Nesta série de lendas, mitos e textos literários que comentamos nas cinco crônicas precedentes várias coisas se destacaram. Há cegos, como o advinho Tirésias, que interpretam melhor os fatos do que os que enxergam. Há, por outro lado, a comunidade dos cegos arrogantes, dos que negam que se possa ver, como no conto de H. G. Wells. Há a cegueira que sobrevém a uma comunidade como uma praga temporária, uma doença, uma ideologia, como no "Ensaio sobre a cegueira" de Saramago. Há a visão excessiva com sua racionalidade irritante, que não enxerga o óbvio, como em "a carta roubada" de Poe. Há, na estória da Lady Godiva, o ato de ver, como forma de desafiar a interdição instaurada pela autoridade, que ordena não-ver. Ver a nudez das coisas é já transgredir. E há, como na lenda "A nova roupa do rei" de Andersen, a denúncia do pacto social da comunidade que faz um acordo em torno do não ver. Em vários desses casos é o estrangeiro, o forasteiro, o menino, alguém não comprometido com o sistema que denuncia a cegueira alheia.