Afinal, não reconhecidas como mulheres com capacidade e experiência de reprodução e procriação, não identificadas com a maternidade, fomos reduzidas a corpos desapropriados de sua dimensão humana, corpos despossuídos de finalidade e de sentido. Corpos, finalmente, saturados de ausências, investidos de negatividade - inúteis, incapazes, indóceis, insanos, impróprios, infelizes, indignos, incompletos, indisciplinados, inferiores, etc - porque desprovidos das marcas que o figuram como corpo da "verdadeira mulher": a reprodução e a maternidade. Todavia, naquilo que escapa da lógica patriarcal, são, paradoxalmente, corpos plenos de positividade, no sentido de que são corpos que se libertam de uma finalidade atrelada ao ventre, ao destino "natural" de toda mulher. Como o meu, quantos outros corpos, embora aprisionados por outros tipos de encarceramentos, não se deixaram aprisionar pelas representações do feminino e da maternidade? Quantos outros corpos não se deixaram enredar e se envolver pelos apelos do social que, reiteradamente, incessam e louvam a figura da mãe, a capacidade reprodutora como apanágio das mulheres, assumindo o ônus e o bônus decorrentes de tais escolhas?