João Goulart foi, sem dúvida, o principal herdeiro do carisma de Getúlio Vargas, a grande figura da História do Brasil do século XX. Seu nome liga-se fortemente à República que se estabelece no pós-1946, durante a qual constrói sua carreira política como parlamentar e como liderança de uma das maiores organizações do sistema partidário que então se consolida: o Partido Trabalhista Brasileiro. Contudo, pode-se dizer que, na memória política nacional, o nome de Jango, quando é lembrado, o é muito mais por ter protagonizado os últimos momentos dessa fase da vida política brasileira do que por qualquer outra razão. Jango tornou-se, por excelência, o presidente deposto pelo movimento civil e militar de 1964, que inaugurou mais de vinte anos de autoritarismo no Brasil.
Um fato histórico tão determinante para a trajetória desse presidente da República que praticamente tudo que ele fez no passado pré-64 ou no decurso posterior de sua vida, até porque morreu no exílio, ficou como encapsulado nesse acontecimento: uma espécie de síntese de sua vida, demarcada por sua deposição do poder, em geral analisada como um desdobramento das ações de seu governo, globalmente avaliado como um equívoco político. Tornar complexa esta versão historiográfica já tão compartilhada, e relativizar os julgamentos de valor que ela constrói sobre a figura de Jango, talvez seja uma das principais contribuições de João Goulart: Uma Biografia. Uma, pois há outras.
Em função de uma pesquisa minuciosa, que recorre com destaque à imprensa e às entrevistas de História Oral, Jorge Ferreira tece um rico panorama da Terceira República brasileira, sem cair nas duas armadilhas que assombram seus praticantes: a dos elogios, que a tornam uma hagiografia; e a da narrativa excessivamente factual, pontuada por um certo voyeurismo, danosa ao trabalho do historiador.
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