Se eu fosse / bicho / seria / cabra velha / montanhesa / fuçando / na escalada / a planta / de suculenta / assim viver / morrendo / de sedes / e saudades. / Meu país / não tem saída / para o mar.
Nesse terceiro livro da poeta, Meu país não tem saída para o mar, os poemas de Marcia Vinci são espécies de apontamentos que se movimentam para os desvios do momento presente. Nessa obra curta, a escrita de Marcia nos sinaliza um mundo em rápida mudança no século 21 com possibilidades poéticas em sintonia precisa com poéticas que vieram antes, em uma voz e linguagem singulares convidativas para novos olhares, como aponta a bela apresentação assinada pelo poeta Leonardo Gandolfi:
“(…) Xô, capeta!”, diz Vinci, junto de Rosa, a esconjurar o que for preciso daí para frente. Noutro momento, a autora se reconhece em João Cabral (sobretudo a partir de uma relação material e autorreflexiva com o poema), mas também se distancia dele, na medida em que revela uma dimensão aurática estranha à poesia do pernambucano, dimensão reconhecível na mineirice profanadora de uma Adélia Prado ou um Farnese de Andrade. Mais à frente, ainda ouvimos: a casa / ruiu / sob o peso / de tanta / felicidade, acabou-se / o desjejum / da família / margarina. Sim, versos que, ao apelarem à nossa memória publicitária, vão nos mostrar que a necropolítica de agora não nasceu ontem, nem anteontem: ela tem raízes. (…)”
Meu país não tem saída para o mar também dialoga de forma sutil e fresca com os trabalhos anteriores da autora, Funâmbula (2019) e Poemas do sim e do não – o seu livro de estreia publicado em 2017 quando a poeta tinha 85 anos.
Literatura Brasileira / Poemas, poesias