela primeira vez em 195, surge agora em 6ª edição, e seu viço não esmaeceu durante o tempo transcorrido. A amendoeira de Drummond continua em forma, observando o que se passa no Rio de Janeiro e um pouco por aí afora, e comentando-o com amenidade e sabedoria vegetais. Ser tranqüilo, filosófico, essa árvore parlante não cede à paixão, ao cálculo, à má-fé. Tudo que consta destas páginas é limpo, vem de uma sensibilidade madura, que encara os homens com benevolência, e de um humour que tem raízes nos antepassados britânicos do autor, prolongadas na ambientação mineira.
Ficaram famosas, nesta seleção de crônicas, as duas em que se narra a permanência de Greta Garbo em Belo Horizonte (segredo guardado durante 26 anos, e desfeito em poucos instantes). Mas há muita coisa a assinalar, além disto. Por exemplo: a conversa no ônibus, sobre comidas da Amazônia; aventuras de um morador que mandou varrer a testada de sua casa; flagrantes do comportamento infantil; estórias de bichos que acompanham o nosso cotidiano; perfis de Oswald de Andrade, Roquette-Pinto, o pintor Visconti e outros. Tudo em linguagem ao mesmo tempo fácil e apurada, que estabelece comunicação imediata com o leitor. De um episódio mínimo, Drummond costuma tirar a lição de viver em harmonia com a vida, sem renunciar à visão crítica. Sua crônica reúne poesia, sátira, ternura e acuidade psicológica. Em certas ocasiões, quase vira conto. E tem outras surpresas felizes, interessando quer a leitores jovens quer a leitores amadurecidos.
Crônicas / Literatura Brasileira