"O fascismo e o comunismo muito deveram de seus êxitos aos acasos da conjuntura, ou seja, à sorte: Não é difícil imaginar roteiros em que Lênin é retido na Suíça em 1917 e Hitler não é chamado para a Chancelaria em 1933. Mas o prestígio de suas ideologias teria existido mesmo sem o sucesso deles (...): e é esse caráter inédito da política ideológica (...) que a torna misteriosa.".
O destino do pensamento comunista a partir de 1917 foi ficar preso entre sua universalidade abstrata e sua encarnação na História. O curso da Revolução Bolchevique não deixou de ser infeliz ou trágico. Contudo, a promessa do Outubro russo atravessou o século de bandeira alta. De Lênin a Gorbatchov, a História não apagou a chama da utopia. Ao contrário, alimentou-a.
Esta relação imaginária dos homens do século XX com o pensamento comunista forma o assunto deste livro. Ela se estende muito além dos regimes do tipo soviético e, aliás, sobreviveu mais tempo a oeste do que a leste da Europa. O segredo de seu esplendor deve-se ao fato de ela prolongar a tradição revolucionária do Ocidente: apenas vencedor, o bolchevismo se instalou na herança jacobina e retornou por conta própria o projeto de regenerar a humanidade pelos efeitos somados da ação e da ciência.
Mas o mito soviético não teria durado todo o século sem o apoio que as circunstâncias ofereceram à sua mentira. Nascido da Primeira Guerra Mundial, dá uma de suas faces ao niilismo da época. Capitaliza as injustiças do Tratado de Versalhes. Enriquece-se com o espetáculo da Grande Depressão. Prospera no antifascismo. Alcança seu zênite no fim da Segunda Guerra Mundial. Mesmo a desestalinização estende sua influência no momento em que ela assinala, contudo, seu declínio. O comunismo desaparecerá antes de haver enfraquecido as esperanças de seus partidários. O Ocidente fará cortejo a seu féretro.