Rainer Maria Rilke (1875-1926), o grande poeta alemão que viveu na transição do simbolismo para a modernidade - e é, por isso mesmo, considerado um de seus precursores -, foi também um grande epistológrafo. Escreveu cartas ao longo de toda sua vida, sendo as mais famosas as 'Cartas a um jovem poeta'. Dentro dessa vasta correspondência, começando com o próprio século XX, e indo de seus 25 anos até sua morte aos 50, invariavelmente enviava uma carta de Natal para a mãe. São estas as epístolas agora reunidas em 'Cartas natalinas à mãe', traduzidas diretamente do alemão por Maria Aparecida Barbosa, com prefácio de Willi Bolle. Rilke foi um homem inquieto, e essa inquietude se manifesta de inúmeras maneiras - nos vários relacionamentos amorosos, nas características de sua vasta obra poética, no seu interesse pela religião e pela solidão, na verdadeira peregrinação geográfica que foi sua vida - refletida nos distintos lugares de origem dessas cartas. Eles são quase tantos quanto as cartas, o que significa que Rilke praticamente não passou dois natais seguidos no mesmo lugar em sua vida adulta - Berlim, Westerwerde, Paris, Roma, Oberneuland (perto de Bremen), Worpswede (idem), Capri, Túnis, Duíno (Itália - onde escreveria as famosas Elegias), Ronda, Viena, Munique, Locarno, Muzot. Há poucas referências, nessas cartas, à literatura em geral, e algumas à sua própria obra em particular. Em compensação, pode-se acompanhar o homem Rilke em sua peregrinação pela Europa e pela África (Tunísia), suas ansiedades políticas, principalmente no período da Primeira Guerra Mundial, o esfriamento de seu casamento com a artista plástica Clara Westhoff (com quem se casa em 1901) e a proximidade com a filha Ruth, assim como o aumento de sua solidão e a serenidade criativa a ela ligada. Apesar de serem, como diz seu título, cartas de Natal, cheias, portanto, de votos e de referências à data cristã, pode-se descortinar um quadro fragmentário, porém sensível, tanto da existência adulta de um grande artista quanto da vida de certa classe social na Europa do início do século XX.
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