Notre-Dame de Paris apresenta ao leitor um dos personagens mais conhecidos da literatura francesa. Quasímodo, o corcunda de Notre-Dame, ao completarem-se quase dois séculos da publicação de seu romance (1831), foi objeto de atualizações clássicas do cinema, desde as versões em que foi interpretado por Lon Chaney (1923) e Anthony Quinn (1956), à animação da Disney (1996). Esse herói grotesco é descrito como o reflexo monstruoso da sociedade europeia no século XV. A criança abandonada de origem cigana, o corcunda, o caolho, o coxo, o surdo, cada traço que se acrescenta à sua monstruosidade abjeta, ao mesmo tempo risível e temível, é a projeção de um mundo distorcido pela perversão dos suplícios em praça pública, pelo obscurantismo místico, pela sexualidade recalcada, pela xenofobia, pela arbitrariedade da justiça, pelo fausto dos poderes e pela decadência material e moral de Paris nos estertores da Idade Média. Uma sociedade, enfim, emaranhada pelas mais diversas contradições, que culminam na catedral de Notre-Dame saqueada, narrada por Victor Hugo como um prenúncio alegórico de um fato histórico emblemático do destino da Europa, a Queda da Bastilha.